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Escolas não esperam que os alunos aprendam só a fazer contas ou interpretar um texto. Colégios particulares e da rede estadual de São Paulo estão adotando estratégias para que desenvolvam habilidades socioemocionais, como cooperação, empatia, senso crítico e curiosidade. Glória Alves comenta.

  • Data :01 Jul, 2016
  • Categoria :

3 de julho de 2016

Escolas ensinam a lidar com as emoções

Isabela Palhares - O Estado de S.Paulo

No fim do ano, escolas não esperam que os alunos tenham aprendido só a fazer contas, interpretar um texto ou saber o nome dos Estados brasileiros.

Colégios particulares e da rede estadual de São Paulo estão adotando estratégias para que desenvolvam habilidades socioemocionais, como cooperação, empatia, senso crítico e curiosidade.

“Essas habilidades estão intimamente ligadas às cognitivas. São elas que potencializam e aprofundam o aprendizado. A escola que decide trabalhar o lado socioemocional precisa mudar a sua estrutura, suas aulas. Porque esse não é um trabalho intuitivo, ele precisa ser planejado”, observa Márcia Almirall, orientadora pedagógica do Colégio Santa Maria, na zona sul de São Paulo.

No ano passado, a escola capacitou os professores para que as práticas pedagógicas fossem alteradas em sala de aula. Para os alunos do fundamental 1 (do 1º ao 5º ano), as carteiras foram alteradas para facilitar o trabalho em grupo. Os docentes também são estimulados a darem aula em locais diferentes, como no pátio ou no jardim.

“Em todas as disciplinas é possível desenvolver as habilidades socioemocionais, se nos planejarmos. Então, nas aulas de matemática, todos trabalham em grupos. Em português, fazem rodas de conversa para discutir a disciplina. Em tudo dá para trabalhar, se soubermos estimular os alunos da maneira correta”, afirma Márcia.

O ensino socioemocional foi adotado em 2015, de forma experimental, em 17 escolas da rede estadual. Para este ano, o número subiu para 145, todas com período integral e ensino fundamental 1. “Estamos consolidando a ideia de que não é possível fazer um bom trabalho sem focar nessas habilidades (socioemocionais). Com o tempo, esse projeto vai ser ampliado para todas as unidades”, diz Ghisleine Trigo, coordenadora de gestão da Educação Básica da Secretaria Estadual de Educação.

Suporte

A ideia ao desenvolver habilidades socioemocionais nas crianças é dar ferramentas para que consigam lidar da melhor forma em situações de conflito e assim reduzir a vulnerabilidade dos estudantes. A escola estadual Professora Irene Ribeiro, na Vila Carrão, zona leste, foi uma das que recebeu o projeto no ano passado. Todos os professores foram capacitados para o novo modelo, aplicado em todas as disciplinas.

Elaine Carapiá, que dá aula para o 3ºano, conta que as mudanças fizeram com que o professor se tornasse uma peça menos central na sala de aula e mais um mediador para que os alunos tivessem mais espaço para tirar dúvidas e aprender com os colegas. As aulas também falam sobre os sentimentos e como lidar com eles.

“Eles vivenciam situações muito difíceis em casa que podem impactar o aprendizado. Outro dia um estudante disse que os pais estavam brigando e jogaram as alianças no lixo. O menino, de 7 anos, começou a cantar e aconselhou os pais a se acalmarem. Ele aprendeu na escola que, quando se está nervoso, é importante respirar e disse isso para os pais em um momento de conflito”, relata Elaine.

Em todo início de aula, os alunos se sentam em uma roda para falar como estão se sentindo. Segundo ela, é importante estimular as crianças a se expressarem para ganhar confiança. “Mudamos muita coisa. Não temos mais apenas uma relação entre aluno e professor, mas entre seres humanos.”

Preconceito

No colégio Pio XII, na zona oeste, os adolescentes do ensino fundamental 2 (do 6º ao 9º ano) têm uma vez por semana uma aula em que são estimulados a trabalhar com as emoções e a abordar temas em que podem ter preconceitos. A disciplina utiliza dinâmicas em grupo e exercícios em que a turma conta histórias ou assiste a filmes sobre temas como a morte ou as drogas.

“Percebemos que, quando eles entendem o que sentem nas mais diversas situações, se tornam mais tolerantes, prestativos, têm mais empatia com os colegas”, afirma a psicóloga e professora Patricia Prado.

Para ela, como as crianças passam a maior parte do tempo no colégio e desenvolvem as primeiras relações sociais no ambiente escolar, é responsabilidade dos colégios não só transmitir conhecimento, mas também valores morais e éticos. “Além disso, um aluno que possa ter problemas em casa ou em se relacionar com os colegas, e não sabe como lidar com essas situações, vai ter queda no rendimento escolar.”

No colégio Eduque, na zona sul da capital, estudantes do ensino fundamental 1 também contam com aulas voltadas para essas habilidades, uma vez por semana. Com livros e histórias, os professores desencadeiam discussões sobre as emoções.

“Com repertórios leves e lúdicos, ensinamos a entender o que é sentir raiva, tristeza, solidão, felicidade. Com esse conhecimento, eles se tornam mais respeitosos e compreensivos com os colegas”, observa a coordenadora pedagógica Lucelena Martins de Souza.

Ao abordar esses temas, Lucelena considera que os docentes abrem um canal de confiança e diálogo com os alunos. “Quando eles têm um problema, sabem que podem contar para nós, que vamos ajudar. Assim, ninguém fica excluído ou sem a atenção devida.”

Notícia publicada no estadao.com.br , em 14 de março de 2016.

Glória Alves comenta*

Ponto essencial da matéria: educação integral-aluno, e ainda a relação professor-aluno.  Qual a visão da escola, ou melhor, qual a visão dos órgãos responsáveis pela educação da criança em sua primeira fase escolar? Quem é o aluno para o professor?

O aluno deve ser visto como um ser humano, um Espírito em evolução, viajante do ontem e do hoje, que traz em sua bagagem evolutiva experiências felizes, enriquecedoras, como também experiências traumáticas e comprometedoras, que devem ser reparadas aqui, e que ao retornar a sua pátria espiritual, deverão estar corrigidas, senão quase sanadas.

Os sentimentos são algumas das potencialidades que o ser humano traz em seu íntimo como semente e que devem ser trabalhadas a fim de que dê bons frutos. Em sala de aula, devemos olhar, e esse olhar deve transcender a superficialidade, quando apenas notamos e rotulamos a criança ou adolescente como um ser indisciplinado, um aluno problema, e penetrarmos com a luz do olhar daquele que ama seu trabalho e o próximo, buscar conhecer, entender que diante de si está alguém que muitas vezes sofre, angustia-se, tem medo, e encontra-se perdido em meio a mil situações da sua vida íntima, com a família, com a comunidade que vive, enfim, com o mundo que se abre diante de si.

Houve uma época em que a escola era considerada o segundo lar, e a professora a segunda mãe. Para alguns isso parece piegas; mas qual é o papel do professor e quem é ele nessa relação? O professor, na visão do grande educador suíço Johann Heinrich Pestalozzi, é como um jardineiro que deve buscar as melhores condições externas para que as plantas (alunos) sigam seu desenvolvimento natural. Para ele, a semente traz em si o “projeto da árvore toda”. Como nos diz o Espírito Lázaro, “o Espírito precisa ser cultivado como um campo”.(1)

Na visão de Pestalozzi, a função principal do ensino é levar a criança a desenvolver suas habilidades naturais e inatas. Dessa maneira, o aluno tem condições de conduzir em grande parte o seu próprio aprendizado com base na experimentação prática e na vivência intelectual, sensorial e emocional, aprender fazendo.

Conforme o depoimento dado na matéria pela professora Elaine Carapiá, quando da aplicação das estratégias para o desenvolvimento das habilidades socioemocionais: “as mudanças fizeram com que o professor se tornasse uma peça menos central na sala de aula e mais um mediador para que os alunos tivessem mais espaço para tirar dúvidas e aprender com os colegas”.

Não deixando de ser o agente ativo, o traço de ligação nesse binômio educação intelectual – educação emocional, o professor se autoenriquece, pois precisa autoreformar-se, aprender e rever conceitos, aprofundar-se na reflexão e meditação, no objetivo do seu trabalho como jardineiro num jardim de flores de vários matizes e espécies.

As habilidades socioemocionais, também chamadas de “soft skills” (habilidades não cognitivas), são competências importantes na vida do educando, visando o seu desenvolvimento como ser humano, diante de si mesmo, ajudando-o  a autoconhecer-se, a lidar com situações e problemas da vida, visando o seu futuro profissional, quando estará diante de novos desafios e aprendizados, crescendo como um homem moral.

Marcus De Mario, educador e escritor espírita, define a educação como “o conjunto de estudos e experiências que propiciam ao educando desenvolver suas potencialidades de forma equilibrada, objetivando sua formação integral com o fim de termos o homem moral”.(2) Vemos, então, a importância de uma nova direção, de uma orientação para os profissionais ligados e dedicados ao mister da educação, em buscar aliar a prática à teoria aprendida nas carteiras das Universidades, em entender o sentido e o significado da educação.

Em matéria comentada anteriormente - “Medicina da Unicamp cria projeto para ensinar empatia e compaixão a alunos”, encontramos o depoimento do coordenador do projeto, professor Marco Antonio de Carvalho Filho, dizendo que “a faculdade dá conhecimento técnico, mas não ensina a ser médico, a lidar com pessoas, a essência da profissão".(3) Empatia e compaixão, são habilidades socioemocionais, como a curiosidade, a capacidade de resolução de problemas, a paciência, a solidariedade, como o autoconhecimento, a estabilidade emocional, a resiliência, a coerência e a responsabilidade, competências que preparam o estudante para estar no mundo, compreender as diferenças, ser crítico e atuante, tomar decisões pautadas na ética; além disso, ajudam a construir seu projeto de vida e a se capacitar para o mundo do trabalho.

Essas competências, como as múltiplas inteligências do ser humano, estão sendo desenvolvidas em algumas escolas públicas de São Paulo, como no Rio de Janeiro, e em outros estados brasileiros, através da proposta de Educação Integral, projeto coordenado pelo Instituto Ayrton Senna, que dá suporte às Escolas Públicas, e que tem como parceiros nesse projeto entidades como a UNESCO (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura), Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior), entre outros.

“Ainda que haja consenso na importância de tais habilidades, ainda há passos que devem ser dados para que elas sejam ensinadas e estimuladas nos indivíduos. Um dos caminhos para isso é a inclusão das competências socioemocionais no ambiente escolar, na perspectiva que as instituições contribuam para o desenvolvimento integral do indivíduo, estimulando suas diferentes dimensões e potencialidade”.(4)

“As ações equilibradas da natureza, do meio social, dos estados afetivos, da personalidade, etc., formam o processo da educação. Essa é a visão integral que leva em consideração as trocas e influências entre a família, a escola, os meios de comunicação, o trabalho, o lazer e tudo o mais. Isso importa em estabelecer que vida é educação, e tão rica é a vida que todo artificialismo é dispensável”.(5)

Estamos dando adeus a uma maneira tradicional de ensinar Matemática, Ciência, Geografia, Física, entre outras disciplinas. É comum o aluno, por exemplo, perguntar onde vai usar e aplicar o conceito de vetores, que aprende nas aulas de Física, em sua vida. É então que entra a visão da Educação Integral, que propõe uma mudança do papel da escola.

“A instrução é setor da educação na qual os valores do intelecto encontram necessário cultivo. A educação, porém, abrange área muito grande, na quase totalidade da vida. No período de formação do homem é pedra fundamental, por isso que ao instituto da família compete a indeclinável tarefa, porquanto pela educação, e não pela instrução apenas, se dará a transformação do indivíduo e consequentemente da Humanidade. No lar assentam os alicerces legítimos da educação, que se transladam para a escola que tem a finalidade de continuar aquele mister, de par com a contribuição intelectual, as experiências sociais… O lar constrói o homem. A escola forma o cidadão”.(6)

Essa é a visão espírita da educação conforme nos instruem os Espíritos Superiores e Allan Kardec, o Educador da humanidade:

(…) É, pela educação, não por essa educação que tende a fazer homens instruídos, mas pela que tende a fazer homens de bem. A educação, convenientemente entendida, constitui a chave do progresso moral. Quando se conhecer a arte de manejar os caracteres, como se conhece a de manejar as inteligências, conseguir-se-á corrigi-los, do mesmo modo que se aprumam plantas novas.(7)

Referências Bibliográficas:

(1) ESE - Cap. X – Amar o próximo como a si mesmo, item 8 – A lei de amor;

(2) A Educação Integral do Ser - http://www.orientacaoespirita.org/Artigo%2008.htm;

(3) http://www.espiritismo.net/node/18841/ ;

(4) CEI – Centro de Referências em Educação Integral http://educacaointegral.org.br/noticias/guia-mostra-escolas-redes-podem-trabalhar-competencias-socioemocionais/;

(5) Idem 2;

(6) “SOS” Família – Cap. 15 – Educação - Joanna de Ângelis – Divaldo Franco;

(7) LE – q. 917 – Comentário de Allan Kardec.

  • Glória Alves nasceu em 1º de agosto de 1956, na cidade do Rio de Janeiro. Bacharel e licenciada em Física. É espírita e trabalhadora do Grupo Espírita Auta de Souza (GEAS). Colaboradora do Espiritismo.net no Serviço de Atendimento Fraterno off-line e estudos das Obras de André Luiz, no Paltalk.