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A gerente de agência bancária Cláudia Costa leva a filha, Ana Giuliana, todos os dias para a faculdade. No caminho, aproveita para incentivá-la. ‘Fico no pé: ‘Filha, quando começam as provas? Você está estudando?’’, conta. Breno Henrique de Sousa comenta.

  • Data :11/07/2015
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11 de julho de 2015

‘Sou zelosa’, afirma mãe que checa as notas e faltas da filha na faculdade

THAIS BILENKYDE SÃO PAULO A gerente de agência bancária Cláudia Costa, 48, leva a filha, Ana Giuliana, 20, todos os dias para a faculdade. No caminho, aproveita para incentivá-la. “Fico no pé. Pergunto: ‘Filha, quando começam as provas? Você está estudando?’”, conta. Reportagem da Folha mostra que faculdade faz até reunião de pais contra ‘geração mimada’. Cláudia acompanha as notas e faltas de Ana Giuliana pelo menos uma vez por mês pelo portal da faculdade, ao pagar a mensalidade. Encarrega-se de comprar os livros e materiais necessários para a graduação em propaganda, que a filha cursa no centro universitário Belas Artes. “Não sou extremamente protetora. Sou zelosa. Dou toda a condição para ela ter uma boa formação. O resto é com ela”, relata Cláudia. Ana Giuliana gosta da proximidade da mãe. Pede dicas, mostra trabalhos. “Ela me dá aquele apoio moral. Somos praticamente melhores amigas”, conta a estudante. Para Cláudia, conhecer os professores pessoalmente traz “tranquilidade”. “Sei que tenho a quem recorrer”, diz. O economista Fábio Cardo recorreu à direção da ESPM quando sua filha, Ana Beatriz, 22, e diversos colegas pegaram DP (recuperação) em uma disciplina. “Não é uma ingerência no processo, mas, pela abertura que a escola dá, a gente pode dar um toque. Amigavelmente, claro”, explica. Dono de uma agência de comunicação corporativa, Cardo costuma se envolver nos trabalhos de Ana Beatriz, que cursa jornalismo. Para ele, é uma forma de se reciclar. Para ela, é “muito bom, porque, quando tenho alguma dificuldade, meu pai me ajuda, dá conselhos”.

LIMITE Para a educadora Sílvia Colello, é positivo que os pais acompanhem e incentivem a vida acadêmica dos filhos. O problema, ela opina, surge quando há exagero na proteção e a tutela acaba adiando a conquista da autonomia. Professora de psicologia da educação na USP, Colello observa que a atual geração de estudantes antecipou em um ou dois anos o ingresso na graduação em comparação com a geração anterior, começando o curso até mesmo aos 17 anos. “O intervalo é pequeno, mas, nessa faixa etária, faz toda a diferença”, afirma. Mais dependentes, os jovens têm dificuldade para mudar a chave, “continuam tratando a universidade como escolinha”, analisa. Essa postura compromete o desempenho acadêmico na medida em que o aluno não se desafia. “Sinto claramente a diferença de alunos, bons até, que vão, assistem às aulas, fazem tudo o que o professor pede e vão embora e os alunos que se embrenham na vida universitária, vão atrás dos professores, procuram programas de iniciação científica, ficam umas horas a mais no laboratório, leem bibliografia complementar.” Os jovens que fazem o mínimo exigido para serem aprovados, diz Colello, “desperdiçam a oportunidade de viver a universidade na sua riqueza maior, que é o trabalho de pesquisa e extensão”. Quanto à postura das universidades de estabelecer uma linha direta com as famílias, a especialista pondera que “não se pode ser ingênuo”. A iniciativa, ainda que ajude a acolher os pais, não deixa de ser uma jogada de marketing das instituições. Com a recepção às famílias, as escolas tentam conquistar simpatia e cumplicidade de modo a evitar a evasão dos alunos, sobretudo dos que entram cedo e decidem trocar de curso, afirma. Uma professora que não quis se identificar disse que a postura de colegas contribui para o comportamento infantilizado dos alunos. “Eles ficam dando bronquinha, dizendo que, se não estudar, vai se dar mal na prova. E os estudantes só no celular.” “Hoje, o aluno da graduação tem perfil de ensino médio, e o aluno da pós-graduação se comporta como o da graduação”, compara Alvaro Bufarah, professor na Faap (Fundação Armando Alvares Penteado). Notícia publicada no Jornal Folha de S.Paulo , em 22 de março de 2015.

Breno Henrique de Sousa comenta* Precocidade A precocidade intelectual não significa maturidade e este é um exemplo claro disso. As gerações recentes são, sem dúvida, mais precoces intelectualmente, pois na nossa sociedade produtivista a ênfase da formação de nossos filhos está no desenvolvimento de suas habilidades intelectuais. Pouca ou nenhuma importância se dá ao desenvolvimento emocional dos filhos, em saber se eles cultivam emoções e pensamentos saudáveis, como convivem em sociedade e, sobretudo, se se sentem felizes. O sucesso em nossa sociedade é medido pela importância social e econômica do posto que nossos filhos conseguiram galgar em uma sociedade cada dia mais competitiva. Às vezes, ensina-se, através de exemplos ou de palavras, que para atingir o sucesso vale tudo. Valores morais são apenas um verniz social para dissimular seus interesses e tornar suportável a convivência em sociedade. A negligência com a formação emocional e ética dos filhos traz consequência sobre os próprios pais. Os filhos, não acostumados a cultivar valores como amor, gratidão e respeito, já fazem com que os pais sofram na velhice as consequências do abandono, da indiferença e do desrespeito por parte daqueles em quem deveriam ter forjado esses valores. Sucesso é sentir-se feliz e realizado e essa é uma conquista interior e não exterior. Existem pessoas riquíssimas e profundamente infelizes e insatisfeitas. Diante dos atuais valores, muitos pais se orgulham do filho que se tornou proeminente econômica e socialmente ou sentem que fracassaram quando os filhos não se destacam nesses aspectos. Vejo muitos pais encherem a boca e o peito para dizer que o filho é um figurão da sociedade, nunca ouvi ninguém dizer: “eu tenho orgulho porque meu filho é feliz”. Ninguém em sã consciência dirá que não é necessário oferecer aos filhos as condições necessárias para o sustento material. A educação formal é imprescindível, mas é a formação familiar quem lhe dará o que nenhuma escola pode oferecer. A cada dia as nossas crianças são submetidas mais precocemente a um volume crescente de cursos de formação, isso tem-lhes roubado um período precioso do convívio familiar, das brincadeiras com outras crianças e de simplesmente “ser criança”, algo tão fundamental na formação emocional do indivíduo. Os especialistas já apontam um número crescente de casos de depressão entre crianças. O psiquiatra Marco Antônio Bessa explica que a causa é que “muitas crianças estão com a agenda lotada de compromissos, o que eleva o grau de estresse, dormem mais tarde, ficam fechadas em ambientes como apartamentos e shoppings, usam aparelhos eletrônicos excessivamente, sob risco de aumento de ansiedade e restrição do contato social, e convivem menos com seus pais”.(1) Assim como montamos a agenda de nossos filhos para as atividades acadêmicas, esportivas e culturais, devemos igualmente, de maneira sagrada, planejar os momentos de convívio em família, de ministrar-lhes lições de como conduzir-se diante dos desafios da existência, de repassar-lhes aqueles valores que acreditamos que são positivos para uma vida feliz e emocionalmente saudável. Mas, quase sempre esses momentos são sacrificados pelas “urgências” da vida e a vida, que segue seu curso, sempre nos oferece o retorno de nossas escolhas.

Nota: (1) BASÍLIO, Andressa. Depressão Infantil: ela existe e está aumentando em todo o mundo. Revista Crescer. Ed. Globo. Fev. 2015. Disponível em: http://revistacrescer.globo.com/Criancas/Saude/noticia/2014/09/ depressao-infantil-ela-existe-e-esta-aumentando-em-todo-o-mundo.html .

  • Breno Henrique de Sousa é paraibano, professor da Universidade Federal da Paraíba nas áreas de Ciências Agrárias e Meio Ambiente. Está no movimento Espírita desde 1994, sendo articulista e expositor. Atualmente faz parte da Federação Espírita Paraibana e atua em diversas instituições na sua região.