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Dois tibetanos se imolaram com fogo na China para protestar contra a repressão chinesa nas zonas tibetanas, anunciaram organizações de defesa dos tibetanos. Eles foram levados para o hospital, mas faleceram em consequência das queimaduras. Carlos Miguel Pereira comenta.

  • Data :21/09/2012
  • Categoria :

24 de setembro de 2012

Tibetanos cometem atos de imolação

Pequim, 28 Ago 2012 (AFP) - Dois tibetanos se imolaram com fogo no sudoeste da China para protestar contra a repressão chinesa nas zonas tibetanas, anunciaram nesta terça-feira organizações de defesa dos tibetanos.

Lobsang Kalsang, um monge budista de 18 anos, e Damchoek, ex-monge de 17, foram levados para o hospital, mas faleceram em consequência das queimaduras. O gesto desesperado foi cometido na cidade de Aba, província de Sichuan, cenário frequente de protestos contra as autoridades chinesas.

No total, 52 tibetanos, em sua maioria monges budistas, cometeram atos de imolação com fogo desde fevereiro de 2009 para protestar contra a tutela de Pequim no Tibete, de acordo com diversas ONGs.

Notícia publicada no Portal UOL , em 28 de agosto de 2012.

Carlos Miguel Pereira comenta*

Ao longo dos últimos três anos, mais de cinco dezenas de jovens monges tibetanos atearam fogo ao próprio corpo, utilizando esse comportamento como uma forma desesperada de protesto contra a ocupação do Tibete pela China. Diante de notícias tão violentas, somos muitas vezes tentados à formulação de imediatos juízos de valor, ensaiando opiniões extemporâneas que estão naturalmente feridas pela distância física, social e cultural que nos separam de tais situações. Mais do que proferir acusações ou críticas aos autores de tais atitudes, deveremos procurar refletir nas circunstâncias que podem levar alguém a praticar atos tão drásticos contra si próprio.

O Tibete é considerado pela comunidade internacional como uma região autônoma da República Popular da China. Originária de uma antiga dinastia militar, desde o século VII que o Tibete forma um império pacífico e teocrático, orientado pela doutrina budista. A Revolução Chinesa de 1949 marcou o início dos conflitos entre a China e o Tibete. O movimento liderado por Mao Tsé-Tung, impôs a reorganização de alguns costumes e tradições tibetanas para que se ajustassem à ideologia Maoísta e, em 1959, o Dalai Lama foi obrigado a exilar-se na Índia temendo pela sua própria segurança. Cerca de 120 mil tibetanos estão atualmente exilados em países estrangeiros e o governo do Tibete também se encontra no exílio. O governo Chinês argumenta que a sua intervenção na região é pacificadora e pelo progresso e benefício do Tibete, enquanto os tibetanos acusam a China de abusar de violência extrema, de oprimir as tradições religiosas, instituindo um autêntico genocídio cultural ao violentar a liberdade e a dignidade do povo tibetano, obrigando-os a frequentar classes de educação patriótica chinesa, nas quais lhes é exigido que reneguem ao Dalai Lama e prometam lealdade a Pequim.

Sentindo-se oprimidos pela falta de liberdade, feridos na sua identidade cultural, isolados pela indiferença mundial em relação ao sofrimento de longos anos do povo Tibetano e não vendo outra forma de chamarem a atenção para a sua causa, desesperados, alguns monges utilizam a imolação pelo fogo como uma forma drástica de protesto público, procurando, através do dramatismo do ato, sensibilizar a opinião pública para o sofrimento de todos os Tibetanos. Estes atos radicais de protesto tão mais significativos se tornam ao serem executados por monges, representantes da religião Budista adotada pelos tibetanos. Originários de culturas milenares em que morrer pela honra era uma exigência social, as sucessivas auto-imolações praticadas pelos monges não são consideradas pelos tibetanos como atos de violência extrema, mas como sacrifícios, uma dor infligida que se transforma num símbolo do inconformismo de um povo na luta pela sua liberdade e identidade cultural, procurando obter a compaixão e a compreensão da comunidade internacional.

Na questão 951, de O Livro dos Espíritos , Allan Kardec perguntou: “Não é, às vezes, meritório o sacrifício da vida, quando aquele que o faz visa salvar a de outrem, ou ser útil aos seus semelhantes?” A resposta foi: “Isso é sublime, conforme a intenção, e, em tal caso, o sacrifício da vida não constitui suicídio. Mas, Deus se opõe a todo sacrifício inútil e não o pode ver de bom grado, se tem o orgulho a manchá-lo. Só o desinteresse torna meritório o sacrifício e, não raro, quem o faz guarda oculto um pensamento, que lhe diminui o valor aos olhos de Deus.” De seguida, Allan Kardec complementou a resposta com um comentário seu: “Todo o sacrifício que o homem faça à custa da sua própria felicidade é um ato soberanamente meritório aos olhos de Deus, porque resulta da prática da lei de caridade. Ora, sendo a vida o bem terreno a que maior apreço dá o homem, não comete atentado o que a ela renuncia pelo bem de seus semelhantes: cumpre um sacrifício. Mas, antes de o cumprir, deve refletir sobre se sua vida não será mais útil do que sua morte.”

O desespero, acumulado aos sentimentos de injustiça e impotência, tornam muito difícil alimentar uma serenidade de espírito que permita distinguir outros meios de ser útil e ajudar a uma causa, que não pela forma violenta e da auto-destruição. Dessa forma, em vez de recriminarmos estes atos tão desesperados, procuremos refletir e lamentar o fato de no século XXI ainda existirem no nosso planeta situações de opressão e de violência humana tão profunda que originem atos tão impetuosos.

  • Carlos Miguel Pereira trabalha na área de informática e é morador da cidade do Porto, em Portugal. Na área espírita, é trabalhador do Centro Espírita Caridade por Amor (CECA), na cidade do Porto, e colaborador regular do Espiritismo.net.