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A revista Galileu publicou matéria sobre o adiantamento em 20 segundo que o conhecido “relógio do Juízo Final” sofreu. No início de 2020, faltariam 100 segundo para o horário que foi estabelecido pelos cientistas da Universidade de Chicago como “meia noite” em que aconteceria a destruição do planeta. Este relógio foi criado em 1947, durante a Guerra Fria. Breno Henrique de Sousa comenta.

  • Data :17/02/2024
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“Doomsday Preppers: as comunidades que se preparam para o fim do mundo”

A revista Galileu publicou matéria sobre o adiantamento em 20 segundo que o conhecido “relógio do Juízo Final” sofreu. No início de 2020, faltariam 100 segundo para o horário que foi estabelecido pelos cientistas da Universidade de Chicago como “meia noite” em que aconteceria a destruição do planeta. Este relógio foi criado em 1947, durante a Guerra Fria.

A matéria traz relatos de comunidades que se preparam para a catástrofe do “Fim do Mundo”. De olho neste segmento, há uma indústria dedicada ao tema com lojas que vendem produtos de sobrevivência online, comidas prontas, geradores solares e estoques de alimentos por 6 meses.

O presidente da organização responsável pelo relógio explica que o objetivo é a promoção do debate sobre atitudes construtivas que afastem o relógio da “meia noite”.

A íntegra da matéria pode ser acessada em: https://revistagalileu.globo.com/Sociedade/noticia/2020/02/doomsday-preppers-comunidades-que-se-preparam-para-o-fim-do-mundo.html

Breno Henrique de Sousa* comenta

Existe fim do mundo para o Espiritismo? Respondo diretamente que não existe como um evento transcendental onde o céu se abrirá e Deus aparecerá para julgar-nos definitivamente. Em um sentido mais amplo, todos caminhamos para a plenitude espiritual, porém, a perfeição relativa que podemos alcançar não se dá nesse mundo material como o conhecemos. O mais importante para o Espiritismo é a vida espiritual que é a verdadeira e primordial. O mundo material também progride, mas esse processo não é linear, como uma escadinha onde os mundos sobem de grau em grau, existem percalços que podem – não impedir – mas embaraçar o progresso, afinal, se não fosse assim, não existiria o livre arbítrio (ver questões 781 e 781a de “O Livro dos Espíritos”).

Nem todos os mundos estão destinados à vida física e nem todos estão destinados a cumprir todas as etapas da evolução física (Q. 235 e 236 de “O Livro dos Espíritos”). Muitos orbes são moradas transitórias dos Espíritos e podem, muito bem, por algum cataclismo cósmico, deixarem de existir, sem que isso signifique qualquer impedimento à evolução espiritual. O planeta Terra já passou por diversas extinções em massa, milhares de espécies foram extintas a tal ponto que 98% das que aqui viveram não existem mais. Pensando em civilizações humanas, diversas delas já tiveram seu apogeu e queda. Quando perguntados sobre o assunto, os Espíritos disseram que tais civilizações não retrogradaram, mas que os Espíritos que estavam encarnados naqueles povos e foram responsáveis pelo seu ápice, não estão mais ali encarnados, e os seus substitutos não são tão adiantados quanto seus antepassados (Q. 786 a 788 de “O Livro dos Espíritos”).

Pensando nesses mundos, milhares de espécies e civilizações, todos passaram por seu fim de mundo. Nosso destino enquanto seres espirituais é o progresso e a plenitude, mas não sabemos se isso se dará aqui, nem qual será o destino físico do nosso planeta. O mundo de regeneração é muito mais um destino espiritual do que físico. Pode dar-se que planetas sejam habitados fisicamente por espíritos adiantados, não sei se a Terra chegará lá, de qualquer forma, fisicamente, nosso planeta está destinado a deixar de existir em algum momento. É provável que quando isso acontecer já tenhamos galgado, enquanto humanidade planetária, um outro patamar evolutivo, ou que estejamos encarnados em outros mundos, mas esse será o fim deste planeta conforme a Lei Divina de Destruição que contrabalança outra Lei Divina – a de Progresso. No entanto, muito antes que isso aconteça, existem ameaças civilizatórias reais, que podem comprometer gravemente a sobrevivência humana e obstar a marcha do progresso. Tal qual as civilizações que passaram por seu apogeu e queda, podemos cair, sem que isso represente um retrocesso no âmbito geral da Lei de Progresso. Volta o fantasma das armas atômicas, as pandemias, catástrofes ambientais agravadas por nossos desmandos com o meio ambiente, sem falar de cataclismos naturais como um imenso meteoro que apesar de nos parecer muito raro, não é tão improvável numa escala de tempo geológico.

Mas não pretendo entrar numa discussão infinita sobre a objetividade deste fato. Se e quando o mundo vai acabar não é um tema novo. Todas as viradas de século, nas pandemias, nas guerras e nas crises civilizatórias fala-se do fim do mundo. No período da guerra fria havia um grande medo disseminado de uma guerra nuclear. Para outros esse medo tinha um tom mais profético, baseado nas herméticas profecias de Nostradamus ou nas interpretações religiosas do apocalipse. De certa forma, para muita gente, guerras e pandemias significou, de fato, no fim do seu mundo, senão da própria vida, pelo menos da vida que levavam, pela morte e destruição causada por essas catástrofes.

Apesar de todas essas ameaças reais, o certo é que todas as previsões falharam e não sabemos realmente se e quando o mundo vai acabar. Mas o que proponho como reflexão não são essas ameaças objetivas e a proximidade do fim do mundo, mas a respeito dessa preocupação enquanto fenômeno social. Importa pensar sobre o reflexo disso no comportamento de determinados grupos e indivíduos, algo que pode tornar-se obsessivo, refletindo sintomas de outros problemas mais profundos.

Esse é um tema sempre presente nas religiões e mais atualmente na cultura pop através de centenas de filmes, séries e livros. A ficção embarcou no apocalipse o que acabou tornando-o um lucrativo nicho de mercado, afinal, logo encontrou-se uma maneira de transformar a coisa em dinheiro, não apenas através da indústria cultural, mas também pela venda de itens de sobrevivência, cursos, lucrativos canais nas redes sociais e até mesmo bunkers a preços exorbitantes. Muitos bilionários entraram nessa vibe e têm construído bunkers a custo milionário o que estimula ainda mais a imaginação das pessoas, afinal, se os mais ricos estão se preparando, podemos pensar que algo que não sabemos está para acontecer.

O medo do fim do mundo pode ser um poderoso instrumento de adesão a grupos religiosos e conspiracionistas, afinal, o medo tem o poder de entorpecer a razão. Ao mesmo tempo, diante da certeza do fim, preocupações de ordem global tornam-se irrelevantes, afinal, não há mais o que fazer pelo mundo e precisamos salvar a própria pele. Dessa forma, construir um bunker parece uma boa solução. O problema dessa visão é que ela é desmobilizante do ponto de vista político e social. Se podemos fazer algo para salvar o mundo ou, pelo menos, adiar o seu fim, pensar apenas na própria sobrevivência (ou do seu grupo de sobrevivencialistas) não parece o melhor caminho.

Ao mesmo tempo, observamos também indivíduos que diante da desesperança pelo mundo assumem um comportamento hedonista, bem ao modo Carpe Dien quando os romanos diante do iminente fim do seu império, tentavam usufruir o máximo o que lhes restava com orgias, bebedeiras e todos os tipos de excessos.

Talvez o mal-estar civilizacional causado por um modelo civilizatório hiper materialista, desconectados uns dos outros, de valores espirituais e da natureza nos leve a ansiar o fim. Há uma espécie de raiva do mundo que sob nossa ótica pessimista “não deu certo” e o desejo de acabar com tudo para começar de novo. Outros, mais tradicionais, sentem falta de uma sociedade patriarcal regida pela força, quem sabe se o mundo cair de novo na barbárie o poder volta a ser a lei do mais forte?

Certamente, devemos colaborar com a marcha do progresso, estar alertas sobre as reais ameaças civilizatórias. Talvez devêssemos refletir mais profundamente sobre nossas preocupações apocalípticas e se elas não escondem uma profunda insatisfação com a vida e com o mundo.

  • Breno Henrique de Sousa é paraibano, professor da Universidade Federal da Paraíba nas áreas de Ciências Agrárias e Meio Ambiente. Está no movimento Espírita desde 1994, sendo articulista e expositor. Atualmente faz parte da Federação Espírita Paraibana e atua em diversas instituições na sua região.