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  • 'Evoluí', diz carioca que chamou pobres de sub-raça

Quase três décadas separam a Angela Moss que foi entrevistada na TV sobre pobres que frequentam a praia e a Angela Moss que veio a público em uma rede social para esclarecer o episódio. A primeira tinha ‘horror de olhar para estas pessoas’. Claudio Conti comenta.

  • Data :29/10/2015
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29 de outubro de 2015

‘Tenho horror de quem pensa como eu pensava. Evoluí’, diz carioca que chamou pobres de sub-raça nos anos 1980

Rafael Barifouse Da BBC Brasil em São Paulo Quase três décadas separam a Angela Moss que foi entrevistada na TV sobre pobres que frequentam a praia e a Angela Moss que veio a público em uma rede social para esclarecer o episódio. A primeira Angela, então com 18 anos, tinha “horror de olhar para estas pessoas”, os pobres, que “não eram brasileiros”, mas uma “sub-raça”. Aos 47 anos, ela diz ainda ter horror, mas de quem tem hoje um discurso igual ao seu ou quem a parabeniza por suas declarações carregadas de preconceito. “Mudei de opinião. Evoluí. Não sou mais essa pessoa. Por isso resolvi colocar minha cara a tapa, em vez de pedir para tirarem o vídeo do ar”, diz Moss à BBC Brasil. “O vídeo é um tapa na cara da sociedade, que não evoluiu. É compreensível que alguém fique com ódio do ladrão quando é assaltado. Mas tem de pensar o que faria se estivesse no lugar dele. E, principalmente, não generalizar esse ódio contra todo um conjunto de pessoas.” Para Moss, “estes garotos pobres têm um ódio justificável porque se ferraram a vida inteira”. “O difícil é aceitar o ódio de quem teve tudo na vida, é privilegiado. Essas pessoas têm obrigação de serem mais compreensivas. Se fosse o inverso, elas poderiam estar fazendo coisas ainda piores.”

Repercussão Publicada no YouTube em 27 de agosto, a reportagem “Os Pobres Vão à Praia”, da extinta TV Manchete, praticamente passou despercebida, com 77 mil visualizações. Isso mudou ao ser compartilhada pelo site Mariachi em seu perfil no Facebook, poucos dias depois que arrastões, roubos e furtos provocaram retaliações de moradores da Zona Sul do Rio. O vídeo causou, então, um grande alvoroço, sendo visto mais de 2,2 milhões de vezes, além de ter 37,7 mil compartilhamentos e 4,3 mil comentários, em apenas três dias. “Hoje, um discurso desse seria inimaginável e quem o fizesse (…) sofreria uma perseguição tão dolorosa nas redes sociais que seria ela quem iria ter vontade de mudar de planeta”, dizia um dos comentários mais populares, com 1.080 curtidas. “Incrível saber que não evoluímos como seres humanos”, dizia outro comentário, curtido 360 vezes. O que não se esperava é que a adolescente do vídeo, hoje uma advogada e sócia de uma editora, escrevesse não só assumindo a autoria da fala polêmica, mas dizendo que não pensa mais da mesma forma. “Meu depoimento foi editado e parece ser pior do que realmente foi. Em alguns momentos, eu citava o que outras pessoas diziam, e ficou parecendo como se tudo que disse fosse a minha própria opinião”, diz Moss. “Mas eu era de fato muito conservadora, egoísta e idiota. Fui criada em um ambiente privilegiado. Nunca tinha andado de ônibus. Via a galera fazendo confusão na praia e não entendia. Foi só depois que minha vida mudou, fui trabalhar como garçonete e me aprofundei nos estudos que tive outra visão.”

‘Não sou covaarde’ Moss relembra que, na época em que a reportagem foi veiculada, a repercussão pública foi bem diferente. “Na minha bolha social, só recebi parabéns e tapinha nas costas. Hoje, tudo é amplificado pela internet”, conta ela. “Desta vez, as reações se dividiram. Houve quem veio me parabenizar por ter mudado de opinião. Outras ficaram bravas pelo mesmo motivo.” Moss conta que teve ainda quem não acreditou que sua visão sobre o assunto realmente havia se transformado, pensando que ela havia publicado o comentário no Facebook por medo da repercussão. “Não tenho medo. Não sou covarde. Sou corajosa, de esquerda, feminista e ‘da luta’”, afirma ela. “Tinha duas opções: fugir ou enfrentar. Resolvi enfrentar.”

Tensão A reportagem com seu depoimento voltou a gerar bastante polêmica em parte pelo momento de tensão pelo qual passa o Rio. Arrastões começaram a acontecer na orla carioca em meados dos anos 1990, com grupos roubando e agredindo banhistas. Esse tipo de crime voltou a ocorrer com mais frequência em janeiro deste ano. Desde então, o governo e a Polícia Militar do Estado passaram a realizar blitz em ônibus vindos da Zona Norte da cidade, onde ficam bairros mais pobres e municípios da periferia da capital fluminense. No entanto, uma decisão da Justiça determinou que jovens considerados suspeitos só poderiam ser detidos se fossem pegos em flagrante. Ao mesmo tempo, a Prefeitura do Rio anunciou que extinguiria linhas de ônibus que ligavam essa região à Zona Sul, onde ficam as praias mais populares, como Copacabana e Leblon. A Prefeitura afirmou que a medida visa reorganizar o sistema de ônibus da cidade e evitar a sobreposição de trajetos. Mas foi acusada de fazer isso para dificultar o acesso de moradores do subúrbio à orla. No último final de semana, a situação se agravou quando novos roubos, furtos e agressões foram registrados nas praias e ruas da Zona Sul e moradores locais se reuniram por meio das redes sociais para atacar jovens tidos como suspeitos que circulavam em ônibus pela região. Moss critica esse tipo de reação popular organizada contra jovens da periferia. “Este tipo de retaliação é quase como um grupo de extermínio, é estar a um passo de um Estado de exceção.” Notícia publicada na BBC Brasil , em 24 de setembro de 2015.

Claudio Conti* comenta A sociedade brasileira vive momentos que requer muita cautela, pois ocorre uma mudança de paradigma em várias áreas. Porém, nem todas as alterações são necessariamente para melhor, muitas estão descambando para o retrocesso. Alguns pontos estão se aprimorando, enquanto outros estão se deteriorando. Neste tempo de mudanças, onde a situação não está clara, todo cuidado é pouco com o que se fala e o que se faz, pois não se sabe como será a interpretação dos outros e e as consequência advindas. Isto deve servir como um alerta em dias de redes sociais, onde muitos expõem suas vidas sem pensar no futuro e como serão afetados quando expostos em outro contexto da sociedade. Vídeos e fotos são trocados indiscriminadamente e, com a facilidade do trânsito de informação na forma de arquivos de computador, a disseminação pode atingir escala mundial, dependendo do apelo que causa. Estamos na era do “politicamente certo” e do “politicamente errado”, termos e colocações consagradas e que eram de entendimento comum o significado são, agora, erradas em decorrência das novas interpretações e novos valores. Aceita-se muita coisa que não deveria ser aceita e critica-se outras tantas apenas pelo burburinho que poderá causar. Uma reportagem realizada há muitos anos foi, agora, divulgada novamente causando um dano grave e, pior ainda, desviando a atenção para o que realmente importa por ser um problema do aqui e agora. Certamente que as colocações da, então, jovem, não foram adequadas, mas trazer à tona, sem se saber como esta pessoa pensa e se comporta na atualidade, também não é adequado. Encontramos esclarecimentos sobre a correta forma de proceder n’O Evangelho Segundo o Espiritismo, Capítulo X: 20. Será repreensível notarem-se as imperfeições dos outros, quando daí nenhum proveito possa resultar para eles, uma vez que não sejam divulgadas? Tudo depende da intenção. Decerto, a ninguém é defeso ver o mal, quando ele existe. Fora mesmo inconveniente ver em toda a parte só o bem. Semelhante ilusão prejudicaria o progresso. O erro está no fazer-se que a observação redunde em detrimento do próximo, desacreditando-o, sem necessidade, na opinião geral. Igualmente repreensível seria fazê-lo alguém apenas para dar expansão a um sentimento de malevolência e à satisfação de apanhar os outros em falta. Dá-se inteiramente o contrário quando, estendendo sobre o mal um véu, para que o público não o veja, aquele que note os defeitos do próximo o faça em seu proveito pessoal, isto é, para se exercitar em evitar o que reprova nos outros. Essa observação, em suma, não é proveitosa ao moralista? Como pintaria ele os defeitos humanos, se não estudasse os modelos? - S. Luís. (Paris, 1860.) Portanto, depois de tantos anos, não havia mais validade na divulgação deste vídeo. No entanto, este vídeo surgiu em decorrência de atos de violência que ocorreram em determinado final de semana. Esta violência é atual e, como pôde ser visto, ocorre desde longa data. Ao nosso ver, a sociedade deveria ter se focado na questão da violência, tentado cobrar respostas das autoridades públicas, responsáveis pela segurança e pela ordem. Mas, infelizmente, ficou perdido na reprovação, comentários agressivos e hostilidade contra uma jovem que existia há muitos anos e que hoje é uma senhora que ninguém conhecia seus pendores e pensamentos. Qual é a maior agressão?

  • Claudio Conti é graduado em Química, mestre e doutor em Engenharia Nuclear e integra o quadro de profissionais do Instituto de Radioproteção e Dosimetria - CNEN. Na área espírita, participa como instrutor em cursos sobre as obras básicas, mediunidade e correlação entre ciência e Espiritismo, é conferencista em palestras e seminários, além de ser médium pscógrafo e psicifônico (principalmente). Detalhes no site www.ccconti.com .