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Os jardins sempre foram um espaço de bálsamo para a alma. É impossível não se acalmar diante do aroma das flores. Agora, essas características começam a ser usadas em favor de pessoas doentes ou das que apenas estão em busca de um momento tranquilo. Carlos Miguel Pereira comenta.

  • Data :16/08/2010
  • Categoria :

Os Jardins Terapêuticos

Cresce no mundo a tendência de criar espaços idealizados especialmente para ajudar na recuperação de doenças

Greice Rodrigues

Os jardins sempre foram um espaço de bálsamo para a alma. É impossível não se acalmar diante do visual das plantas, do aroma das flores. Agora, essas características começam a ser usadas em favor de pessoas doentes ou das que apenas estão em busca de um momento tranquilo. Nos Estados Unidos e na Europa, cresce a tendência de criação dos chamados jardins terapêuticos. Eles são construídos ao ar livre ou em átrios e solários dos hospitais e em locais públicos, para serem frequentados pela população em geral. Não se trata, porém, de um jardim comum. Há características especiais que devem ser respeitadas para que ele de fato seja terapêutico. O primeiro cuidado é com a segurança.

Os pisos são antiderrapantes e as ruas, largas, com espaço para caminhar. Também são previstos pontos para descanso ou meditação. Se eles estiverem perto de uma fonte ou outro lugar de água corrente, melhor ainda. Outro diferencial é a escolha dos elementos que o compõem: há uma mistura de plantas medicinais, aromáticas e ornamentais. As medicinais são usadas simbolicamente e as demais porque também liberam aromas agradáveis, além de atraírem pássaros e borboletas. A ideia é desenhar um ambiente capaz de despertar os sentidos. Por isso, a cheirosa lavanda, as medicinais equinácea e erva-cidreira, e os cactos ornamentais estão entre as plantas mais usadas. Combinados com o canto dos pássaros e o barulho da água corrente, despertam a visão, a audição e o olfato, provocando o que os especialistas chamam de distração positiva. A ideia de criação dessas áreas surgiu da observação de que a saúde física e mental é influenciada por aspectos do ambiente físico, como sua luz natural, espaço ou som. “Quando olhamos para uma cena agradável, nossos sentidos são envolvidos positivamente”, disse à ISTOÉ Naomi Sachs, da empresa americana Landscapes Therapeutic, uma das companhias especializadas no desenvolvimento dessas áreas.

“Isso provoca a liberação de endorfinas, substâncias que promovem bem-estar.” Alguns trabalhos atestam o resultado da iniciativa. Um deles, feito no San Diego Children’s Hospital, nos EUA, mostrou que o jardim da instituição ajudou a diminuir o tempo de internação das crianças e melhorou a relação entre os pais, os pacientes e os funcionários. Em outro, realizado com portadores de dor, os cientistas verificaram que a distração obtida enquanto eles ficavam em um desses espaços causou relaxamento e reduziu sintomas. Também há exemplos em relação ao mal de Alzheimer. Uma pesquisa feita em 24 hospitais públicos e privados da Califórnia (EUA) revelou que os pacientes com melhor qualidade de vida eram os internados em instituições que dispunham de jardins desse tipo. “A combinação equilibrada de terapias farmacológicas, comportamentais e ambientais é eficaz para melhorar a saúde dos doentes”, concluíram os pesquisadores. Os benefícios ocorrem ainda em outros níveis.

Em um bairro violento da cidade de São Francisco, também na Califórnia, um desses jardins tem contribuído para baixar os índices de violência e melhorar um pouco a rotina dos moradores. No Brasil, a proposta de construção desses locais começa a interessar os principais centros de saúde. O Hospital Sírio-Libanês, em São Paulo, por exemplo, incluiu em seu projeto de reestruturação a criação de uma área de convivência com plantas e espaço para integração entre pacientes e familiares.

Matéria publicada na Revista ISTOÉ , em 13 de agosto de 2010.

Carlos Miguel Pereira comenta*

Conta a história, que há cerca de 2500 anos, Nabucodonosor, Rei da Babilónia, preocupado com a tristeza profunda que a sua esposa Amyitis manifestava por viver numa terra abrasiva e árida, decidiu construir um conjunto de jardins que recriassem a paisagem bucólica da terra natal da Rainha. Os jardins ficaram então assentes em vários níveis de terraços, repletos de cursos de água e cachoeiras, inundados pelo verde de incontáveis árvores que produziam suculentos frutos, como tâmaras, amêndoas e damascos, outras enormes que providenciavam sombra e enfeite, como as acácias, salgueiros e carvalhos. O espaço restante era dividido entre caminhos pedestres, majestosas esculturas de animais míticos e coloridos canteiros de azáleas e outras flores. À volta dos jardins, bandos de pássaros buliam em azáfama, nidificando nas árvores, alimentando-se e bebendo nas inúmeras fontes espalhadas pela edílica obra de arte. Erigidos para atenuar a saudade e a tristeza de uma Rainha, os Jardins Suspensos da Babilónia foram possivelmente os primeiros jardins terapêuticos da história da Humanidade.

Estudando cientificamente algumas práticas que o senso comum do Homem já utiliza há séculos, a medicina gradualmente está a incorporá-las aos seus recursos terapêuticos, percebendo a vital importância da mente no processo curativo do organismo físico. Neste caso, em específico, compreendeu a enorme influência do ambiente na recuperação dos doentes e como a harmonia da Natureza, os odores intensos e perfumados, a transcendência das flores, os sons mágicos dos pássaros e o canto das folhas ao compasso da doce brisa podem afetar essa recuperação positivamente. A ciência circunscreve o termo ambiente ao espaço físico que nos envolve, mas a Doutrina Espírita, compreendendo que a vida não se esgota na matéria, possui uma visão ainda mais abrangente desse conceito.

Compreendendo que o nosso pensamento é energia que irradiamos constantemente, através daquilo que pensamos e sentimos, estamos permanentemente a influenciar o ambiente que nos rodeia. Em todos os lugares em que nos encontramos, poderemos ser uma boa ou má influência para o meio que nos envolve, dependendo da qualidade e intensidade do que pensarmos e sentirmos. Em locais onde a dor, a tristeza ou a revolta abundam, são precisamente essas emoções que prevalecem, podendo eventualmente contagiar os que partilham o mesmo espaço. Os hospitais, devido à permanência de enfermos das mais variadas sintomatologias, são locais onde existe uma predominância de pensamentos e emoções corrosivas como o desespero, angústia, revolta, solidão, e que ficam gravados na psicosfera do próprio local. Se juntarmos a estes condicionamentos o aspecto frio e impessoal de algumas instituições, acabaremos por criar ambientes depressivos que propiciam ao stress e à ansiedade dos pacientes, prejudicando inevitavelmente o processo curativo.

A proliferação de jardins terapêuticos pelas instituições hospitalares que relata a notícia é uma evolução formidável na forma como a medicina aborda a recuperação do paciente, usando de recursos simples, baratos e naturais para conseguir um bom nível de relaxamento, melhorar o humor e até aumentar a tolerância à dor dos seus doentes. Atentemos no que diz o orientador Aniceto a André Luiz no livro Os Mensageiros , psicografia de Chico Xavier: “É forçoso reconhecer que o campo, em qualquer condição, no círculo dos encarnados, é o reservatório mais abundante e vigoroso de princípios vitais. (…) Reina aqui a paz relativa e equilibrada da Natureza terrestre. Nem a selvajaria da mata virgem, nem a sufocação dos fluidos humanos. O campo é nosso generoso caminho central, a harmonia possível, o repouso desejável.”

Mesmo não tomando contato com o ambiente campestre puro, os pacientes, ao saírem dos locais estressantes impregnados de emoções de angústia e interagindo com o ambiente saudável e refrescante de um jardim terapêutico, dotado de altos níveis de vitalidade, oxigênio, harmonia e beleza, têm à sua disposição uma oportunidade de transformação do seu estado anímico, libertando endomorfinas, aumentando a sensação de bem-estar e acelerando o processo de recuperação da sua maleita. Seria fantástico que estes jardins terapêuticos se multiplicassem não apenas nos hospitais, mas através dos espaços citadinos, onde a sua influência pudesse ser um tonos sublime à harmonia e equilíbrio orgânico, emocional e espiritual de todos os que frequentassem esses ambientes, como por exemplo bairros degradados, fábricas, empresas e mesmo as penitenciárias.

Enfermos ou sãos, o prazer de entrarmos em comunhão com a Natureza e usufruirmos do seu hálito abençoado, da sua energia revigorante e balsâmica, é um privilégio e sobretudo uma dádiva que não podemos desperdiçar, tornando-nos simultaneamente responsáveis pela sua preservação e manutenção. Repare-se que, mesmo no plano espiritual, o contato com a harmonia de um cenário de belezas naturais e puras não é dispensado, como podemos perceber por este relato de André Luiz sobre o Bosque das Águas, no livro Nosso Lar , psicografia de Chico Xavier:

“Deslumbrou-me o panorama de belezas sublimes. O bosque, em floração maravilhosa, embalsamava o vento fresco de inebriante perfume. Tudo em prodígio de cores e luzes cariciosas. Entre margens bordadas de grama viçosa, toda esmaltada de azulíneas flores, deslizava um rio de grandes proporções. A corrente rolava tranquila, mas tão cristalina que parecia tonalizada em matiz celeste, em vista dos reflexos do firmamento. Estradas largas cortavam a verdura da paisagem. Plantadas a espaços regulares, árvores frondosas ofereciam sombra amiga, à maneira de pousos deliciosos, na claridade do Sol confortador. Bancos de caprichosos formatos convidavam ao descanso.”

  • Carlos Miguel Pereira trabalha na área de informática e é morador da cidade do Porto, em Portugal. Na área espírita, é trabalhador do Centro Espírita Caridade por Amor (CECA), na cidade do Porto, e colaborador regular do Espiritismo.net.