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  • Cientistas conseguem reativar cérebros de porcos quatro horas após morte

As descobertas devem ampliar o debate sobre a barreira entre a vida e a morte, além de fornecer novas maneiras de pesquisar doenças como a de Alzheimer. Breno Henrique de Sousa comenta.

  • Data :30 Jun, 2019
  • Categoria :

James Gallagher

Repórter de saúde e ciência da BBC News

Cientistas americanos ligados à Universidade Yale reativaram parcialmente cérebros de porcos quatro horas depois de os animais terem sido abatidos.

As descobertas devem ampliar o debate sobre a barreira entre a vida e a morte, além de fornecer novas maneiras de pesquisar doenças como a de Alzheimer.

O estudo mostrou que a morte de células cerebrais poderia ser interrompida e que é possível até mesmo restabelecer algumas conexões no cérebro.

Mas não havia sinais do cérebro reativado que indicassem consciência.

As descobertas desafiam a ideia de que o cérebro entra em declínio irreversível poucos minutos depois de interrompido o fornecimento de sangue.

O que os cientistas fizeram?

Foram coletados 32 cérebros de porcos em um matadouro.

Quatro horas depois, os órgãos foram conectados a um sistema feito pela equipe da Universidade Yale, nos Estados Unidos.

Ele bombeava em ritmo pré-determinado, para imitar o pulso, um líquido especialmente projetado em torno do cérebro, que continha um sangue sintético para transportar oxigênio e drogas para retardar ou reverter a morte das células cerebrais.

Os cérebros de porco receberam o coquetel restaurador por seis horas.

O que o estudo mostrou?

O estudo, publicado na revista Nature, mostrou uma redução na morte das células cerebrais, a restauração dos vasos sanguíneos e alguma atividade cerebral.

Os pesquisadores descobriram sinapses em funcionamento - as conexões entre as células do cérebro que permitem a comunicação.

Os cérebros também mostraram uma resposta normal à medicação e consumiram a mesma quantidade de oxigênio que um cérebro normal.

Isso tudo dez horas depois de os porcos serem decapitados.

Um eletroencefalograma, no entanto, não detectou sinais de atividade elétrica, o que sinalizaria consciência ou percepção.

Eles ainda eram, fundamentalmente, cérebros mortos.

O que podemos entender a partir disso?

Essa pesquisa afeta ideias sobre como o cérebro morre, algo que muitos pensavam que acontecia rapidamente e irreversivelmente sem o suprimento de oxigênio.

“A morte celular no cérebro ocorre através de uma janela de tempo mais longa do que pensávamos anteriormente”, afirmou Nenad Sestan, professor de Neurociência de Yale.

“O que estamos mostrando é que o processo de morte celular é um processo gradual. E que alguns desses processos podem ser adiados, preservados ou mesmo revertidos.”

Esses experimentos são éticos?

Os cérebros dos porcos vieram da indústria de carne suína, logo, os animais não foram criados em laboratório para este experimento.

Mas os cientistas de Yale estavam tão preocupados que os cérebros porcos pudessem recobrar consciência que aplicaram drogas para reduzir qualquer atividade cerebral.

E a equipe monitorava constantemente os cérebros para ver se havia algum sinal de funções cerebrais superiores.

Nesse caso, eles teriam usado anestesia e encerrado o experimento.

Estudiosos de ética defenderam também na Nature que novas diretrizes são necessárias para este campo, porque os animais usados para pesquisa podem acabar em uma “área cinzenta - não viva, mas não completamente morta”.

Qual é o objetivo?

O trabalho terá um efeito positivo imediato para os cientistas que estudam o cérebro e doenças com a de Alzheimer.

O órgão é a estrutura mais complexa do universo conhecido, mas técnicas como o congelamento de fatias do cérebro ou o crescimento de colônias de células cerebrais em um prato não permitem que os pesquisadores explorem toda a fiação 3D do cérebro.

A longo prazo, os cientistas esperam encontrar melhores formas de proteger o cérebro após traumas como um AVC.

Mas os pesquisadores dizem que ainda é muito cedo.

“Nós ainda não sabemos se seríamos capazes de restaurar a função cerebral normal”, disse Sestan, professor de Neurociência de Yale.

O estudo muda o significado da morte?

Por ora, não, mas alguns especialistas em ética médica dizem que devemos debater o tema agora, pois as pessoas que têm morte cerebral são uma importante fonte de órgãos para transplante.

Dominic Wilkinson, professor de ética médica e consultor neonatologista em Oxford, disse: “Uma vez que alguém tenha sido diagnosticado como morte cerebral, não há como a pessoa se recuperar. A pessoa se foi para sempre.”

“Se, no futuro, fosse possível restaurar a função do cérebro após a morte, para trazer de volta a mente e a personalidade de alguém, isso teria, é claro, implicações importantes para nossas definições de morte.”

Mas esse não é o caso atualmente.

A professora Tara Spiers-Jones, vice-diretora do Center for Discovery Brain Sciences da Universidade de Edimburgo, disse que o estudo está longe de preservar a função do cérebro humano após a morte.

“É, em vez disso, uma preservação temporária de algumas das funções celulares mais básicas no cérebro dos porcos, e não a preservação do pensamento e da personalidade.”

Os cérebros dos porcos poderiam estar conscientes?

Neste experimento, a resposta é claramente não. Os cérebros estavam efetivamente silenciosos.

Mas a pesquisa gera tantas perguntas quanto respostas:

Por quanto tempo os pesquisadores podem manter o cérebro?
Os resultados seriam ainda melhores se os pesquisadores não esperassem quatro horas antes de começar?
Além disso, a equipe usou drogas para suprimir a atividade cerebral - os cérebros decapitados teriam ficado conscientes se não tivessem recebido essas substâncias?

Notícia publicada na BBC Brasil , em 17 de abril de 2019.

Breno Henrique de Sousa* comenta

Limites entre a vida e morte

O Espiritismo afirma que após a morte física não há a possibilidade de retorno da alma ao mesmo corpo. Porém, onde está o limite entre a vida e a morte? Essa fronteira não está definida de forma definitiva nem mesmo pela ciência. A própria definição sobre o que é vida tem mudado ao longo do tempo. Na perspectiva espírita, a definição de vida é mais ampla que a vida biológica, é o que queremos dizer quando usamos expressões como “vida após a morte”, que, nesse caso, obviamente não se refere à vida física, mas a continuidade da consciência e individualidade em outro plano de existência.

Inclusive, algumas passagens bíblicas onde Jesus aparentemente ressuscita os mortos trata-se na verdade da reanimação de pessoas que se encontravam em estado cataléptico ou de coma e não definitivamente mortas. É natural que naquela época um cataléptico fosse considerado morto, até porque em alguns casos de catalepsia a pessoa chega a exalar odores cadavéricos, como foi o caso de Lázaro. Porém, um fio de vida ainda existia, de outra maneira Deus estaria derrogando as suas próprias leis estabelecidas na natureza desde a criação do mundo.

O experimento descrito na reportagem levanta questões de cunho espiritualista. É possível trazer um corpo de volta à vida? E, nesse caso, o espírito é trazido de volta ao corpo? Será que o experimento desmente a afirmativa espírita de que não é possível voltar ao mesmo corpo físico após a morte?

De forma alguma o experimento compromete o pensamento espírita, muito pelo contrário. É preciso ler a reportagem com atenção, sobretudo quando o doutor Nenad Sestan afirma: “A morte celular no cérebro ocorre através de uma janela de tempo mais longa do que pensávamos anteriormente”, ou seja, as experiências demonstram que a morte é um processo mais lento e gradual do que se imaginava, isso é justamente o que afirma o Espiritismo em O Livro dos Espíritos :

  1. Como se opera a separação da alma e do corpo? “Sendo rompidos os elos que a retinham, ela se desprende.”

a) A separação se opera instantaneamente e por uma brusca transição? Há uma linha de demarcação nitidamente traçada entre a vida e a morte? “Não; a alma se desprende gradualmente e não escapa, como um pássaro cativo, restituído, subitamente, à liberdade. Esses dois estados se tocam e se confundem; assim, o Espírito se desprende, pouco a pouco, de seus laços: eles se desatam, não se quebram.”

Obras mediúnicas, como a do espírito André Luiz (psicografia de Chico Xavier), também descrevem a desencarnação como um processo lento e gradual, que é diferente para cada indivíduo, dependendo do seu gênero de morte e de sua condição evolutiva. Outro aspecto sobre o qual o Espiritismo se adiantou é a possibilidade da continuidade, por algum tempo, da vida orgânica após o espírito deixar o corpo, isso acontece, por exemplo, nos casos de morte cerebral:

  1. A separação definitiva da alma e do corpo pode acontecer antes da cessação completa da vida orgânica? “Na agonia, a alma, algumas vezes, já deixou o corpo: nada mais há senão a vida orgânica. O homem não tem mais consciência de si mesmo e, todavia, resta-lhe ainda um sopro de vida. O corpo é uma máquina que o coração faz funcionar; ele existe, enquanto o coração faz circular o sangue nas veias, e para isso, não necessita da alma.”

O que vimos na reportagem não foi uma ressurreição, mas sim a possível ampliação dos limites entre a vida e a morte, algo que já afirmava o Espiritismo; além disso, a reanimação parcial das células cerebrais dos porcos utilizados no experimento não significa que eles voltaram a ser seres conscientes, como foi dito pelos próprios cientistas. Os procedimentos apenas reanimaram parcialmente a vida orgânica. O que temos visto até o momento é a confirmação dos postulados espíritas pela Ciência que lentamente amplia seus horizontes, alcançando pouco a pouco a realidade da vida espiritual.

  • Breno Henrique de Sousa é paraibano, professor da Universidade Federal da Paraíba nas áreas de Ciências Agrárias e Meio Ambiente. Está no movimento Espírita desde 1994, sendo articulista e expositor. Atualmente faz parte da Federação Espírita Paraibana e atua em diversas instituições na sua região.