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O aniversário de 50 anos de ‘As Duas Culturas’, de C.P. Snow, provocou visões mistas. Alguns sentem que a divisão entre as ciências e as humanidades ainda é tão ampla e desconfortável quanto antes; outros dizem que já é superada. Sergio Rodrigues comenta.

  • Data :18/11/2009
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Cientistas questionam incompatibilidade entre ciência e fé

Philip Ball

O aniversário de 50 anos do famoso “As Duas Culturas”, de C.P. Snow, provocou visões mistas. Alguns sentem que a divisão entre as ciências e as humanidades ainda é tão ampla e desconfortável quanto era em 1959; outros dizem que o mundo já a superou. Mas talvez precisemos, ao invés disso, reconhecer que as divisões de hoje existem entre duas culturas bastante diferentes.

Na minha mente, a mais problemática delas é a distinção entre aqueles que acreditam no valor do conhecimento e do aprendizado, sejam artistas, cientistas, historiadores ou políticos, e aqueles que rejeitam, ou mesmo difamam, o intelectualismo nos assuntos mundiais.

Mas outros sentem que a mais séria disparidade está entre aqueles que confiam na ciência e no racionalismo iluminista, e aqueles que são guiados pelo dogma religioso. Esse sentimento aparentemente motivou o recente lançamento do Reason Project, uma iniciativa organizada pelo neurocientista e escritor Sam Harris, que ostenta um comitê consultivo de estrelas, incluindo Richard Dawkins, Daniel Dennett, Steven Weinberg, Harry Kroto, Craig Venter e Steven Pinker, além de Salman Rushdie, Ayaan Hirsi Ali e Ian McEwan.

O projeto tem o objetivo de “espalhar o conhecimento científico e os valores seculares pela sociedade” e busca “incentivar o pensamento crítico e diminuir a influência do dogmatismo, da superstição e do fanatismo em nosso mundo.”

Guerra e Paz

É fácil concordar que o uso (ou, de modo geral, abuso) da religião para justificar a supressão de direitos humanos, maus tratos e assassinatos é abominável. O fato disso ser tratado pelo projeto é louvável. Mas com Dawkins (“Deus, um Delírio”) e Christopher Hitchens (“Deus Não É Grande”) no comitê, não há como deixar de suspeitar que o Grande Poderoso é o alvo principal.

Esse debate agora tende a se agrupar em dois campos. Um, exemplificado pelo Reason Project, insiste que ciência e religião são fundamentalmente incompatíveis, e que o mundo não é grande o bastante para ambas.

O outro lado é exemplificado por outro projeto recentemente lançado, o BioLogos Foundation, estabelecido pelo ex-líder do Projeto do Genoma Humano, Francis Collins. Sob esta visão, ciência e religião podem e devem fazer as pazes: não há razão para elas não coexistirem. A missão do BioLogos fala da “cultura de guerra em ascensão na América entre a ciência e a fé”, e explica que a fundação “enfatiza a compatibilidade da fé cristã com o que a ciência descobriu sobre a origem do universo e da vida.”

O BioLogos é financiado pela Fundação Templeton, que similarmente busca identificar um denominador comum entre ciência e religião. Para os ateus militantes, isso é puro apaziguamento.

É isso que o biólogo evolucionário Jerry Coyne, membro do comitê do Reason Project, lamenta em um ensaio chamado “Truckling to the faithful: A spoonful of Jesus helps Darwin go down” (submetendo-se aos fiéis: uma colherada de Jesus ajuda a afundar Darwin). Coyne acusa a Academia Nacional de Ciências dos EUA, e especialmente o Centro Nacional para Educação Científica, de agradar as massas religiosas.

Céu para os ateus

O que o Reason Project tem a seu favor é o rigor filosófico. Isso também pode ser sua falha, porque parece improvável que ele se aventure além desses muros. Como a maioria das ideias utópicas, o absolutismo ateísta funciona desde que ele ignore como as pessoas são e permaneça em um vácuo cultural e histórico. Ordem lógica e autoconsistência não são, infelizmente, suficientes.

Fico feliz pelas pessoas se engajarem na exposição do fanatismo e da opressão. Se alguns escolhem focar em instâncias nas quais essas coisas têm motivação religiosa - bem, por que não? Mas parece importante reconhecer que o suposto conflito entre ciência e fé não é, na verdade, tão importante.

O que é importante é a força relativamente recente da oposição fundamentalista a aspectos específicos do pensamento científico, o que fez dos Estados Unidos e da Turquia os dois países ocidentais com a menor proporção da população que acredita na evolução.

Em outras palavras, isso não é uma questão de ciência versus fé, mas de rejeição de ideias científicas que desafiam estruturas de poder. Afinal, o fundamentalismo raramente se opõe à tecnologia por si só, e na verdade é muitas vezes perturbadoramente ávido por adquiri-la. Isso não minimiza o problema, mas reconhecê-lo pelo que ele é irá evitar falsas dicotomias e talvez facilitar a descoberta de soluções.

Por isso, existe pouco a se ganhar com a tentativa de derrubar o templo - os falsos pregadores é que são a ameaça. Se pudermos reconhecer que a religião, como qualquer ideologia, é uma construção social - com benefícios, perigos, invenções arbitrárias e, acima de tudo, raízes na natureza humana -, então poderemos renunciar a muitos argumentos vazios e voltar às maravilhas terrenas da bancada do laboratório.

Tradução: Amy Traduções

Nature

Notícia publicada no Portal Terra , em 16 de junho de 2009.

Sergio Rodrigues comenta*

A divergência entre a ciência e a religião remonta aos primórdios da civilização, tendo sido agravada durante os séculos de domínio do poder religioso, quando aqueles que contestavam seus dogmas, ainda que fundamentados em pesquisas e dados comprovados, eram impiedosamente perseguidos, julgados e condenados, muitas das vezes, pagando com a própria vida a ousadia de discordar do poder dominante.

A questão da fé sempre foi vista pelos homens de ciência como produto do ensino religioso e, por isso, rejeitada pela maioria, que ainda traz recordações da perseguição sofrida no passado remoto. Estes tendem a repelir toda e qualquer ideia que possa estar vinculada a um sentimento religioso, numa postura, até certo ponto, preconceituosa. Em O Evangelho segundo o Espiritismo , Allan Kardec demonstra que ciência e religião são as duas alavancas da inteligência humana. Uma revela as leis do mundo material e a outra as do mundo moral. Têm, ambas, o mesmo princípio, que é Deus. Provindo de uma mesma inteligência, não podem se contradizer. Quando uma nega a outra, a conclusão inevitável é que uma esteja certa e a outra errada, ou seja, Deus teria se enganado em relação a uma delas, o que, evidentemente, não pode ser aceito, se considerarmos ser a Divindade a inteligência suprema, a sabedoria em seu grau máximo, infalível e onipotente.

Assim, a incompatibilidade que se acreditava existir entre ciência e religião tende a desaparecer, à medida que ambas progridem e vão sendo melhor compreendidas pelo homem. Devem, portanto, andarem juntas, porque ambas objetivam o bem do homem. A ciência, tornando melhor a qualidade de vida, com suas conquistas, principalmente, no campo da medicina; a religião, melhorando moralmente o homem, ensinando-o o caminho da verdadeira felicidade.

O reconhecimento da importância da fé por parte desses cientistas é mais um passo na direção da compatibilidade entre ciência e religião. E o Espiritismo dá uma contribuição valiosa, ao demonstrar que o poder da fé se manifesta através da ação magnética que possibilita o homem atuar sobre os fluidos, modificando-lhes as qualidades e lhes dando impulso irresistível. Daí decorre que o poder da fé pode operar singulares efeitos, tais como a cura de enfermidades consideradas incuráveis. Pesquisas realizadas em Universidades comprovam que os pacientes que são portadores de uma fé sincera e inabalável obtêm melhores resultados em tratamentos que lhes são ministrados em diversas situações de enfermidades, ao passo que aqueles descrentes colhem resultados inferiores.

  • Sergio Rodrigues é espírita e colaborador do Espiritismo.Net.