Carregando...

  • Início
  • Penso nele todo dia, diz mãe que teve filho roubado pelo governo australiano

No final da década de 1960, Patricia Lange e Margaret Hamilton tiveram seus filhos tirados pelo governo australiano, em uma política chamada hoje de ‘White Stolen Generation’ (Geração Branca Roubada). Humberto Souza de Arruda comenta.

  • Data :30/05/2013
  • Categoria :

30 de maio de 2013

Penso nele todo dia, diz mãe que teve filho roubado pelo governo australiano

No final da década de 1960, Patricia Lange e Margaret Hamilton tiveram seus filhos tirados pelo governo australiano, em uma política chamada hoje de “White Stolen Generation” (Geração Branca Roubada)

Liz Lacerda Direto de Sydney

17 de outubro de 1968. Dentro da sala de parto de um hospital em Brisbane, a mãe de 20 anos dá à luz o primeiro filho. No boletim médico, um carimbo sela o destino do menino: “BFA”, Baby For Adoption (Bebê para Adoção). Mãe solteira no final da década de 1960, Patricia Lange nunca viu a criança, não pôde tocá-la nem amamentá-la e perdeu o crescimento do garoto para uma política do governo australiano, hoje conhecida como “White Stolen Generation” (Geração Branca Roubada). “Naquela época, era vergonhoso ter filhos sem pai”, lamenta Patricia. Por isso, o governo tirava as crianças das mães para entregá-las a casais que, em geral, não podiam ter filhos.

Logo que seus pais souberam que estava grávida, Trish - como é conhecida - foi mandada para  a casa de outra família para trabalhar. “Meus pais não me deixariam voltar para casa, porque não queriam que os vizinhos e amigos soubessem”, conta. Ela trabalhou 12 horas por dia por US$ 10 por semana até o momento do parto. No hospital, Trish foi amarrada à cama e sedada com morfina, ganhou o filho, mas não lembra sequer do choro do bebê. “Eles me ameaçaram com prisão e deportação, para me forçarem a assinar os papéis da adoção”, explicou.

Imigrante inglesa, ela ainda não tinha cidadania australiana. “Eu estava sozinha, com medo, sem dinheiro, em um país estrangeiro. Não tinha condições de voltar para a Inglaterra, onde minha avó teria me ajudado”, garante. O pai da criança, que tinha 17 anos na época, desapareceu. “Eles não rastreavam os pais, porque seriam obrigados a pedir a permissão dos homens também”, diz. Os dois eram menores de idade (21 anos), de acordo com a lei da época.

Assim como o filho de Trish, pelo menos 150 mil crianças foram retiradas das mães solteiras nas décadas de 1960 e 1970 na Austrália. Na semana passada, a primeira-ministra Julia Gillard pediu desculpas oficiais, na sede do Parlamento. “Pedimos desculpas a vocês, mães que foram traídas pelo sistema, submetidas à manipulação, a um tratamento injusto e a práticas antiéticas, desonestas e, em muitos casos, ilegais. Pedimos desculpas porque queremos corrigir um registro histórico, declarando que essas mães não fizeram nada errado, que vocês amavam seus filhos e sempre os amarão”, declarou Gillard, diante de um auditório de cerca de mil mães, pais e filhos adultos.

O pedido oficial de desculpas alivia a dor, mas não apaga a história. Trish procurava o filho em carrinhos de bebê, nas saídas de escola, em parques de crianças. “Buscava qualquer rostinho que poderia parecer com ele e conversava com os pais para sondar se a criança era adotada. Fiquei viciada em trabalho para tentar sobreviver”, recorda, aos 64 anos.

Margaret Hamilton, hoje com 66 anos, também lembra das tentativas de encontrar o filho perdido. “Não conseguíamos qualquer informação oficial sobre o paradeiro deles”, esclarece.

Aos 19 anos, Margaret foi afastada da família e colocada em um lar para adolescentes grávidas. Era 1965 e cerca de 30 garotas permaneciam isoladas até o nascimento dos bebês. Em trabalho de parto, a jovem foi sozinha para o hospital, recebeu uma injeção, teve o filho e acordou cinco dias depois. Antes mesmo de vir ao mundo, o governo já havia decidido que aquele era um “BFA”, Baby for Adoption. Ainda parcialmente sedada, Margaret assinou os papéis.

Segundo ela, foi uma lavagem cerebral. “Eles me convenceram de que não havia opções e me chamaram de egoísta, dizendo que eu queria manter um filho bastardo que não teria condições de criar solteira”, destacou. Diferente da maioria, ela conseguiu enxergar o filho uma vez, pelo vidro da maternidade. Nunca mais esqueceu o rosto, que procuraria desesperadamente nos carrinhos de bebê, nas saídas de creches, nos parquinhos infantis. “Ele era lindo e eu ainda posso ver nitidamente aquela carinha bonita até hoje. Pensei nele todos os dias da minha vida”, afirma.

O pai do filho de Margaret também desapareceu. “Era um sistema que beneficiava todos eles: os pais que não queriam se incomodar, as famílias envergonhadas, os casais inférteis, o governo e a sociedade como um todo”, analisa. O sofrimento das mães solteiras era apenas o efeito colateral da política conservadora. Independente das desculpas formais, difícil é superar a dor dos anos passados. “Está tudo perdido. Esse afastamento causou uma distância emocional que nunca mais poderemos recuperar, já que nunca criamos o vínculo que deveríamos ter”, avalia.

Os arquivos oficiais foram abertos em 1991. Trish e Margaret encontraram os filhos, que não quiseram dar entrevistas. Filho de Trish, Darren tem 44 anos, é casado e tem três filhos. “Quando o vi pela primeira vez, aos 21 anos, fiquei feliz porque ele parecia com meu avô. Agora, tento enxergá-lo nos rostos dos meus netos”, coforma-se. Também casado, o filho de Margaret tem 47 anos e dois filhos. “Ele não sabia que era adotado e sente que está traindo os pais adotivos; então, tento me contentar com o carinho que ele pode me oferecer”, conclui.

A primeira-ministra Julia Gillard anunciou a liberação de AU$ 11,5 milhões (cerca de R$ 25 milhões) para a união das famílias e o tratamento psicológico de mães e filhos, mas o projeto ainda não foi votado pelo Congresso. Em fevereiro de 2008, o governo australiano também pediu desculpas oficiais à “Stolen Generation” (Geração Roubada) de crianças aborígenes que foram afastadas das famílias por causa da cor da pele. Conhecidas como “half-caste” (meia-casta), elas eram filhas de mães aborígenes e pais europeus. Entre 1910 e 1970, cerca de 100 mil crianças com raça mista foram entregues a casais brancos para assimilar a cultura dos colonizadores.

Especial para Terra

Notícia publicada no Portal Terra , em 29 de março de 2013.

Humberto Souza de Arruda comenta*

A visão cristã que devemos manter ao analisarmos um tipo de violência é prejudicada em muitas das vezes pelo fato de nos envolvermos emocionalmente com o acontecido. Agora, num caso como este noticiado, se nos colocarmos no lugar das mãe que tiveram seus filhos roubados, fica muito mais complicado manter a razão na hora de fazer esta análise cristã.

Allan Kardec, em O Evangelho Segundo o Espiritismo , disse que “fé inabalável só o é a que pode encarar frente a frente a razão, em todas as épocas da Humanidade”. Assim, vamos ver o acontecido primeiramente sob a ótica ético-moral.

No Dicionário Houaiss de Língua Portuguesa, encontramos estas definições:

Moral é um conjunto de sistemas variáveis de leis e valores caracterizados por organizarem a vida das múltiplas comunidades humanas diferenciando e definindo comportamentos proscritos, desaconselhados, permitidos ou ideais.

Ética á a parte da filosofia responsável pela investigação dos princípios que motivam, distorcem, disciplinam ou orientam o comportamento humano.

Vemos que a ética é mais voltada ao homem e a moral à sociedade. Assim, o que é ético em um determinado grupo, pode não ser em outro. Ou seja, não poderia ser diferente esta analogia a uma cidade, estado ou país.

Equivocadamente, pensando em proteger os bebes, a família das mães solteiras, a família que não podia ter filhos, e o próprio governo, criaram esta lei que tirava das mães os filhos recém-nascidos.

Esta ética, que poderia ser normal para os que criaram, foi salva pela Moral que é mais universal e fez com que tornasse a público estas práticas que tiraram mais de 150 mil crianças das sua mães.

Mas agora, com mais de 50 anos do acontecido, a primeira-ministra pediu desculpas em nome do sistema, uma vez que ela nem participou destas agressões. Então, os que fizeram aquilo tudo ficariam impunes? Só se não estivessem escritas em nossa consciência as Leis Naturais, onde cada um recebe a colheita que plantou.

Nós, que estamos vendo este acontecido de fora, vemos a aplicação da Lei do Progresso na melhoria das Leis naquela sociedade.

Mas, os que estão envolvidos diretamente vivenciam uma oportunidade ímpar para aprendizado com as provas e expiações de cada um.

Reflitamos, neste momento, em como está a consciência dos pais que optaram por abandonar as esposas grávidas; a consciência pesada da família que não apoiou a filha gestante; a consciência dos profissionais que aceitaram executar a dolorosa separação dos filhos de suas mães; a consciência das famílias que foram coniventes alimentando esta prática, aceitando as crianças roubadas; e, por fim, a consciência dos políticos que criaram esta Lei.

Com a imortalidade da alma, percebemos que este triste período acontecido nas existências destas pessoas é um espaço de tempo relativamente pequeno, considerando as tantas outras existências que já tiveram e outras que terão. Que estas almas entendam estas oportunidades para não tornarem dolorosas suas existências futuras.

Com a comunicabilidade dos Espíritos, podemos refletir sobre a afinidade que ajudou a todos estarem vivenciando no mesmo local toda esta experiência de provas, para uns, e expiações, para outros.

Com a reencarnação, não deixaríamos de lembrar também da Lei do Progresso, que não nos permite regredir. Assim como sabemos que existem injustiças, não existem injustiçados, e sim aprendizes da Lei de Causa e Efeito. Os que estão sofrendo agora algum efeito de injustiças causadas por outros, estão inclusos nas expiações que necessitam passar para o seu adiantamento. Então, esperamos que os débitos contraídos no ocorrido sejam reparados brevemente e não estagnados. Assim como as injustiças recebidas não virem revoltas e amarguras.

Como nos disse o Espírito Joanna de Ângelis, numa psicografia de Divaldo Pereira Franco, “o mal que me fazem não me faz mal, o mal que me faz mal é o mal que eu faço, porque me torna um ser mau”.

Podemos colaborar com todos estes envolvidos vibrando com pensamentos de amor e paz para que a caminhada deles em busca da felicidade plena seja sempre com muita luz para não dobrarem nenhuma esquina escura.

  • Humberto Souza de Arruda é evangelizador, voluntário em Serviço de Promoção Social Espírita (SAPSE) e colaborador do Espiritismo.net.