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Será que a ciência, com suas demonstrações utilitaristas e materialistas pode nos dizer o que é a felicidade e como obtê-la? Para Richard Layard, fundador do Projeto Ação para a Felicidade, a resposta é sim - digamos, um ‘sim por aproximações sucessivas’. Jorge Hessen comenta.

  • Data :07/08/2011
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Como ser feliz: Ciência propõe receita de felicidade

Redação do Diário da Saúde

Ação para a Felicidade

Será que a ciência, com suas demonstrações utilitaristas e materialistas pode nos dizer o que é a felicidade e como obtê-la?

Para Richard Layard, a resposta é sim - digamos, um “sim por aproximações sucessivas”.

Layard é fundador do Projeto Ação para a Felicidade, uma espécie de esforço de auto-ajuda social, “um movimento para a mudança social positiva”, destinado a criar uma sociedade mais feliz.

E, para isto, ele espera contar com o saber da ciência.

A ciência e o espírito humano

Historicamente, a felicidade, expressão por excelência do espírito humano, foi o “objeto” de discussão da sabedoria dos filósofos.

Mas será que a ciência e seus saberes tão precários - sempre prontos a mudar com a próxima pesquisa ou com o próximo estudo - poderia também ser um guia confiável nesse caminho?

A chamada “ciência acadêmica”, aquela feita por cientistas profissionais dentro dos muros das universidades, é muito eficiente em lidar com as coisas físicas e com o controle da natureza.

Apesar do fim do domínio da religião sobre o saber no mundo ocidental, ocorrido ao longo dos últimos quatro séculos, a ciência parece ter ficado traumatizada demais com a queima de livros, frequentemente acompanhados dos seus autores. E tudo o que se relaciona à “alma humana”, ou ao “espírito humano”, coisas sobre as quais a religião reivindicava autoridade, foi banido do chamado “conhecimento oficial”.

O espírito humano dos filósofos foi reduzido à mente humana, novamente reduzida à consciência e finalmente atribuída a um processo que, “de alguma forma”, emana do cérebro humano.

Para a ciência oficial, pessoas são resultado de processos ainda não completamente entendidos do cérebro humano, com corpos e comportamentos ditados por seus arranjos genéticos, e tudo o que são, ou expressam, resulta de suas interações com o ambiente e de seus próprios arranjos ou desarranjos biológicos.

Iluminismo da ciência acadêmica

É claro que o restante do mundo, fora dos muros das universidades, não concorda exatamente com isso. Na verdade, mesmo entre os cientistas, só os mais fundamentalistas, materialmente falando, fiam-se em tais explicações ou ficam satisfeitos com elas.

Nas últimas décadas, o bom senso tem voltado a vigorar e o medo da exprobração pública pelos líderes políticos e religiosos tem sido exorcizado e amainado, ou talvez psiquiatricamente resolvido em uma gigantesca terapia de grupo não-declarada, fazendo com que um número cada vez maior de cientistas retome a coragem para estudar assuntos menos relacionados ao corpo humano, e mais afetos ao espírito humano.

As ciências sociais, a antropologia, a psicologia e a neurologia têm avançado, ainda que a passos vacilantes, nessa área tão fluida para quem se acostumou a lidar com sólidos inertes.

Até a biologia já levou alguns respingos, com pesquisadores propondo que os humanos nascemos para o amor, e elaborando uma teoria que defende a sobrevivência do mais bondoso. O tradicional egoísmo inato dos animais, biologicamente determinado, e longamente estendido ao comportamento humano, começa a ser questionado pelos estudos sobre lealdade e justiça.

Ciência da felicidade

Com isso, já é possível falar em uma “ciência da felicidade”, e alguns pesquisadores, ainda dentro do paradigma oficial utilitarista, estão tentando criar até um índice econométrico, chamado Felicidade Interna Bruta, capaz de medir o nível de felicidade dos cidadãos de um país.

Estudos mostram, por exemplo, que o aumento crescente da renda não aumentou a felicidade das pessoas no mundo desenvolvido: é como dizer que o dinheiro ajuda, mas não compra felicidade.

Assim, defender um crescimento econômico contínuo não é o mesmo que ter como objetivo uma sociedade mais feliz.

Para o criador do Projeto Ação para a Felicidade, é isto que temos que começar a mudar: se queremos uma sociedade mais feliz, então precisamos tornar isto um objetivo explícito. Somente assim mudaremos nossa maneira de viver e caminharemos rumo a um mundo melhor.

E, segundo ele, devemos fazer isto usando aquilo que os experimentos científicos “comprovaram” que funciona.

Felicidade como obra coletiva

Nesse processo, a ciência começa a “descobrir” que a felicidade é uma obra coletiva.

E, como tal, ela se fundamenta muito mais nas relações que temos com as outras pessoas do que nas relações que temos com os bens e utensílios que utilizamos no nosso dia-a-dia.

Pode-se argumentar que os sábios e filósofos de todos os tempos sempre disseram isso, e inclusive já deram suas receitas de como construir um paraíso na Terra.

Mas os cientistas, com seu eterno utilitarismo, constatam que os conselhos dos sábios não trouxeram felicidade para o mundo até hoje. Logo, a ciência, com sua longa lista de sucessos, certamente a melhor forma de obter conhecimento do mundo natural que o homem já inventou, tem direito a fazer sua tentativa.

Assim, além dos relacionamentos, eles recomendam dar uma olhada na saúde mental. Por exemplo, mostrou-se que a psicoterapia traz 32 vezes mais felicidade do que o dinheiro. E também que a saúde mental vem piorando, ao menos no mundo desenvolvido, desde os anos 1960: a depressão será a doença mais comum dentro de 20 anos.

Mas a cavalaria já está a caminho, e os estudos sobre o uso da meditação e da ioga têm mostrado resultados indiscutíveis na melhoria da saúde mental.

Ensino das virtudes

Para Richard Layard, isto é mais do que suficiente para se ter esperança.

E, como estudos têm mostrado que os esforços para o desenvolvimento de virtudes humanas - ensinar o amor, como diz o filósofo Michel Serres - só funcionam quando essa educação é divertida, parece que o mundo feliz será também um mundo muito mais alegre.

Isto é também a redescoberta do que Aristóteles disse há milênios, quando o filósofo grego afirmava que a virtude deve ser desenvolvida como um hábito - assim, as ações virtuosas contêm em si mesmas o prazer de serem exercitadas, como qualquer bom hábito.

Por outro lado, a sociedade ocidental idolatra o egoísmo e a competição, em detrimento do altruísmo e da colaboração. É isso o que precisa mudar, garante Layard: “Naturalmente, há um lado profundamente egoísta na nossa natureza, mas é o trabalho de cultura apoiar o nosso altruísmo natural contra o nosso egoísmo natural.”

Como fazer isto? No site de sua organização, ele lista os seus 10 Mandamentos para Felicidade, todos, segundo ele, fundamentados em experimentos científicos.

10 Mandamentos da Felicidade

  1. Faça um juramento de felicidade
  2. Faça coisas boas para os outros
  3. Crie um Grupo Local de Felicidade
  4. Faça três boas ações todos os dias
  5. Diga obrigado
  6. Observe o que há de bom ao seu redor
  7. Tenha uma mente alerta em tempo integral
  8. Descubra seus talentos e use-os
  9. Peça ajuda quando se deparar com problemas
  10. Ajude as crianças a desenvolver resiliência emocional
  11. Crie seus filhos de forma positiva
  12. Engage-se em obras voluntárias

O endereço do Projeto Ação para a Felicidade é www.actionforhappiness.org .

Notícia publicada no Diário da Saúde , em 25 de abril de 2011.

Jorge Hessen comenta*

O pesquisador inglês Richard Layard(1) escreve sobre a dificuldade que a ciência atual encontra para pronunciar-se a propósito da felicidade e de como obtê-la. Para ele “a “ciência acadêmica” é muito eficiente em lidar com as coisas físicas e com o controle da natureza. Mas o que se relaciona à “alma humana”, ou ao “espírito humano”, é muito diverso, pois para a ciência cartesiana, pessoas são resultados de processos ainda não completamente entendidos do cérebro, com corpos e comportamentos ditados por suas disposições genéticas, e tudo o que são, ou expressam, resulta de suas interações com o ambiente e de seus próprios arranjos ou desarranjos biológicos.”(2)

Desde a década de 80, do século XX, há uma chamada “ciência da felicidade”, e alguns pesquisadores, ainda no universo do paradigma oficial utilitarista, estão tentando criar um índice econométrico, a tal “Felicidade Interna Bruta”, capaz de medir o nível de felicidade dos cidadãos de um país. Os estudos apontam, por exemplo, que a riqueza não consolida a felicidade das pessoas no mundo desenvolvido. “Defender um crescimento econômico contínuo não é o mesmo que ter como objetivo uma sociedade mais feliz.”(3)

Alguns acadêmicos “descobriram” quão a felicidade é uma obra coletiva e, como tal, ela se fundamenta muito mais nas relações com as outras pessoas do que nas relações com os bens e utensílios que utilizamos no nosso dia-a-dia. Para Layard: “há um lado profundamente egoísta na nossa natureza, mas é o trabalho de cultura apoiar o nosso altruísmo natural contra o nosso egoísmo natural.”(4) Um dos conceitos básicos da Revolução Francesa, marco da moderna sociedade ocidental, é que o objetivo da sociedade deveria ser a felicidade geral. Na Constituição americana, já na segunda linha, está escrito que todo homem tem o direito inalienável à vida, à liberdade e à busca da felicidade. Historicamente, a felicidade, expressão por excelência do espírito humano, foi o objeto de discussão das propostas filosóficas. Na Grécia, por exemplo, Epicuro procurou demonstrar que a sabedoria era a chave da felicidade. Antes dele, Diógenes, “O Cínico”, estabelecia que o homem deveria desdenhar todas as leis, exceto as da Natureza, vivendo de acordo com a própria consciência e com total desprezo pelas convenções humanas e sociais. Há 2.400 anos, Sócrates, considerado o pai da ciência moral, em sua dialética a expressar-se, não raro de forma irônica, combatia os males que os homens fomentam para gozarem de benefícios imediatos, objetivando, com essa atitude de reta conduta, o bem geral, a felicidade comunitária. A ideia socrática expõe um debate que permanece até hoje: O que é felicidade? Como atingi-la? Até então, os gregos acreditavam que dependiam basicamente dos desígnios dos deuses.

Outro problema no estudo da felicidade é que o termo não comporta definições precisas. É bem-estar? É satisfação? É êxtase? É a serenidade da contemplação? O conceito de felicidade é incerto. Modifica-se de acordo com a ocasião e a concepção social, econômica e espiritual de cada um. Pode se expressar, momentaneamente, em uma viagem, na saúde, numa festa de aniversário, na companhia de um amigo e noutras situações. Mas, será que “pode o homem gozar de completa felicidade na Terra?” Os Espíritos afirmam que “não! Por isso que a vida nos foi dada como prova ou expiação. Depende de cada um a suavização de seus males e o ser tão feliz quanto possível na Terra.”(5) Não podemos esquecer que a Terra é um mundo atrasado sob o ponto de vista moral. Por isso, a felicidade total não se encontra aqui no orbe, todavia em mundos mais evoluídos. Em nosso planeta, a felicidade é relativa, conforme consta no item 20, do capítulo V, de O Evangelho segundo o Espiritismo.(6)

Confundir felicidade com cobiça e bel-prazer é uma distorção proposta inicialmente pelo epicurismo, pelo cinismo, pelo estoicismo.(7) Ainda hoje, acredita-se que a felicidade está na satisfação da vaidade e dos desejos. Por isso, são tão valorizados e idolatrados o silicone, o botox, a roupa de grife, a plástica estética e o carrão zerado. O mundo exige que as pessoas estejam permanentemente “bonitas”, “alegres” e, por isso, ele se tornou o paraíso das drogas e do Prozac. Muitas mulheres fazem análise justamente porque são muito bonitas e têm dificuldade de lidar com a beleza.

Em uma sociedade feliz, onde o homem fosse consciente da vontade de Deus, isto é, da prática do bem, não haveria violência, drogas, sequestros, prostituição, poligamia, traição, inveja, racismo, inimizades, tristeza, fome, ganância e guerras; e mais, não encontraríamos pessoas perambulando pelas ruas, embriagadas, sujas, cabelos desgrenhados, roupas ensebadas, catando coisas no lixo ou esmolando, em razão de quedas morais. As teorias atuais sobre o bem-estar em Psicologia e Economia estão, ainda, a desejar. Urge que novas propostas teóricas interpretem a felicidade em termos de valores mais duradouros. Astrólogos, quiromantes, místicos e embusteiros de toda sorte também enriquecem às custas da ingenuidade alheia, fomentando a ilusão de uma fórmula mágica para a prosperidade. A felicidade não é resultante de privilégios biogenéticos (cerebrais) e de personalidade, nem mesmo pode ser adquirida pela obtenção de um bem de consumo.

Cremos que a felicidade depende, exclusivamente, de cada criatura. Esguicha da sua intimidade, depende de seu interior, como instruiu o Mestre dos Mestres: “o reino dos céus está dentro de vós.”(8) A legítima felicidade reside na conquista dos tesouros imperecíveis da alma. Estabelecendo, conforme o Eclesiastes, que a verdadeira “felicidade não é deste mundo”,(9) Jesus preconizou que o homem deve viver no mundo sem pertencer ao mundo, facultando-lhe o autodescobrimento para superar o instinto e sublimá-lo com as conquistas da razão, a fim de planar nas asas da angelitude.

A felicidade se expressa no bem que se faz ao próximo. Quando o “eu” egoísta de cada ser tiver cedido lugar ao amor pelo seu semelhante, iremos presenciar uma comunidade equilibrada, harmônica e feliz. O Espiritismo nos dá suporte moral e outras diversas motivações, revelando-nos a imortalidade, a reencarnação e a lei de causa e efeito. Explica-nos que a felicidade é possível e que se constrói no dia-a-dia pelo esforço continuado, fortalecendo-nos para a luta contra as nossas tendências inferiores.

Aprendamos a notar o mundo pelo prisma do espírito e sejamos felizes, compreendendo a vida como um dom de Deus.

Referências:

(1) Richard Layard, renomado economista britânico e que integra a Câmara dos Lordes é diretor do Centre of Economic Performance da London School of Economics;

(2) Disponível em http://www.diariodasaude.com.br/news.php?article=como-ser-feliz-ciencia–propoe-receita-felicidade&id=6405 >, acessado em 25/07/2011;

(3) idem;

(4) idem;

(5) Kardec, Allan. O Livro dos Espíritos, RJ: Ed FEB, 2000, perg 920;

(6) Kardec, Allan. O Evangelho Segundo o Espiritismo, RJ: Ed FEB, 2003, item 20, Cap. V;

(7) Primeiras escolas de filosofia gregas a pensar a moral de forma individual;

(8) (Lucas, 17:20-21);

(9) (Eclesiastes, 6:1-5).

  • Jorge Hessen é natural do Rio de Janeiro, nascido em 18/08/1951. Servidor público federal lotado no INMETRO. Licenciado em Estudos Sociais e Bacharel em História. Escritor (dois livros publicados), Jornalista e Articulista com vários artigos publicados.