Carregando...

  • Início
  • Especialistas tentam controlar sonhos para evitar pesadelos angustiantes

Quando traumas de sonhos não desaparecem com o tempo, terapeutas usam intervenções comportamentais para reduzir os pesadelos, usando mente consciente para controlar a maneira selvagem do inconsciente. Jorge Hessen comenta.

  • Data :13/09/2010
  • Categoria :

Especialistas tentam controlar sonhos para evitar pesadelos angustiantes

Por Sarah Kershaw The New York Times

Pesadelos resultantes de eventos traumáticos geralmente desaparecem com o tempo, assim como as imagens assustadoras e tramas aterrorizantes se tornam menos intensas. Os sonhos também podem evoluir naturalmente para o que alguns especialistas chamam de “mastery dreams”, nos quais a pessoa descobre uma forma de aliviar a dor ou o horror – por exemplo, confrontando um estuprador ou salvando alguém de um incêndio.

Porém, quando isso não acontece por sua própria vontade, muitos terapeutas usam intervenções comportamentais para reduzir os pesadelos ou guiar o paciente em direção a um “mastery dream” – usando a mente consciente para controlar a maneira selvagem do inconsciente.

Algumas dessas técnicas vêm sendo usada há anos. Num tratamento, conhecido como sonho lúcido, os pacientes são ensinados a se tornar conscientes de que estão sonhando, enquanto sonham. Em outra, chamado de dessensibilização in vivo, eles são expostos enquanto acordados ao que pode estar atormentando-os no sono – por exemplo, uma cobra viva, enjaulada e inofensiva – até que o medo desapareça.

Mais recentemente, terapeutas e outros especialistas começaram a usar uma técnica chamada de incubação do sonho, pesquisada pela primeira vez no início da década de 1990 por Deirdre Barrett, psicóloga da Harvard Medical School.

“A Origem”

Hollywood acaba de produzir sua própria abordagem sobre o sonho lúcido e a ideia de controlar os sonhos, com o lançamento do filme “Inception”, (“A Origem”, na versão brasileira) um suspense cuja trama gira em torno das camadas mais obscuras do mundo do sonho.

Como Barrett escreveu numa análise online do filme, para a Associação Internacional para o Estudo dos Sonhos, “Adoro a ideia de milhões de fãs de filmes de ação deixando os cinemas e se perguntando se já tiveram um sonho no qual sabiam que estavam sonhando – ou sacando seus celulares e pesquisando no Google para saber se realmente é possível aprender a influenciar o conteúdo dos sonhos”.

Usando a incubação de sonho para resolver problemas, Barrett, autora do livro “The Committee of Sleep”, que expandiu sua pesquisa inicial, pede que seus pacientes escrevam um problema numa frase curta e coloque a anotação próxima da cama. Então, ela pede que eles revisem o problema durante alguns minutos antes de deitarem e, uma vez na cama, visualizem o problema como uma imagem concreta, se possível.

Enquanto caem no sono, os pacientes devem dizer a si mesmos que querem sonhar com o problema e idealmente manter papel e caneta por perto, e talvez uma lanterna ou caneta com ponta de luz, sobre o criado-mudo. Independente da hora em que acordam, eles devem ficar deitados e quietos antes de se levantar da cama, observando se há “qualquer resquício de sonho lembrado e convidar mais do sono a voltar, se possível”. Eles devem escrever tudo que lembrarem.

Para reduzir os pesadelos, ela ajuda os pacientes a desenvolver um cenário para trabalhar, e eles podem se lembrar disso enquanto caem no sono, dizendo para si próprios: “Hoje, se eu sonhar com o incêndio, com o Vietnã, quero encontrar uma mangueira, congelar a ação, falar com o menino vietnamita”, ela disse.

Ensaio de imagens

O médico Barry Krakow, do Centro Maimonides de Artes e Ciência do Sono, em Albuquerque, Novo México, autor de “Sound Sleep, Sound Mind”, ajudou a desenvolver uma terapia de ensaio de imagens. Num manual de 110 páginas que oferece aos pacientes, ele faz com que as pessoas escolham um pesadelo que querem transformam em sonho de menor intensidade.

“Mude o pesadelo como quiser”, diz o manual. “Deixe que novas imagens positivas surjam no olho da sua mente para guiá-lo a ‘pintar’ o novo sonho”.

Os pacientes então ensaiam o novo sonho, que pode ser uma versão menos assustadora do pesadelo ou um sonho completamente diferente, pelo menos uma vez por dia, por 10 ou 20 minutos. Ele sugere relembrar um pesadelo apenas uma ou duas vezes por semana – e apenas para transformá-lo num novo sonho.

Tradutor: Gabriela d’Ávila

Notícia publicada no Portal UOL , em 2 de agosto de 2010.

Jorge Hessen comenta*

Desde que o homem existe os sonhos são cercados de mistérios. Para os povos antigos, eles carregavam algo de “sobrenatural”. Eram vistos como um meio de alguém receber orientações e mensagens do além, tanto das divindades quanto dos desencarnados. Atualmente, cada povo, cultura e tradição lida com o sonho de um modo particular. Há os que não dão a mínima atenção para o assunto. E há aqueles que se dedicam a interpretá-los, numa tentativa de se tornar indivíduos melhores e de viver com mais equilíbrio.

Todavia, por que sonhamos? A resposta continua emblemática. Talvez, entre as muitas variáveis, está a regulação de emoções e fatores aos quais damos importância, minimizando os sentimentos tensos. Nossos processos de pensamento trabalham 24 horas por dia e a atividade da mente não é interrompida quando dormimos (o sonho toma entre 20% e 25% do sono). No transcorrer do sono, são selecionadas quais informações guardaremos na memória de longo prazo e o que será descartado. “Aparentemente, os critérios de seleção estão baseados em valores emocionais para a autopercepção, nossa ideia de quem somos e quem desejamos nos tornar."(1)

Será que no sono, a alma repousa como o corpo? “Não!”, ensinam os Espíritos, “pois a alma jamais está inativa.”(2) Quando adormecemos, o corpo descansa e os nossos sentidos vão enfraquecendo progressivamente à medida em que penetramos em estados de sono mais profundos. Aproveitamos o relaxamento progressivo dos órgãos físicos e vamos nos libertando gradualmente das amarras que o corpo físico nos cria. “Durante o sono, afrouxam-se os laços que nos prendem ao corpo e nos lançamos pelo espaço, entrando em relação mais direta com os outros Espíritos.”(3) “Pelos sonhos, quando o corpo repousa, acredita-o, tem o Espírito mais faculdades do que no estado de vigília. Lembra-se do passado e algumas vezes prevê o futuro. Adquire maior potencialidade e pode pôr-se em comunicação com os demais Espíritos, quer deste mundo, quer do outro.”(4)

Médicos neurologistas defendem que as imagens que povoam a mente das pessoas no instante do sono são, muitas vezes, resultado de percepções e de memórias antigas que vêm à tona e se encaixam. Isso explicaria os sonhos que parecem trazer soluções para a vida real, como a história do físico alemão Albert Einstein, que concluiu a Teoria da Relatividade depois de um cochilo. Paul McCartney certa vez acordou com uma música maravilhosa na cabeça. Foi até o piano e começou a achar as notas. Tudo seguiu uma ordem lógica. Gostou muito da melodia e como havia sonhado com ela, não podia acreditar que tinha escrito aquilo. “Foi a coisa mais mágica do mundo”, disse o cantor. É dessa maneira que McCartney explicou a criação de “Yesterday”, 45 anos atrás.

Não foi apenas o vocalista dos Beatles que se beneficiou com os sonhos. A tabela periódica, segundo relato de seu inventor, o químico russo Dmitri Mendeleev, surgiu durante um sonho. Passagens de sonhos são recorrentes nas Escrituras. O Texto Bíblico reúne mais de 700 citações de sonhos e visões. Grande parte do conteúdo do Corão, livro do Islã, foi revelada a Maomé em sonho.

Como a psicologia, a neurociência e as religiões analisam as mensagens que vêm à tona durante o sono? Por que interpretá-las corretamente é fundamental para melhorar a vida de alguém? Para alguns analistas, interpretar corretamente o próprio sonho ajuda a perceber com o que estamos insatisfeitos, para fazer pequenos ajustes ou iniciar grandes transformações pessoais. É fato que os sonhos sempre intrigaram e foram objeto de estudo, mas agora eles estão sendo levados mais a sério por neurologistas, psicanalistas e biólogos. Enquanto a biologia procura explicar quais são as estruturas cerebrais envolvidas, a psicanálise se põe a investigar seu conteúdo. Da união dessas duas disciplinas nasceu a neuropsicanálise, uma tentativa de entender os aspectos físicos e psíquicos do sonho.

Por outro lado, convenhamos que nesse campo, nenhuma doutrina oferece estudos e apresenta teorias consistentes, como o faz a Doutrina Espírita. O sono e os sonhos são estudados com profundidade por Kardec em O Livro dos Espíritos, 2a. parte, Capítulo VIII, onde o ex-sacerdote das antigas Gálias tece discussão a respeito do significado dos sonhos. Há também o livro A Gênese, Capítulo XIV, em que o mestre lionês aborda bastante o assunto.

Pesquisas atestam que os sonhos podem evoluir naturalmente para o que alguns estudiosos chamam de “mastery dreams”, isto é, a pessoa descobre uma forma de aliviar a dor ou o horror. Alguns terapeutas intervêm nos comportamentos para reduzir os pesadelos, utilizando a mente consciente para controlar o ímpeto agressivo do inconsciente. No “sonho lúcido”, por exemplo, “os pacientes são treinados para tornarem-se conscientes de que estão sonhando, enquanto sonham.”(5) Mas, será que uma pessoa que dorme pode ter consciência de que está sonhando? Sim, segundo o psiquiatra holandês Dr. Frederick Willem van Eeden, que teve a confirmação feita pelo Dr. Stephan Laberge, na Universidade de Stanford (EUA). A mesma resposta era dada por Santo Agostinho e Tomás de Aquino sobre “sonhos lúcidos”.(6)

O que dizer dos pesadelos quando somos perseguidos, quando temos medo, e acordamos assustados? Em muitas situações, os espíritos menos felizes, aos quais estamos sintonizados por vários motivos, quando nos veem sair do corpo, nos perseguem fazendo-nos voltar, rapidamente, para nos “esconder” no nosso corpo físico. Acordamos cansados, coração aos pulos, pois, literalmente, corremos. “Os maus Espíritos se aproveitam dos sonhos para atormentar as almas pusilânimes”, conforme elucida o Espiritismo.

Léon Denis divide os sonhos em três categorias: “Primeiramente, o sonho ordinário, puramente cerebral, simples repercussão de nossas disposições físicas ou de nossas preocupações morais. A segunda categoria equivale ao primeiro grau de desprendimento do Espírito, quando este flutua na atmosfera sem se afastar muito do corpo; mergulha, por assim dizer, no oceano de pensamentos e imagens que rolam pelo espaço. Por último, vêm os sonhos profundos, ou sonhos etéreos.”(7)

Para os pesquisadores, aplicar na vida real o que acontece quando se está dormindo depende do entendimento sobre os próprios sonhos. Os sonhos não são verdadeiros como o entendem os ledores de buena-dicha, pois fora absurdo acreditar que sonhar com tal coisa anuncia tal outra. “Essa linguagem não tem nada a ver com dicionários de simbologia, daqueles que associam sonhar que perdeu um dente com a morte de um conhecido e que uma cobra é sinônimo de traição. Esse entendimento é pessoal, baseado em um sistema de códigos individual, formado pelas experiências de vida de cada um. Aí cabe-nos analisar os medos, desejos, decepções, e tentar adaptá-los ao que sonhamos na noite passada.”(8)

Devemos registrar com naturalidade os sonhos que possam surgir durante o descanso físico, sem preocupar-nos aflitivamente com quaisquer fatos ou ideias que se reportem a eles. Segundo André Luiz, “precisamos aprender a extrair sempre os objetivos edificantes entrevisto em sonho. Devemos fugir das interpretações supersticiosas que pretendam correlacionar os sonhos com jogos de azar e acontecimentos mundanos, gastando preciosos recursos e oportunidades na existência em preocupação viciosa e fútil.”(9)

Kardec perguntou aos Espíritos se podem duas pessoas que se conhecem visitar-se durante o sono e os Benfeitores explicaram: “Que pode ocorrer o fato e muitos que julgam não se conhecerem costumam reunir-se e falar-se. Podemos ter, sem que suspeitemos, amigos em outro país. É tão habitual o fato de irmos encontrar-nos, durante o sono, com amigos e parentes, com os que conhecemos e que nos podem ser úteis, que quase todas as noites fazemos essas visitas.”(10) Mas, é de bom alvitre termos cautela com os sonhos com pessoas encarnadas pois, conquanto o fenômeno seja real, a sua autenticidade é bastante rara. Por isso, não podemos nos escravizar aos sonhos de que lembremos, embora possamos admitir os diversos tipos de sonhos, sabendo, porém, que a grande maioria deles se origina de reflexos psicológicos ou de transformações relativas ao próprio campo orgânico.”(11)

Fontes:

(1) Rosalind Cartwright, professora do Departamento de Psicologia da Universidade Rush, em Chicago;

(2) Kardec, Allan. O Livro dos Espíritos, Rio de Janeiro: Ed. FEB, 2000, questão 401;

(3) Idem, questão 401;

(4) Idem, questão 402;

(5) Barry Krakow, médico do Centro Maimonides de Artes e Ciência do Sono, em Albuquerque, Novo México, autor de “Sound Sleep, Sound Mind”, ajudou a desenvolver uma terapia de ensaio de imagens;

(6) Loureiro, Carlos Bernardo. Visão Espírita do Sono e dos Sonhos, São Paulo: Casa Editora O Clarim. Matão, 2000;

(7) Denis, Léon. No Invisível, Rio de Janeiro: Ed. FEB, 1985;

(8) Matéria publicada na Revista Galileu, em maio de 2009;

(9) Vieira, Waldo. Conduta Espírita, Rio de Janeiro: Ed. FEB, 2000;

(10) Kardec, Allan. O Livro dos Espíritos, Rio de Janeiro: Ed. FEB, 2000, questão 414;

(11) Vieira, Waldo. Conduta Espírita, Rio de Janeiro: Ed. FEB, 2000.

  • Jorge Hessen é natural do Rio de Janeiro, nascido em 18/08/1951. Servidor público federal lotado no INMETRO. Licenciado em Estudos Sociais e Bacharel em História. Escritor (dois livros publicados), Jornalista e Articulista com vários artigos publicados.