Carregando...

Uma revolução em curso na medicina mudará para sempre a forma de tratar o paciente. Médicos e hospitais começam a adotar a espiritualidade e a esperança como recursos para o combate de doenças. Jorge Hessen comenta.

  • Data :02/10/2008
  • Categoria :

Tratamentos para a alma

Médicos e hospitais começam a adotar a espiritualidade e a esperança como recursos para o combate de doenças

*ADRIANA PRADO E GREICE RODRIGUES - * Colaborou: Cilene Pereira

Há uma revolução em curso na medicina que mudará para sempre a forma de tratar o paciente. Médicos e instituições hospitalares do mundo todo começam a incluir nas suas rotinas de maneira sistemática e definitiva a prática de estimular nos pacientes o fortalecimento da esperança, do otimismo, do bom humor e da espiritualidade. O objetivo é simples: despertar ou fortificar nos indivíduos condições emocionais positivas, já abalizadas pela ciência como recursos eficazes no combate a doenças. Esses elementos funcionariam, na verdade, como remédios para a alma – mas com repercussões benéficas para o corpo. No Brasil, a nova postura faz parte do cotidiano de instituições do porte do Instituto do Coração (InCor), em São Paulo, da Rede Sarah Kubitschek e do Instituto Nacional de Traumatologia e Ortopedia (Into), no Rio de Janeiro, três referências nacionais na área de reabilitação física. Nos Estados Unidos, o conceito integra a filosofia de trabalho, entre outros centros, do Instituto Nacional do Câncer, um dos mais importantes pólos de pesquisa sobre a enfermidade do planeta, e da renomada Clínica Mayo, conhecida por estudos de grande repercussão e tratamentos de primeira linha.

A adoção desta postura teve origem primeiro na constatação empírica de que atitudes mais positivas traziam benefício aos pacientes. Isso começou a ser observado principalmente em centros de tratamento de doenças graves como câncer e males que exigem do indivíduo uma força monumental. No dia-a-dia, os médicos percebiam que os doentes apoiados em algum tipo de fé e que mantinham a esperança na recuperação, de fato apresentavam melhores prognósticos. A partir daí, pesquisadores ligados principalmente a essas instituições iniciaram estudos sobre o tema.

Hoje há dezenas deles. Um exemplo é um trabalho publicado na edição deste mês da revista científica BMC Câncer , sugerindo que o otimismo é um fator de proteção contra o câncer de mama. “Verificamos que mulheres expostas a eventos negativos têm mais risco de contrair a doença do que aquelas que apresentam maiores sentimentos de felicidade e positivismo”, explicou Ronit Peled, da Universidade de Neguev, de Israel, autor da pesquisa. Na última edição do Annals of Family Medicine – publicação de várias sociedades científicas voltadas ao estudo de medicina da família – há outra mostra do que vem sendo obtido. Uma pesquisa divulgada na revista revelou que homens otimistas em relação à própria saúde de alguma forma ficaram mais protegidos de doenças cardiovasculares. Os cientistas acompanharam 2,8 mil voluntários durante 15 anos. Eles constataram que a incidência de morte por infarto ou acidente vascular cerebral foi três vezes menor entre aqueles que no início estavam mais confiantes em manter uma boa condição física. Provas dos efeitos da adoção da espiritualidade na melhora da saúde também começaram a surgir. Nos estudos sobre o tema, a prática aparece associada à redução da ansiedade, da depressão e à diminuição da dor, entre outras repercussões.

A partir de informações como essas, os cientistas resolveram identificar o que levava a esse impacto. Chegaram basicamente a duas razões. Uma é de natureza comportamental. Em geral, quem é otimista, tem esperança e cultiva alguma fé costuma ter hábitos mais saudáveis. Além disso, essas pessoas seguem melhor o tratamento. “Uma postura positiva leva a gestos positivos. Os pacientes se cuidam mais, alimentam-se bem, fazem direito a fisioterapia, mesmo que ela seja dolorosa”, explica a clínica geral carioca Cláudia Coutinho.

A outra explicação tem fundamento biológico. Está provado que a manutenção de um estado de espírito mais seguro e esperançoso desencadeia no organismo uma cadeia de reações que só trazem o bem. “Se o paciente é otimista, encara um problema de saúde como um desafio a ser vencido. Nesse caso, as alterações ocorridas no corpo poderão ser usadas a seu favor”, explica o pesquisador Ricardo Monezi, do Instituto de Medicina Comportamental da Universidade Federal de São Paulo. O bom humor, por exemplo, é capaz de promover o aumento da produção de hormônios que fortalecem o sistema de defesa, fundamental quando o corpo precisa lutar contra inimigos. Além disso, o riso provoca relaxamento de vários grupos musculares, melhora as funções cardíacas e respiratórias e aumenta a oxigenação dos tecidos.

É esse arcabouço de informações que permite hoje o uso, na prática, da espiritualidade, do otimismo, da esperança e do bom humor como recursos terapêuticos dentro da medicina. Nos Estados Unidos, por exemplo, pesquisadores da Universidade do Alabama preparam-se para começar a aplicar um tratamento batizado de “terapia da esperança”. O sistema consiste em ajudar os pacientes a construir e a manter a esperança diante da doença. “O primeiro passo é auxiliá-los a encontrar um objetivo importante que dê sentido a suas vidas. Depois, aumentar a motivação para alcançá-lo e orientá-los sobre os caminhos a serem seguidos”, explicou à ISTOÉ Jennifer Cheavens, da Universidade de Ohio e participante do grupo que desenvolveu a novidade. Essa construção é feita com base em técnicas usadas na terapia cognitivo-comportamental, cujo objetivo é treinar o indivíduo a pensar e a agir de forma diferente para conseguir lidar de modo mais eficiente diante de condições adversas. O treinamento é feito com duas sessões semanais realizadas durante dois meses. A terapia será usada em portadores de deficiências visuais e nas pessoas responsáveis por seus cuidados. “Acreditamos que ela ajudará muito na redução da depressão e de outros problemas associados à perda da visão. Os pacientes ficarão mais motivados a lutar contra as dificuldades e a participar dos trabalhos de reabilitação”, explicou à ISTOÉ Laura Dreer, professora do departamento de oftalmologia da Universidade do Alabama, nos EUA.

No Brasil, a inclusão da ferramenta na prática médica está mudando a rotina dos hospitais. No Instituto de Ortopedia, no Rio de Janeiro, por exemplo, o trabalho médico é acompanhado pelo suporte psicológico, dedicado especialmente a fortalecer uma atitude mais positiva. O trabalho, claro, não é simples. Os pacientes costumam ser vítimas de traumas medulares ocorridos em situações como acidentes ou quedas. De uma hora para outra, têm a vida totalmente limitada. “Por isso, precisamos ajudá-los a enfrentar a nova situação. Eles têm de passar por uma reabilitação física e emocional”, explica a psicóloga Fátima Alves, responsável pelo grupo. E quem faz isso usando o otimismo e a esperança como armas sai ganhando. “Mostramos principalmente aos mais descrentes que a postura positiva no enfrentamento da doença é um remédio” , afirma Tito Rocha, coordenador da unidade hospitalar do instituto. Em breve, eles abrirão um grupo para incentivar o cultivo da espiritualidade pelos doentes.

Na Rede Sarah, os pacientes são estimulados a participar de atividades que melhorem o humor e a disposição. Entre eles, estão o remo, a dança e os jogos. “No processo de reabilitação, esses recursos são fundamentais”, afirma Lúcia Willadino Braga, presidente da Rede Sarah e considerada uma das melhores neurocientistas do País. “A doença deixa de ser o foco. Quando isso acontece, a recuperação é acelerada. O paciente fica menos tempo internado e retorna às suas atividades mais rapidamente”, afirma. Constatações semelhantes são obtidas no InCor, em São Paulo. Lá, quem está internado recebe suporte psicológico para não entrar em depressão – já considerada fator de risco para doenças cardíacas – e manter o otimismo. “É preciso dar força para o espírito para que o corpo se recupere”, afirma o cardiologista Carlos Pastore, diretor de serviços médicos da instituição.

Talvez o símbolo mais emblemático do fim do preconceito da medicina ocidental contra questões relativas a emoções e espiritualidade seja o que está acontecendo na Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP), a mais tradicional do País. Em novembro, a instituição sediará um evento para mostrar aos profissionais de saúde a importância de recursos como a espiritualidade e o bom humor na recuperação de pacientes. O curso será ministrado pelo geriatra Franklin dos Santos, professor de pós-graduação da disciplina de emergências médicas da universidade. No programa, há um bom espaço para ensinar os médicos e enfermeiros a usarem essas ferramentas. “Discutimos como isso deve ser aplicado na prática”, diz o médico, que tem dado palestras pelas escolas de medicina do País inteiro.

Nos Estados Unidos, também há um esforço para treinar os profissionais de saúde. Só para se ter uma idéia, o Instituto Nacional de Câncer americano criou uma espécie de guia para orientar médicos, enfermeiros e psicólogos sobre como usar a espiritualidade do paciente a seu favor. Todo esse interesse é o sinal mais patente de que a revolução vai durar. Por isso, ninguém deve se surpreender se quando chegar ao consultório médico for indagado sobre suas condições de saúde, obviamente, mas também sobre sua relação com a espiritualidade ou disposição de esperança. “Questões como essas devem começar a ser cada vez mais levantadas”, defende Brick Johnstone, professor de psicologia médica da Universidade Missouri-Columbia, nos EUA.

Matéria publicada na Revista ISTOÉ , em 27 de agosto de 2008.

Jorge Hessen comenta*

ESPIRITUALIDADE, FÉ E PRECE COMO RECURSOS TERAPÊUTICOS DOS HOSPITAIS MODERNOS

As implicações da espiritualidade na saúde vêm sendo, cientificamente, avaliadas e documentadas em centenas de artigos acadêmicos, demonstrando sua relação com vários aspectos das saúdes física e mental, provavelmente positivos e possivelmente causais. A rigor, associações entre a espiritualidade (religiosidade) e atividade imunológica, saúde mental, neoplasias, doenças cardiovasculares e mortalidade, além de aspectos de intervenção com uso de prece intercessória, têm sido consubstanciadas nos ambientes hospitalares.

Há crescente acúmulo de evidências sobre a relação entre espiritualidade (religiosidade) e saúde física. Contudo, por essas evidências ainda não serem adequadamente robustas, este apenas se constitui em promissor campo de investigação. É, sem dúvida, um campo de pesquisa com enorme potencial. Até porque, investigações sistemáticas demonstram que doentes espiritualizados lidam melhor com os estresses da vida, recuperam-se mais rapidamente de depressão e apresentam menos ansiedade do que aqueles que lidam com emoções negativas, descrentes e materialistas.

Identifica-se, nesta modalidade de assistência, que há um conceito de saúde como algo, fruto do equilíbrio entre o homem e o mundo, entre o imanente e o transcendente, que se aproxima ao que se denomina holismo e visão sistêmica da vida. A imprensa tem noticiado que médicos e instituições hospitalares do mundo contemporâneo já incluem nas suas rotinas, de maneira sistemática e definitiva, a prática de estimular os pacientes quanto a fortalecer a esperança, o otimismo, o bom humor e a espiritualidade (religiosidade), como recursos imprescindíveis no combate às doenças. Esses procedimentos funcionam como remédios para a alma, obviamente, com repercussões benéficas para o corpo físico. Isso tem sido observado, sobretudo, em centros de tratamento de doenças graves, como câncer e patologias que exigem do enfermo uma força sobre-humana.

Atualmente, muitos médicos percebem que os doentes, apoiados em algum tipo de fé e que mantêm a esperança na recuperação de fato, apresentam melhores prognósticos. Essa prática aparece associada à redução da ansiedade, da depressão e à diminuição da dor, entre outras repercussões. Está provado que a manutenção de um estado de espírito mais seguro e esperançoso desencadeia, no organismo, uma capilaridade de reações que só trazem o bem.

Pesquisadores da Universidade do Alabama, nos Estados Unidos, têm aplicado um tratamento nominado de “terapia da esperança”. O processo consiste em ajudar os pacientes a construírem e a manterem a esperança diante da doença, consoante a máxima de que é preciso dar força ao espírito para que o corpo se recupere. O Instituto Nacional do Câncer, americano, criou uma espécie de guia para orientar médicos, enfermeiros e psicólogos sobre como usar a espiritualidade (religiosidade) do paciente em benefício próprio. Sua aplicabilidade se estende, também, a pacientes psicóticos, adultos e crianças; portadores de deficiências outras, assim como suicidas e drogaditos (pessoa viciadas em drogas).

Na medida em que o paciente faz uma introspecção para potencializar a fé, possibilita-se o reconhecimento de sua identidade e a reconstrução de sua auto-estima, que o leva a recuperar a esperança e a confiança em seus próprios recursos adaptativos. Constrói-se, assim, uma intervenção que enfatiza a importância da elaboração de um novo projeto de vida para si mesmo. Os estímulos da espiritualidade (religiosidade) curam o paciente ao impor ordem sobre a experiência caótica que nele se desenvolveu.

O Espiritismo explica que é através de um processo de desenvolvimento pessoal que o doente ganha forças para neutralizar a doença. O Espiritismo busca persuadir o enfermo a reorientar seu comportamento mental pela fé inteligente, raciocinada, sugerindo uma ética de caridade, da qual deve resultar um modo particular de motivação para uma vida engrandecida e de se sobrepor aos apelos do mundo físico. A espiritualidade (religiosidade) em consonância com a saúde são metas a serem conquistadas àqueles que desejam, realmente, autovencer-se.

A doença permanece como entidade de impacto amplo sobre aspectos de abordagem, desde a fisiopatologia básica até sua complexa relação social, psíquica e econômica. É fundamental reconhecer que esses diversos aspectos estão correlacionados em múltipla interação. Na medida em que os estudos, na área da espiritualidade e da saúde, intensificam-se, uma vez observados os benéficos resultados na restauração da energia dos pacientes debilitados, começarão a surgir as primeiras teses (ainda que heterodoxas), para aperfeiçoar conclusões e obter resultados mais sólidos sobre o tema.

Independentemente dos agentes causadores da doença, a estimulação dos valores espirituais se coloca em uma posição bastante conveniente: não apenas demonstra dividir responsabilidades com a medicina moderna, mas sinaliza intervir onde esta se revela impotente. Nesse sentido, reflitamos sobre a importância do estímulo da prece nos hospitais.

A oração é uma prática milenar de diversas e distintas religiões, tradicionalmente associada ao bem-estar, promoção de saúde, introspecção e espiritualidade. A propósito, pela religiosidade, pratica-se melhor o exercício da prece. É óbvio que “a espiritualidade não vem suplantar a medicina e os médicos; vem simplesmente provar que há coisas que eles não sabem e os convidar para estudá-las; que a natureza tem recursos que eles ignoram; que o elemento espiritual que eles desconhecem, não é uma quimera, e que, quando o levarem em conta, abrirão novos horizontes à ciência e terão mais êxitos do que agora”.(1)

A prece atua sobre os indivíduos, influenciando o sistema imunológico, segundo estudo pioneiro realizado no ano de 1988, no Hospital Geral de São Francisco, na Califórnia. Nesse hospital “foi possível comprovar que os pacientes que receberam preces apresentaram significativas melhoras, necessitando inclusive de menor quantidade de medicamentos”.(2) Para nós, espíritas, ela se reveste de características especiais, pois “a par da medicação ordinária, elaborada pela Ciência, o magnetismo nos dá a conhecer o poder da ação fluídica e o Espiritismo nos revela outra força poderosa na mediunidade curadora e a influência da prece”.(3) Allan Kardec, ao emitir seus comentários na Questão 662, em O Livro dos Espíritos, afirma que “o pensamento e a vontade representam em nós um poder de ação que alcança muito além dos limites da nossa esfera corporal”.(4) A rigor “a eletricidade é energia dinâmica; o magnetismo é energia estática; o pensamento é força eletromagnética”.(5)

Mas, uma coisa é clara, a prece não pode mudar a natureza das provas pelas quais o homem tem que passar, ou, até mesmo, desviar-lhe seu curso, e isto, porque elas estão nas mãos de Deus. Há provas que o Homem deve suportar até o fim de seus dias, mas Deus leva sempre em conta a resignação. Embora as preces que fazemos não irão desviar-nos de nossos problemas e desilusões, elas são um bálsamo reconfortante para a nossa alma enfermiça, pois nos faz penetrar em estados de suave sossego e gozos que somente aquele que ora é capaz de decifrar. Tem, assim, a prece, o inefável dom de nos dar forças para suportarmos lutas e problemas, internos e externos, de nos colocar em posição de vencermos obstáculos que, antes, pareciam instransponíveis.

O pensamento é dínamo condutor da vida física para a vida espiritual, que nos permite estabelecer um relacionamento positivo com os espíritos que participam das atividades curadoras. Ao mesmo tempo em que nos permite tudo isso, ele também poderá nos ligar a espíritos cuja presença será prejudicial ao ato de curar. Toda moeda tem dois lados e as leis da natureza são estradas de mão dupla. A mente é fonte de energia curativa ou de energia destruidora.

Fonte de referências:

  1. Kardec, Allan. Revista Espírita, novembro de 1866;

  2. Fonte disponível no site http://www.celsotraub.com/medsomaeterica/efeitoprecesaude.htm , acessado em 18/09/2008;

  3. Kardec, Allan. O Evangelho Segundo o Espiritismo, Rio de Janeiro: Ed. FEB, 2004, Cap. 28, item 77;

  4. Kardec, Allan. O Livro dos Espíritos, Rio de Janeiro: Ed. FEB, 2000, questão 662;

  5. Xavier, Francisco Cândido. Pensamento e Vida, 9ª ed. Rio de Janeiro: FEB, 1991. P. 16.

  • Jorge Hessen é natural do Rio de Janeiro, nascido em 18/08/1951. Servidor público federal lotado no INMETRO. Licenciado em Estudos Sociais e Bacharel em História. Escritor (dois livros publicados), Jornalista e Articulista com vários artigos publicados.