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Nesse modelo, agressor e vítima são colocados frente a frente, numa roda, para que o primeiro entenda os traumas e as consequências do seu ato de violência. Depois, as partes tentam entrar em acordo para que o adolescente repare sua infração. Claudia Abreu comenta.

  • Data :07/02/2017
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8 de fevereiro de 2017

Para evitar internação de menores, Justiça reúne vítima com infrator

LEANDRO MACHADO DE SÃO PAULO

O Tribunal de Justiça de São Paulo passou a adotar no final deste ano o método conhecido como justiça restaurativa para resolver conflitos envolvendo adolescentes infratores na capital paulista.

Nesse modelo, agressor e vítima são colocados frente a frente, numa roda, para que o primeiro entenda os traumas e as consequências do seu ato de violência. Depois, as partes tentam entrar em acordo para que o adolescente repare sua infração.

Um dos objetivos é reduzir o número de medidas socioeducativas aplicadas a jovens envolvidos em casos de agressão, bullying e furtos.

Apenas nos cinco primeiros meses deste ano, a Polícia Militar realizou, em média, uma apreensão em flagrante a cada três horas na capital. Nesse período, foram 1.333 casos, ou pouco mais de 10% do total registrado na cidade.

Normalmente, quem comete infrações mais graves, como nos casos de roubo, é alvo de outras ações, como internação na Fundação Casa.

A justiça restaurativa subverte a lógica da punição como forma de combate à violência. Para juízes e promotores da área, encarceramento nem sempre funciona, pois a pena é vista como uma “dívida” a ser paga, e não há reflexão sobre as transgressões.

“A pessoa é presa e não vê sua responsabilidade. Diz ‘vou pagar minha pena e sair zerado’”, afirma o juiz Egberto Penido.

Na 1ª Vara da Infância e Juventude, no Brás (centro), onde atua, ele faz 20 audiências por dia. “O sistema punitivo não tem sido eficaz. Basta ver os altos índices de reincidência em nossos presídios.”

A justiça restaurativa começou a ser aplicada em 2006, em cidades do Estado de São Paulo, do Rio Grande do Sul e do Distrito Federal.

Na capital paulista, iniciou com casos de menor gravidade da Brasilândia, na zona norte. Policiais e professores de nove escolas foram treinados com conceitos do modelo ao longo deste ano.

Agora, o tribunal e o Ministério Público de SP esperam expandi-lo para outros locais e aumentar o alcance das infrações - poderia ser aplicado em roubos, normalmente em casos sem reincidência.

CONSCIÊNCIA

O procedimento da justiça restaurativa começa com uma consulta à vítima do crime. Técnicos do TJ perguntam se ela aceita participar de um “círculo restaurativo”. A reunião é uma espécie de autoanálise com participação do infrator, vítima, parentes e membros da comunidade. O juiz não comparece.

Nesse encontro, a vítima conta os prejuízos e traumas causados pela ação. Por sua vez, o infrator tenta explicar suas motivações - seus parentes contam um pouco da história de vida da família.

Depois dessa fase, chega-se a um acordo de reparação. Um jovem acusado de furto pode, por exemplo, ter de devolver o valor subtraído, participar de projetos sociais ou fazer uma campanha de conscientização na escola.

“Tomar consciência dos seus erros e dos danos que causou ao outro é um processo doloroso”, diz Marcelo Salmaso, juiz em Tatuí (a 141 km de São Paulo). “Há pessoas que desistem e pedem para serem julgadas normalmente.”

Tatuí, utiliza o modelo desde 2013. Ana Cristina Galhardo, 43, moradora da cidade, adotou o adolescente Pedro após um processo de justiça restaurativa. Ele assaltou a casa dela com uma arma de brinquedo, roubou um celular e, após ser detido pela polícia, pediu perdão e ambos fizeram um acordo.

O método usa o conceito de corresponsabilidade, ou seja, não só o infrator é o “culpado” por uma transgressão, mas toda a sociedade.

“Se um adolescente faz bullying, ele é o único culpado? Será que ele mesmo já não foi vítima?”, afirma o juiz.

Tatiana Callé, promotora da infância em SP, tem esperança de que o sistema reduza a criminalidade. “Muitas vezes, o adolescente vai deixar de praticar infrações mais porque tomou consciência do mal que causou do que pelo medo da punição”, diz.

Notícia publicada no Jornal Folha de S.Paulo , em 27 de dezembro de 2016.

Claudia Abreu comenta*

O Capítulo XI de O Evangelho Segundo o Espiritismo , em seu item 14, “Caridade para com os Criminosos”, nos diz: “…Não vos cabe dizer de um criminoso: “É um miserável; deve-se expurgar da sua presença a Terra; muito branda é, para um ser de tal espécie, a morte que lhe infligem.” Não, não é assim que vos compete falar. Observai o vosso modelo: Jesus. Que diria ele, se visse junto de si um desses desgraçados? Lamentá-lo-ia; considerá-lo-ia um doente bem digno de piedade; estender-lhe-ia a mão. Em realidade, não podeis fazer o mesmo; mas, pelo menos, podeis orar por ele, assistir-lhe o Espírito durante o tempo que ainda haja de passar na Terra. Pode ele ser tocado de arrependimento, se orardes com fé. É tanto vosso próximo, como o melhor dos homens; sua alma, transviada e revoltada, foi criada, como a vossa, para se aperfeiçoar; ajudai-o, pois, a sair do lameiro e orai por ele.”

A citação acima nos deixa muito claro que quem está na criminalidade hoje poderá se recuperar amanhã. Como somos espíritos imortais e em processo de evolução, podemos a qualquer momento passar por um processo de conscientização e mudança, nesta ou em outras vidas, nos levando à compreensão real dos nossos atos e responsabilidades, pois cada um tem o seu tempo.

A matéria nos fala em justiça restaurativa para adolescentes que de algum modo transgrediram a lei e prejudicaram de alguma forma o outro. Vejo um ponto forte desse processo restaurativo, a tomada da consciência com a reflexão sobre o ato cometido. A doutrina espírita sempre nos fala da importância da reflexão e de adquirir novos conhecimentos, para que tenhamos condições de refletir sobre tudo o que nos chega, seja através da fala ou da leitura, e isso nos leva ao amadurecimento. Sabemos que muitos desses jovens não tiveram um direcionamento e nem oportunidades de adquirir conhecimentos, pois muitos têm uma realidade muito dura.

É um ótimo método de trabalhar com esses adolescentes transgressores, sem a visão punitiva, mas sim com a tomada da consciência dos seus atos, aprendendo a se colocar no lugar do outro. É um momento importante da vida deles, que muitas vezes apenas estão esperando que alguém lhes estenda a mão.

Esperamos que todos os adolescentes aceitem esse método de conscientização, que o trabalho possa se estender a todas as cidades do país e que a redução da criminalidade chegue e que passe a ser uma constante em nossos dias. E que todos nós possamos acreditar efetivamente na recuperação de quem transgrediu a lei, pois muitas vezes não basta só ele querer, precisa que encontre uma mão estendida pronta a auxiliar.

Claro que há casos bem difíceis, mas, como já falado, cada um no seu tempo. E no mesmo capítulo mencionado acima encontramos o seguinte ensino: “Não julgueis, oh! não julgueis absolutamente, meus caros amigos, porquanto o juízo que proferirdes ainda mais severamente vos será aplicado e precisais de indulgência para os pecados em que sem cessar incorreis. Ignorais que há muitas ações que são crimes aos olhos do Deus de pureza e que o mundo nem sequer como faltas leves considera?”

  • Claudia Abreu é espírita e colaboradora do Espiritismo.net.