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  • Ismael - Um Espírito, Bezerra De Menezes – Um Cristão e a Seiva do Evangelho na 'Pátria Coração do Mundo'

Uma narrativa histórica sobre o Espiritismo no Brasil, seus principais personagens e instituições perante o esforço da Unificação do movimento espírita brasileiro.

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OS PRIMÓRDIOS DO “ESPIRITISMO”

Segundo as fontes que colhemos, identificamos os primórdios do movimento “espírita” brasileiro (pré-Codificação) nas experiências dos partidários do mesmerismo.(1)

Dentre os adeptos topamos com os médicos homeopatas Benoît Jules Mure (francês) e João Vicente Martins (português), ambos chegaram ao país em 1840. Haviam mais aderentes da técnica de Mesmer, a exemplo de José Bonifácio de Andrada e Silva (Patriarca da “Independência”), igualmente adepto à homeopatia, e Mariano José Pereira da Fonseca (Marquês de Maricá) que publicou um livro de essência “pré-espírita” em 1844. O Espírito Humberto de Campos explanou em “Brasil, Coração do Mundo, Pátria do Evangelho” que Benoît Jules Mure e João Vicente Martins, “fariam da medicina homeopática verdadeiro apostolado. Muito antes da codificação espírita, conheciam ambos os transes mediúnicos e o elevado alcance da aplicação do magnetismo espiritual. Introduziram vários serviços de beneficência no Brasil e traziam por lema, dentro da sua maravilhosa intuição, a mesma inscrição divina da bandeira de Ismael - “Deus, Cristo e Caridade”(2).

Foi no Rio de Janeiro que se formaram os precursores do movimento espírita brasileiro, mormente pelo grupo fundado pelo médico e historiador Alexandre José de Mello Moraes, integrado por Pedro de Araújo Lima (Marquês de Olinda), Bernardo José da Gama (Visconde de Goiana), José Cesário de Miranda Ribeiro (Visconde de Uberaba) e outros destacados personagens do Segundo Reinado. Há fontes que remontam ao ano de 1845, quando, no distrito de Mata de São João, Província da Bahia, foram registradas as primeiras manifestações do além-túmulo.

Alguns fenômenos das mesas girantes que ocorriam especialmente nos Estados Unidos da América e na Europa foram noticiados pela primeira vez no Brasil entre 1853 e 1854 no Jornal do Commércio, do Rio de Janeiro, no Diário de Pernambuco, de Recife, e em O Cearense, de Fortaleza. Porém, somente a partir de “1860 que encontramos as primeiras publicações espiritistas”.(3) Na capital do Brasil as primitivas sessões espíritas foram realizadas na década de 1860 por franceses, muitos deles exilados políticos do regime de Napoleão III de França.(4) Desses precursores mencionamos o jornalista Adolphe Hubert, editor do periódico “Courrier do Brésil”, o professor Casimir Lieutaud,(5) e a médium psicógrafa, Madame Perret Collard.(6) O primeiro periódico com trechos traduzidos das obras de Allan Kardec foi o “A Verdadeira Medicina Física e Espiritual associada a Cirurgia”, um jornal científico sobre as ciências ocultas e especialmente de propaganda magnetotherapia”, publicado de janeiro a abril de 1861 por Eduardo Monteggia.(7)

Em 1865 (mesmo ano do lançamento de “O Céu e o Inferno”), Luiz Olímpio Teles de Menezes criou, em Salvador, o “Grupo Familiar de Espiritismo” (primeira instituição espírita brasileira). Em 1866, Teles de Menezes publicou o opúsculo “O Espiritismo – Introdução ao Estudo da Doutrina Espírita”, contendo páginas extraídas e traduzidas de O Livro dos Espíritos. No mesmo ano, na cidade de São Paulo, a Tipografia Literária publicou “O Espiritismo reduzido à sua mais simples expressão”, de Allan Kardec (sem indicação de tradutor). Em 1869 (ano da desencarnação do Codificador), Luís Olímpio publicou Primeiro jornal espírita do Brasil - O “Eco do Além-Túmulo”, publicado em julho de 1869. Contava com 56 páginas e chegou a circular em Londres, Madri, Nova Iorque, Paris (Kardec fez menção a Luiz Olímpio Teles de Menezes na Revista Espírita, edição de novembro de 1865). Em novembro de 1873, foi fundada em Salvador a Associação Espírita Brasileira (extensão do “Grupo Familiar do Espiritismo”) e, no ano seguinte (1874), alguns membros dessa Associação fundaram o “Grupo Santa Teresa de Jesus”.

TORTEROLI , UM IGNOTO E INCÓGNITO LÍDER DOS “CIENTÍFICOS”

Um dos enigmáticos divulgadores da Doutrina dos Espíritos no século XIX foi Afonso Angeli Torteroli, fundador do “Centro da União Espírita do Brasil”, instituição que tinha a presunção de coordenar o movimento espírita brasileiro. Para esse objetivo (unificação) Torteroli organizou em 1881, no Rio de Janeiro o 1º Congresso Espírita Brasileiro. Sob sua influência e liderança, “as entidades da sombra trouxeram a obra ingrata da oposição ao trabalho produtivo da edificação evangélica no Brasil”.(8) Torteroli, então líder dos pretensos “científicos”, investiu impiedosamente contra Bezerra de Menezes (“místico”), e sob a densa liderança do emblemático genovê(9) ocorreram discórdias, agressões e inaceitáveis “nhenhenhéns”. Em verdade, após a desencarnação de Torteroli este se manifestou pela mediunidade de Chico Xavier expressando arrependimento. A carta foi psicografada no dia 4 de abril de 1950, nela, o italiano se penitencia por ter entendido o Espiritismo apenas como ciência e filosofia.(10) Sobre isso, os simpatizantes do visionário “academista” afirmam que a carta psicografada contém conteúdo anímico do médium de Uberaba. Para tais, a posição doutrinária assumida por Torteroli (estritamente “científica” e “filosófica”) não prejudicou sua militância espírita, tanto no que diz respeito à divulgação da obra de Allan Kardec, quanto à prática do assistencialismo.

GRUPO CONFÚCIO

Avancemos para outros eventos , pois, a bem da verdade os Benfeitores “sugeriram aos espiritistas brasileiros a necessidade de criar, no Rio de janeiro, um núcleo central das atividades, que ficasse como o órgão orientador [federação] de todos os movimentos da doutrina no Brasil".(11) A rigor, a instituição pioneira genuinamente espírita foi a Sociedade de Estudos Espiríticos - Grupo Confúcio, em 1873. Conforme previsto em seus estatutos, devia seguir os princípios e as formalidades expostos em O Livro dos Espíritos e em O Livro dos Médiuns. Suas atividades incluíam ainda o receituário gratuito de homeopatia e a aplicação de passes aos necessitados.

Entre as grandes façanhas do “Confúcio” destacou-se a tradução das obras básicas de Kardec para a língua portuguesa realizada por Fortúnio (pseudônimo de Joaquim Carlos Travassos). O lançamento da “Revista Espírita”(12), organizada e dirigida por Antônio da Silva Neto. Constituindo o segundo periódico espírita do Brasil e o primeiro do Rio de Janeiro. Na R.E. foram publicadas notáveis artigos doutrinários e de refutação aos inimigos da Doutrina, duramente atacada pelo “Jornal do Comércio”, nos anos de 1874/5, que tachava o Espiritismo de “epidemia mais perigosa que a febre amarela”, verdadeira fábrica de doidos”.(13)

O “Grupo Confúcio” foi efetivamente o embrião da ulterior Casa-Máter dos espíritas, “constituindo a base da obra tangível e determinada de Ismael, na terra brasileira”.(14) No grupo participavam, entre outros emissários do “Governador planetário” , Bittencourt Sampaio, Joaquim Carlos Travassos, Francisco de Siqueira Dias Sobrinho, Antônio da Silva Neto, Casemiro Lieutaud, “todos lutaram denodadamente contra a opinião hostil do tempo, contra o anátema, o insulto e o ridículo e, sobretudo, contra as ondas reacionárias das trevas do mundo invisível, para levantarem bem alto a bandeira de Ismael”.(15)

OUTROS GRUPOS

Ao “Grupo Confúcio” seguiu-se a Sociedade de Estudos Espíritas “Deus, Cristo e Caridade”, criado em 1876. 16 “Sob a lúcida direção de Bittencourt Sampaio, que, juntamente com Bezerra de Menezes(17), tivera a sua tarefa previamente determinada no Alto. A ele se reuniu Antônio Luiz Sayão, em 1878, para as grandes vitórias do Evangelho nas terras do Cruzeiro. Os mensageiros de Ismael reorganizam as energias existentes, para fundarem, em 1880, a “Sociedade Espírita Fraternidade”, com a qual se carregava em triunfo o bendito lema do suave estandarte do emissário do Divino Mestre”.(18) Nesse contexto (1880), Antônio Luís Sayão fundou, com Frederico Pereira Júnior, João Gonçalves do Nascimento, Francisco Leite de Bittencourt Sampaio e outros, o chamado “Grupo dos Humildes”, popularmente conhecido como “Grupo do Sayão” e posteriormente a confraria veio a chamar-se “Grupo Ismael”, a ele juntou-se Bezerra de Menezes, Frederico Júnior, Domingos Filgueiras, Pedro Richard e outros.

Naquela época era uma verdadeira epidemia a criação de grupelhos espíritas. O confrade Pedro Richard descreveu que “no século XIX os espíritas, ou por discordância de ideias, ou por criminosa pretensão, criaram considerável número de grupos [facções], cujos membros, em sua maioria, desconheciam os preceitos mais rudimentares da Doutrina. Qualquer espírita formava um grupo, só para satisfazer a vaidade de dar-lhe por título um nome que ele venerava. De grupos produtivos apenas se contavam alguns, em número por demais reduzido”.(19)

FEDERAÇÃO ESPÍRITA BRASILEIRA

Em 1883 , Augusto Elias da Silva, fotógrafo português radicado no Brasil, lança, com seus próprios recursos, o periódico “Reformador”. No ano subsequente , em histórica reunião onde participaram: Francisco Raimundo Ewerton Quadros, Manoel Fernandes Filgueiras, João Francisco da Silveira Pinto, Maria Balbina da Conceição Batista, Matilde Elias da Silva, Luis Móllica, Elvira P. Móllica, José Agostinho Marques Porto, Francisco Antônio Xavier Pinheiro, Manoel Estêvão de Amorim e Quádrio Léo, o fotógrafo lusitano propõe a criação da Federação Espírita Brasileira. A partir desse projeto “as divergências foram atenuadas, para que a tranquilidade voltasse a todos os centros de experimentação e de estudo”.(20) A Diretoria da FEB foi composta por : Ewerton Quadros (presidente); Domingos Filgueiras (vice-presidente); Silveira Pinto (secretário); Augusto Elias da Silva (tesoureiro); e Xavier Pinheiro (arquivista). Em 1895, Bezerra de Menezes assumiu a presidência e imprimiu à Instituição a orientação doutrinário-evangélica. O célebre “Grupo Ismael” acompanhou Bezerra, apoiando-o na direção da federação e integrando-se nela. Paulatinamente, todos os grupos afinados com a filiação ideológica Espiritismo-Evangelho foram-se reunindo em torno da Casa-Máter, cuja diretriz estava sintetizada na máxima “Deus, Cristo e Caridade”.

OS PRESIDENTES DA FEB

À guisa de ilustração registramos aqui na sequência os nomes dos presidentes da FEB (após Ewerton Quadros e Bezerra de Menezes) são eles : Dias da Cruz , Leopoldo Cirne (apresentou o trabalho “Bases de Organização Espírita em 1904”, estimulou a fundação de Federações Estaduais e em 1913, inaugurou a sede Histórica no Rio de Janeiro na Av. Passos).(21) Aristides Spínola , Manuel Quintão , Guillon Ribeiro, Luiz Barreto, Paim Pamplona , Antônio Wantuil de Freitas ( permaneceu 27 anos no cargo , formalizou o “Pacto Áureo”(22) , instalou o Conselho Federativo Nacional da FEB. Durante sua gestão foi efetivada a “Caravana da Fraternidade”), Armando de Assis (criou os Conselhos Zonais do CFN e inaugurou as dependências da FEB em Brasília), Francisco Thiesen (transferiu o Conselho Federativo Nacional e a sede da FEB para Brasília, transformou os Conselhos Zonais em Comissões Regionais, Juvanir Borges de Souza, Nestor Mazotti e Cesar Perri.

GENEALOGIA DO “PACTO ÁUREO”

No início do século XX surgiram vários líderes do Espiritismo entre eles: Batuíra, Cairbar Schutel e Eurípedes Barsanulfo. No meado de século Deolindo Amorim fundou o Instituto de Cultura Espírita do Brasil (Iceb), e atuou na Liga Espírita do Brasil (patrocinadora do II Congresso da CEPA), realizado no Rio, em 1949. Na década de 1940 o movimento espírita paulista, por exemplo, começou a se organizar através de congressos e concentrações de mocidades espíritas. Leopoldo Machado (ex-pastor), foi um dos grandes incentivadores das mocidades espíritas. Toda essa movimentação doutrinária culminou com a criação em 1947, da União Social Espírita (atual USE).(23)

Com a consolidação da União Social Espírita , a nova federativa convocou, em 1948, o Congresso Brasileiro de Unificação Espírita, realizado de 31 de outubro a 5 de novembro, com a participação de 16 Estados, por conseguinte um ano antes do “Pacto Áureo”. Percebe-se que a consolidação do “Pacto Áureo” foi antecedida por vários eventos, como a aludida fundação da USE (1947), o Congresso Espírita Brasileiro de Unificação (1948), a fundação da Liga Espírita (1926), o II Congresso da CEPA (1949) e o I Congresso de Mocidades Espíritas do Brasil (1948).

Decorridos 65 anos do célebre “Pacto Áureo”, ainda hoje se ouvem vozes discordantes, motivo pelo qual retrocedemos ao evento histórico, a fim de identificarmos o ideal que animou aqueles espíritas de então na busca da unidade doutrinária. Para narrar algo do “Pacto” não há como fugir de citar o episódio ocorrido no início de outubro de 1949, em que as delegações nacionais e estrangeiras (Argentina, Cuba, México, Porto Rico, Estados Unidos, Colômbia e Uruguai) estiveram reunidas no Teatro João Caetano, no Rio de Janeiro, participando da abertura do II Congresso Espírita Pan-Americano, que teria continuidade de suas sessões na Liga Espírita do Brasil. Participavam desse evento alguns confrades que no congresso da USE defenderam a proposta da criação de uma “Confederação Espírita Brasileira”, pois se avaliava no contexto que as articulações doutrinárias da FEB nada mais era do que de um Centrão-Laboratório e não uma federativa.

A materialização do “Pacto Áureo” foi sendo estabelecida momentos antes da realização do II Congresso da CEPA. A rigor , foi resultante da inspiração simultânea e espontânea de alguns participantes desse conclave, que aproveitaram o ensejo a fim de visitarem a sede da Federação Espírita Brasileira. Mal sabiam que essa visitação culminaria na apresentação de uma agenda histórica , cuja anuência firmada a 5 de outubro de 1949, ficou consagrada como o “Pacto Áureo”. Segundo os historiadores este foi um transcendente compromisso dos espiritas no país, por constituir a proposta dos alicerces da busca da unidade doutrinária através da unificação do movimento espírita brasileiro, sob a direção da Casa-Máter.(24)

UM LIVRO, UMA ESTRATÉGIA, UM EQUÍVOCO HISTÓRICO

O “Acordo de Ouro” foi uma agenda com dezoito itens, sendo que, no primeiro constava o seguinte: “Cabe aos espíritas do Brasil colocarem em prática a exposição contida no livro “Brasil, Coração do Mundo, Pátria do Evangelho”. Aqui abrimos um parênteses por entendermos que neste dispositivo houve uma proposição vulnerável de consequência indesejável , considerando o foco da unidade entre os espíritas. O mais razoável seria constar no primeiro item que os espíritas colocassem em prática a exposição contida no Evangelho Segundo o Espiritismo de maneira a acelerar a marcha evolutiva do Espiritismo.

É bem verdade que os signatários do Pacto chegaram à conclusão que o livro Brasil Coração do Mundo Pátria do Evangelho continha dados interessantes e demonstrava qual seria a missão do Espiritismo no Brasil, concordamos com isso, porém os que firmaram o “Pacto” não se preocuparam com os detalhamentos controverso do livro, talvez aí o “X” da questão. Não levantamos este ponto com aversão ao fato em si, muito pelo contrário, amamos a obra de Humberto de Campos (e até citamos aqui como fonte), mas urge apartar bem as coisas pois a simples entronização de Roustaing , pelo autor espiritual, contraria o pensamento de Kardec contido no Cap. XV da obra A Gênese.

Portanto foi uma estratégia precipitada do autor espiritual , a nosso ver, citar o emblemático João Batista Roustaing como “organizador” do trabalho da “fé espírita” ao lado de um Léon Denis, que efetuaria o desdobramento filosófico; de Gabriel Delanne, que apresentaria a estrada científica e de Camille Flammarion que abriria a cortina dos mundos. Óbvio que não houve critério mais acurado, segundo cremos. E afirmamos isso de forma pacifica e bem à vontade, pois Humberto de Campos é o responsável espiritual do grupo mediúnico que conduzimos a muitos anos.

Recentemente entrevistamos o notável Cesar Perri, atual presidente da FEB, e perguntamos se diante da clara divisão que existe no Movimento Espírita, muitas vezes manifestada em posturas emocionalizadas e radicais, como a FEB deve conduzir clara e publicamente o tema Roustaing? Que iniciativas faltam para apaziguar ânimos? Perri esclareceu o seguinte: “Nós já vivemos momentos bastante delicados no Movimento Espírita, que eu acompanhei muito de perto. Sobrevieram momentos muito complicados em algumas gestões Houve nessa interconexão um período em que o presidente Thiesen decidiu junto com o CFN que, conforme estabelece o Pacto Áureo, a base dos trabalhos federativos é a obra de Allan Kardec, e isso tem sido seguido até hoje. Nessas condições, fica muito claro que o CFN em termos de movimento nacional trabalha com a obra de Allan Kardec.

De modo óbvio, respeitamos perfeitamente e convivemos com pessoas que gostam e estudam a obra de Roustaing, mas não usamos isso como ponto de atrito ou desunião; procuramos buscar hoje o ponto de convergência, e esse eixo de estabilização do Movimento Espírita é a obra de Kardec. As obras de Roustaing embora continuem sendo republicadas e ainda consta do catálogo da FEB, mas não há mais sua divulgação, por exemplo, nas páginas da Revista Reformador e essa foi uma decisão adotada em gestões anteriores, mas respeitamos aqueles que pensam ou que adotam as obras de Roustaing.(25)

Tornemos ao “Pacto Áureo”. Na cláusula segunda do Acordo ficou decidido que a FEB criaria um Conselho Federativo Nacional permanente, com a finalidade de executar, desenvolver e ampliar os planos da sua atual Organização Federativa. Com efeito , em janeiro do ano seguinte instalou-se o Conselho Federativo Nacional (CFN), congregando os representantes das Federações Espíritas Estaduais signatárias com o objetivo de promover e trabalhar pela união dos espíritas e pela unificação do Movimento Espírita.(26)

CARAVANA DA FRATERNIDADE

Para esse desígnio, durante a década de 1950 houve um trabalho de esclarecimento junto às entidades espíritas sobre a importância e as diretrizes da tarefa de organização e unificação do Movimento Espírita brasileiro. A grande missão coube ser realizada, principalmente, pela “Caravana da Fraternidade”. Em 31 de janeiro de 1950 o grupo(27) partiu do Rio de Janeiro com destino a Salvador ; Depois, a todas as capitais dos 11 Estados do Nordeste e Norte do país. Dentre os planos da missão estavam as finalidades da maior aproximação dos espiritistas, visando o ideal da unificação social da Doutrina, da divulgação cultural do Espiritismo na sociedade laica e estímulo às obras de assistência social.

Artur Lins de Vasconcelos , um dos arautos da “Caravana”, após sua desencarnação reafirmou que todos [caravaneiros] libertos do corpo físico “reconstruíram a Caravana da Fraternidade, que vem sendo enriquecida pelos espíritas responsáveis, na Terra, pela divulgação do Espiritismo e pela união entre as instituições, unificando-as como unindo os indivíduos”.(28) Numa visita de alguns caravaneiros a Chico Xavier, em Pedro Leopoldo, no dia 11 de dezembro de 1950, estes foram brindados com uma mensagem de Emmanuel, em que o Autor espiritual comenta: “Cultuemos, acima de tudo, a solidariedade legítima. Nossa união, portanto, há de começar na luz da boa vontade. Guardemos boa vontade uns para com os outros, aprendendo e servindo com o Senhor, e felicitando aos companheiros que se confiaram à tarefa sublime da confraternização, usando o próprio esforço”.

REFLEXOS DO PACTO ÁUREO

Dez anos após o Pacto foram realizados Simpósios Regionais de expressiva importância para o processo de unificação do Movimento Espírita Brasileiro: Centro-Sulino, em Curitiba (1962), Nordeste, em Salvador (1963); Norte, em Belém (1964); Centro-Oeste-Territórios em Cuiabá (1965); encerrando o ciclo com o Simpósio Nacional, no Rio de Janeiro (1966). No início da década de 1970 foram criados os Conselhos Zonais do CFN (Norte, Nordeste, Centro e Sul) que estudavam assuntos de interesses do Movimento Espírita quase sempre concluídos nas Reuniões Plenárias. Na década de 1980, por sugestão da representação do Estado do Rio de Janeiro, o CFN concluiu o magnífico documento “Orientação ao Centro Espírita”. Em 1985, os Conselhos Zonais foram transformados em Comissões Regionais.

Atualmente o CFN reúne-se ordinariamente uma vez por ano na sede da FEB em Brasília, durante três dias, para tratar de assuntos de interesse do Movimento Espírita Nacional, afim de promover, realizar e aprimorar o estudo, a difusão e a prática do Espiritismo. Dentre algumas deliberações do CFN foram implementadas Campanha de Evangelização Espírita da Infância e da Juventude, em 1977; Campanha do Estudo Sistematizado da Doutrina Espírita, em 1983; Campanhas “Em Defesa da Vida” e “Viver em Família”, em 1994; e Campanha de Divulgação do Espiritismo, em 1996.

É justo informar que todas as Entidades que, direta ou indiretamente, integram o CFN (Entidades Federativas Estaduais, Entidades Especializadas de Âmbito Nacional, Centros e demais Sociedades Espíritas) mantêm a sua autonomia, independência e liberdade de ação. Até mesmo porque os vínculos com o CFN tem por fundamento a solidariedade e a união fraterna, livre, responsável e conscientemente praticadas à luz da Doutrina Espírita, com vistas à sua difusão.

INTERPOLANDO PRECISA DIGRESSÃO

Não há como esconder aos atuais fãs de Torteroli e demais progressistas que o italiano abusou da resignação do Bezerra de Menezes, no século XIX. Ainda hoje vociferam que o filho do Riacho do Sangue impôs um viés catoliquizante ao Movimento Espírita. Ora, o Espiritismo não precisou se catoliquizar com as sublimes mensagens de grandes arquitetos do catolicismo, como o Doctor Gratia, Aurélio Agostinho, ex-bispo de Hipona, dos sacerdotes Fènelon, Lamennais, François Nicholas Madeleine, Lacordaire, Vicente de Paulo , São Luiz, irmã Rosália que ditaram dezenas mensagens insertas nas Obras Básicas.

A rigor, o que está na base da retórica dos laicos e torterolistas é o aspecto religioso da Doutrina Espírita sustentado dignamente pelo Movimento Espirita Brasileiro através da liderança da FEB. Tais kardequeólogos , “PhD’s da ilusão”, longe do uso do bom senso, insistem em divulgar a alucinada tese de que se é preciso fugir do “Cristo Católico”, do religiosismo, do igrejismo no Espiritismo e transformar a casa espírita numa academia de expoentes do “saber”, sob a regência dos “laicos”, obviamente!

Muitas vezes se posicionam quais “vítimas” da pecha de expulsadores do Mestre Divino das hostes doutrinárias. Trôpegos, campeiam sem horizonte, anelando a falácia de “mátires” que peregrinam o calvário do xenofobismo contra eles. Talvez porque, numa entrevista cedida a confrades de Uberaba, Chico Xavier advertiu com todas as letras: “Se tirarem Jesus do Espiritismo, vira comédia. Se tirarem Religião do Espiritismo, vira um negócio. A Doutrina Espírita é ciência, filosofia e religião. Se tirarem a religião, o que é que fica? Jesus está na nossa vivência diária, porquanto em nossas dificuldades e provações, o primeiro nome de que nos lembramos, capaz de nos proporcionar alívio e reconforto, é JESUS”.(29)

São desapiedados até com a figura do pioneiríssimo Olympio Teles de Menezes, apelidando-o de “espiritólico”. Sob o tacão da obsessão não percebem que as hordas das regiões densas são poderosas e se “organizam”, uma vez que têm, como meta, a “destronar” Jesus dos estudos espíritas. Companheiros esses, aprisionados por capciosos cavaleiros das brumas d’outras dimensões, chegam a pronunciar que Kardec publicou o Evangelho para apaziguar os teólogos, tentando uma aproximação com a Igreja. (pasmem!) Ficam afogueados de fúria quando leem Kardec, afirmando que " o Espiritismo “filosoficamente” é uma religião e nós [todos os legítimos espíritas ]nos ufanamos [gabamos] disso".(30)

E mais, o Espírito São Luís adverte que “os espíritos não vêm subverter a religião, como alguns o pretendem. Vêm, ao contrário, confirmá-la, sancioná-la por provas irrecusáveis. Daqui a algum tempo, muito maior será do que é hoje o número de pessoas sinceramente religiosas e crentes”.(31) O mestre lionês assevera com todas as letras de que o “Espiritismo repousa sobre as bases fundamentais da religião e respeita todas as crenças; um de seus efeitos é incutir sentimentos religiosos nos que os não possuem, fortalecê-los nos que os tenham vacilantes”.(32)

EM SUMA

Não negamos que algumas críticas ao “Pacto Áureo” têm seus fundamentos lícitos. Não há como negar que foi constrangedor naquela época e ainda hoje repercute, a maneira pelo qual as cláusulas do documento tenham sido apresentado e consagrado, diante de um número reduzido de dirigentes e “ad referendum” das instituições federativas, sem que tivesse havido mais cautelosa discussão e concordância pelas bases. Sobretudo no que tange a apresentação do livro “Brasil Coração do Mundo” e não as Obras Básicas ou pelo menos O Evangelho Segundo o Espiritismo como norteador da união entre os espíritas.

À GUISA DE ARREMATE

Após esta extensa narrativa histórica , sem induções pessoais e repousado em dados factuais, não é desdouro concluir-se que, inversamente aos que ainda protestam os contumazes oponentes à FEB, na atual proposição da unificação do Movimento Espírita não há como identificarmos a FEB distante dos objetivos almejado pelo Espirito Ismael. A Casa-Mater jamais impõe cabrestos nem em instituições nem em adeptos, bem como não sugere demarcar terrenos ou áreas de ação aos que se engajam no trabalho de divulgação. Pelo menos como escritor espírita jamais fui obstado a escrever em nome do Espiritismo. Fica, portanto, bem nítido que o trabalho de unificação é uma atividade-meio que tem como objetivo fortalecer e facilitar a ação do Movimento Espírita na atividade-fim da FEB , visando promover o estudo, a difusão e a prática do Espiritismo sob o excelso manto do Evangelho de Jesus.

Para os arautos da anti-religião doutrinária, que negam o Evangelho e afirmam ser “Jesus somente o emergir de um arquétipo plasmado no inconsciente coletivo” afirmamos que o Mestre da Galiléia foi a manifestação do amor de Deus, a personificação de sua bondade. Para o célebre pedagogo e gênio de Lyon, o Cristo foi “Espírito superior da ordem mais elevada, Messias, Espírito Puro, Enviado de Deus, é Diretor angélico do orbe e Síntese do amor divino”.(33)

Notas e Referências Bibliográficas :

1 - Técnica terapêutica criada pelo médico vienense Franz Anton Mesmer ( 1734-1815), que consiste em utilizar o “magnetismo animal” como fonte de tratamento de saúde. Assemelha-se, como técnica, ao hipnotismo.

2 - Xavier, Francisco Cândido. Brasil, Coração do mundo, Pátria do Evangelho, ditado pelo Espírito Humberto de Campos, Rio de Janeiro: Ed. FEB, 1938

3 - Idem.

4 - Sobrinho e herdeiro de Napoleão Bonaparte. Foi o primeiro presidente francês eleito por voto direto. Suas primeiras tentativas de golpe de Estado falharam, mas, na sequência da Revolução de 1848, conseguiu estabelecer-se na política, sendo eleito deputado e, em seguida, presidente da República. Finalmente, o bem sucedido Golpe de 1851 pôs fim à Segunda República e permitiu a restauração imperial em favor de Luís. Seu reinado, inicialmente autoritário, progrediu de forma gradativa após 1859 para o chamado “Império Liberal”. Implementou durante seu reinado a filosofia política publicada em seus ensaios Idées napoléoniennes e L’Extinction du Paupérismeele - mistura de romantismo, liberalismo autoritário e socialismo utópico.

5 - Fundador e diretor do Colégio Francês no Rio de Janeiro, Em 1860, publicou a tradução, em língua portuguesa, das obras “Os tempos são chegados” (““Les Temps sont arrivés”) e “O Espiritismo na sua mais simples expressão” (“Le Spiritisme à sa plus simple expression”).

6 - Palmeira, Vivian. “Curiosas Histórias do Espiritismo”. in: “Universos Espírita”, nº 49, ano 5, 2008. pp. 8-12.

7 - Eduardo Monteggia era um homem eclético

8 - Xavier, Francisco Cândido. Brasil, Coração do mundo, Pátria do Evangelho, ditado pelo Espírito Humberto de Campos, Rio de Janeiro: Ed. FEB, 1938

9 - Torteroli nasceu em Gênova(Itália) em 23 de setembro de 1849 e desencanado no Rio de Janeiro em 11 de janeiro de 1928, há pesquisadores que citam o seu nascimento no dia 2 de junho de 1849 no Rio de Janeiro.

10 - O conteúdo da mensagem foi publicada no Reformador de julho de 1950 e republicada na mesma revista em novembro de 1977

11 - Xavier, Francisco Cândido. Brasil, Coração do mundo, Pátria do Evangelho, ditado pelo Espírito Humberto de Campos, Rio de Janeiro: Ed. FEB, 1938

12 - Publicação mensal de Estudos Psicológicos, nos moldes da “REVUE SPIRITE”, de AIIan Kardec

13 - O Jornal do Commercio, tradicional periódico da então Capital brasileira, em artigo publicado em 23 de setembro de 1863 na seção “Crónicas de Paris”, abordou os espetáculos acerca dos espíritos então populares nos teatros de Paris e, em seguida, passava a tecer comentários em torno do Espiritismo. Esse artigo é citado pela “La Revue Spirite”, onde Allan Kardec comenta que o autor do artigo não se aprofundou no estudo do Espiritismo, de cuja parte teórica ignorava os processos.

14 - Xavier, Francisco Cândido. Brasil, Coração do mundo, Pátria do Evangelho, ditado pelo Espírito Humberto de Campos, Rio de Janeiro: Ed. FEB, 1938

15 - Idem

16 - Em 1877 Um grupo de dissidentes da “Sociedade de Estudos Espíritas “Deus, Cristo e Caridade” funda a “Congregação Espírita Anjo Ismael”. Em 1878 outros componentes da mesma instituição reúnem-se no “Grupo Espírita Caridade”. Essas instituições, bem como o “Grupo Confúcio”, desaparecem em 1879.

17 - Em 1875, Bezerra de Menezes lê, pela primeira vez, “O LIVRO DOS ESPÍRITOS”, que lhe fora oferecido por Joaquim Carlos Travassos, seu primeiro tradutor em língua portuguesa.

18 - Xavier, Francisco Cândido. Brasil, Coração do mundo, Pátria do Evangelho, ditado pelo Espírito Humberto de Campos, Rio de Janeiro: Ed. FEB, 1938

19 - Disponível em http://www.guia.heu.nom.br/no_rio_de_janeiro.htm , acesso em 22/08/2014

20 - Xavier, Francisco Cândido. Brasil, Coração do mundo, Pátria do Evangelho, ditado pelo Espírito Humberto de Campos, Rio de Janeiro: Ed. FEB, 1938

21 - A grande aspiração da quase totalidade dos espíritas brasileiros era a realização do congraçamento geral de todas as instituições espíritas do Brasil. Desde os primórdios da propaganda, manifestando-se em diferentes ocasiões, esse tema da união entre todos permaneceu na ordem do dia, sendo Bezerra de Menezes um dos seus paladinos.

22 - A expressão “Pacto Áureo” é atribuída a Artur Lins de Vasconcellos Lopes

23 - Resultado do acordo de união da “Liga Espírita do Estado de São Paulo”, “União Federativa Espírita Paulista”, “Federação Espírita do Estado São Paulo” e “Sinagoga Espírita Nova Jerusalém”.

24 - Os protagonistas do “Pacto Áureo” foram: Antônio Wantuil de Freitas, presidente da Federação Espírita Brasileira; Arthur Lins de Vasconcellos Lopes, por si e pelo Sr. Aurino Barbosa Souto, presidente da Liga Espírita do Brasil; Francisco Spinelli, pela Comissão Executiva do Congresso Brasileiro de Unificação Espírita e pela Federação Espírita do Rio Grande do Sul; Roberto Pedro Michelena; Felisberto do Amaral Peixoto; Marcírio Cardoso de Oliveira; Jardelino Ramos; Oswaldo Mello, pela Federação Espírita Catarinense; João Ghignone, presidente e Francisco Raitani, membro do Conselho da Federação Espírita do Paraná; Pedro Camargo – Vinícius e Carlos Jordão da Silva, pela União Social Espírita de S. Paulo (USE); Bady Elias Curi, pela União Espírita Mineira; Noraldino de Mello Castro, presidente do Conselho Deliberativo da União Espírita Mineira.

25 - Disponível em http://jorgehessenestudandoespiritismo.blogspot.com.br/2013/04/luz - acesso 29/08/2014

26 - Atualmente o CFN é composto pelas Entidades Federativas espíritas de todos os Estados do Brasil e do Distrito Federal , bem como de um quadro de Entidades Especializadas de Âmbito Nacional

27 - Os caravaneiros foram Artur Lins de Vasconcelos (PR), que regressou de Recife, sendo substituído por , Luiz Burgos Filho (PE), Ary Casadio (SP), Carlos Jordão da Silva (SP), Francisco Spinelli (RS) e Leopoldo Machado (RJ).

28 - Mensagem psicofônica através do médium Divaldo Pereira Franco, no Recanto Lins de Vasconcellos, em 26.11.2010. Disponível em http://www.divaldofranco.com.br/mensagens.php?not=202

29 - Entrevistas com Chico Xavier disponíveis emhttp://www.espirito.org.br/portal/artigos/diversos/religiao/espiritismo-sem-jesus.html e http://www.meumundo.americaonline.com.br/eespirita/espiritismo_sem_jesus.htm 30 - Kardec, Allan. Revista Espírita, dezembro de 1868, discurso de Kardec em reunião pública realizada na noite de 01/11/1868, na Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas, Brasília: Edicel, 2001

31 - Kardec, Allan. O Livro dos Espíritos, RJ: Ed. FEB, 2002, perg. 1.010 (a),

32 - Kardec, Allan. O Livro dos Médiuns RJ: Ed. FEB, 2000, Capítulo III, Do Método, Item 24,

33 - Kardec, Allan. A Gênese, RJ: Ed. FEB, 1998, XV, item 2

18 de setembro de 2014