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Você se atreveria a se desfazer de suas posses mais valiosas e enfrentar a vida sem um tostão no bolso? Foi precisamente isso que Heidemarie Schwermer fez há 16 anos. Ela disse à BBC que este estilo de vida só lhe trouxe felicidade. Breno Henrique de Sousa comenta.

  • Data :30/08/2012
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31 de agosto de 2012

Alemã conta como vive sem dinheiro há 16 anos após doar tudo que tinha

Laura Plitt BBC Mundo

Você se atreveria a se desfazer de suas posses mais valiosas e enfrentar a vida sem um tostão no bolso?

Foi precisamente isso que a alemã Heidemarie Schwermer fez há 16 anos. Ela disse à BBC que este estilo de vida só lhe trouxe felicidade.

Cansada da vida que levava como professora e psicoterapeuta, e preocupada com a quantidade de pessoas sem-teto que via em seu país, ela decidiu se lançar na aventura de viver sem dinheiro.

Schwermer, de 69 anos, tinha previsto que a experiência se prolongaria por um ano, mas pouco depois de começar, percebeu que não conseguiria voltar atrás.

“Foi uma grande libertação”, diz, lembrando como deu de presente tudo o que tinha, incluindo seu apartamento.

“O melhor é a sensação de abertura. Não sei o que acontecerá à noite, nem na manhã do dia seguinte. Não sinto medo, e sim uma grande curiosidade.”

No início, Schwermer começou trocando coisas: oferecia seus serviços - desde limpar casas até ajudar as pessoas com problemas pessoais - em troca de teto e comida. Agora ela diz que não se trata exatamente de trocar, mas simplesmente de compartilhar.

“Dou o que quero dar e me dão o que eu preciso”, explica. Deste modo, ela supre as necessidades mais básicas. A roupa que veste é dada pelas pessoas com quem convive e os gastos restantes - desde a comida e o transporte - são pagos por seus anfitriões.

O que ela lhes dá é de ordem espiritual. “Não são coisas materiais, e sim a minha presença. Muita gente tem problemas ou está sozinha. Eu os escuto e os ajudo a pensar sobre o que querem fazer com suas vidas.”

De conversa em conversa

Na prática funciona mais ou menos assim: Schwermer recebe convites de pessoas de diferentes lugares do mundo que a querem receber e seus anfitriões enviam a passagem para que ela possa chegar lá.

Organizações, instituições e grupos também a convidam a dar palestras e seminários sobre seu modo de vida particular.

Para isso é preciso ter muitos amigos, ou pelo menos muitos convites, mas ela tem todas estas coisas de sobra.

Graças a uma entrevista que deu a uma emissora de rádio anos atrás, o nome da ex-professora tornou-se conhecido na Alemanha. Outras entrevistas na televisão e diversas matérias em jornais e revistas popularizaram ainda mais sua imagem e seu projeto.

O interesse por Schwermer cresceu até se transformar em três livros que ela escreveu - cujos lucros, como era de se esperar, ela doou a organizações de caridade e terceiros - e no documentário Living without money (Vivendo sem dinheiro , em tradução livre), que já foi exibido em 30 países.

Alguns sustentam que ela é um “parasita” e que não lhe falta dinheiro porque vive com o que é dos outros. Muitos moradores de rua também não conseguem se identificar com uma mulher de classe média que não tem nada porque simplesmente não quer.

“É verdade que são os outros que ganham salários para pagar o que eu como, mas eu também trabalho todos os dias. Faço coisas para as pessoas. No mundo ocidental há muitas pessoas que se sentem isoladas, e eu as ajudo com minha presença. Posso ser uma mãe, uma irmã, uma amiga, o que precisarem”, defende-se a alemã.

“Quem diz isso é porque vive no velho sistema, mas tudo vai mudar.”

E quando chegar a velhice? O que acontecerá quando sua companhia deixe de ser uma ajuda e um consolo para transformar-se em um fardo?

“A velhice? Mas eu já sou muito velha! A verdade é que não penso nessas coisas. Quando o problema se apresentar, a solução também se apresentará”, conclui Schwermer, rindo.

Notícia publicada na BBC Brasil , em 10 de julho de 2012.

Breno Henrique de Sousa comenta*

Muitos homens de fé na história da humanidade viveram o desapego dos bens terrenos. Francisco de Assis deixou a riqueza dos seus familiares para viver na extrema pobreza, assim como Sidarta Gautama (Buda), que abandonou seu palácio em busca da iluminação. Outros viveram essa experiência por convicção filosófica, como foi o caso de Diógenes, o célebre filósofo grego que vivia em um barril e exaltava a miséria como virtude extrema. Conta-se que um dia, Alexandre o Grande, o então homem mais poderoso e dono de toda a Terra conhecida, ao encontrar-se com Diógenes, impressionado com sua Inteligência, perguntou o que poderia dar-lhe. Ao que Diógenes lhe respondeu cinicamente – Não me tire o que você não pode dar-me. Referindo-se ao sol, pois Alexandre fazia-lhe sombra. Ganhou a admiração de Alexandre que disse que se não fosse ele próprio gostaria de ser Diógenes.

Em todos os casos, por convicção religiosa ou filosófica, quem opta por esse caminho enxerga na posse material um empecilho para seu progresso espiritual e na pobreza o caminho para a ascensão. O caso da Senhora Schwermer não me parece tão extremo, afinal, ela trabalha realizando palestras, escrevendo livros, prestando serviços de assistência terapêutica, fazendo serviços domésticos e sendo remunerada com o suficiente para suas necessidades. Ela apenas renunciou a acumular riquezas, livrou-se de seus bens e vivencia uma grande sensação de liberdade e desprendimento. Neste caso ela não se torna um peso para a sociedade porque trabalha e faz algo útil. Pessoalmente considero indignos os casos de pessoas que por preguiça decidem viver na pobreza à custa de mirrados recursos de ajudas governamentais ou de familiares, ou mesmo aqueles que forjam uma incapacidade para viverem de indenizações.

O dinheiro é ruim em si? Para o Espiritismo bom ou mau é o uso que se faz do dinheiro e dos bens materiais. Tudo nesta vida nos é dado por empréstimo, não levamos nada de material daqui, somos depositários que seremos chamados a prestar contas do uso que fizemos dos bens que nos foram confiados. Riqueza e pobreza são condições que nos impõem diferentes provas. Na riqueza podemos ser arrastados pela vaidade, orgulho, mesquinhez, perdularidade e luxúria, na pobreza podemos ser arrastados pela revolta, desespero e a perda da dignidade resvalando para a degeneração das virtudes humanas. Por outro lado, ambas as situações nos permitem desenvolver diferentes virtudes como a humildade, a generosidade, a paciência, a resignação, a inteligência, a bondade. Tudo depende do proveito que retiramos de nossas experiências. Assim, qualquer situação na vida é uma prova que nos permite algum aprendizado positivo, mas como em qualquer prova, existe a possibilidade de fracasso. Riqueza e pobreza são provas diferentes, que estimulam campos de experiência diferentes, nenhuma é melhor que a outra.

Naturalmente quando falamos de pobreza não estamos falando de miséria. Essa sim degrada o ser humano. Em uma sociedade regida pelas leis do Cristo, não deve haver miseráveis. Na miséria, o homem não dispõe do mínimo necessário para sobreviver. É uma situação oprimente para o desenvolvimento das faculdades do ser humano por podar-lhe as condições de trabalhar suas capacidades. Os espíritos encarnados nessa situação encontram-se em condição expiatória. Um dia, a Terra estará livre deste tipo de sofrimento.

O Espiritismo esclarece sobre o necessário e o supérfluo e diz que a natureza traçou em suas leis esses limites. Todas as vezes que ultrapassamos esse limite, nosso corpo ou nossa consciência dão sinais claros de desequilíbrio. Quem se alimenta além da conta tem uma indigestão, assim como quem pratica o mal contra o seu próximo sofrerá o arrependimento. Devemos perguntar a nós mesmos o quanto algo nos é realmente necessário ou supérfluo. É preciso também considerar que dentro de uma sociedade ocupamos diferentes funções e posições. Cada um, onde se encontra, possui suas necessidades específicas, o que é necessário para alguém pode ser supérfluo para outrem. Esse argumento pode servir de desculpa retórica para alimentar hábitos supérfluos sob a alegação de que para você, comer caviar com champanhe todos os domingos é uma necessidade, mesmo que seja supérfluo para outra pessoa. Mas o limite de nossa necessidade não deve ser traçado por nossa vontade e sim por nossa consciência crítica. A consciência deve disciplinar a vontade. Veja bem que estou dizendo que é a “consciência” a única forma correta de disciplinar a vontade. Se a vontade for reprimida sem adquirir um novo estado de consciência, gera apenas repressão e frustração, a pessoa é reprimida, mas a vontade permanece.

O exemplo da Senhora Schwermer é o de alguém que adquiriu um novo nível de consciência. É diferente de alguém que se torna pobre porque perdeu a sua fortuna. Esse, por ser privado bruscamente de uma condição de luxo e conforto pela qual estava apegado, sofre e revolta-se.

Na nossa atual sociedade, plenamente capitalista e materialista, as pessoas são medidas e valoradas por suas aquisições materiais, por seus cargos e posições na sociedade. Somos competitivos de maneira desonesta. Muitos, para atingirem a realização material, são capazes de mentir, manipular e até matar. Os que conseguem grande patrimônio são invejados, mas eles vivem o tormento da prisão que criaram para si. Como o rei Midas, a bênção se torna uma maldição. Perdem o sono e vida para arrecadar mais bens, vivem com medo de perderem o que possuem, de serem roubados ou de que aqueles que dizem amá-lo, na verdade estejam apenas interessados em suas riquezas, o quê não raras vezes acontece. O dinheiro que representava liberdade, tempo, felicidade e poder, acaba se tornando uma grande prisão, fazendo valer o ditado popular: É melhor ser dono de uma moeda do que escravo de duas.

Sem dúvida, diante deste panorama, o apego aos bens materiais torna-se um dos maiores empecilhos ao desenvolvimento espiritual. Foi por isso que Jesus disse que é mais fácil um camelo passar pelo buraco de uma agulha do que um rico entrar no reino dos céus. O problema não está na riqueza, mas sim no apego, no tormento e no medo que nos permitimos sentir pelo dinheiro, nas paixões desenfreadas pelas coisas materiais, no descontrole da vida financeira que reflete o descontrole na vida emocional. De nada adiantaria doar todos os bens aos pobres e ficar em um barril como Diógenes. Você poderá estar apegado ao barril, com medo de que lhe roubem o barril. O tormento estará lá da mesma forma, o apego estará igual, você será escravo do barril, estará acorrentado a ele, não poderá ir muito longe com medo de que o roubem. Não importa quanto dinheiro você tem, mas a relação que você constrói com esse dinheiro.

A riqueza tem seu valor e sua importância. Com a riqueza pode-se desenvolver a ciência, criar instituições que atuam nos diversos campos do desenvolvimento humano. A riqueza e pobreza sempre existirão, porque ainda que distribuíssemos igualmente todos os bens do mundo, rapidamente este equilíbrio seria desfeito. “Os homens não são igualmente hábeis para adquirir e nem igualmente sábios e probos para conservar”.

O exemplo da senhora Schwermer nos demonstra mais uma vez que não precisamos da riqueza para sermos felizes, nem mesmo da pobreza. O dinheiro nos dá apenas as condições para o sustento material e a relativa tranquilidade com relação a este sustento, não mais que isso. Os exemplos de homens como Jesus e Francisco de Assis foram para confrontar a ideia dominante na Terra de que só o dinheiro traz felicidade. Eles vieram para provar de maneira radical e chocante que absolutamente não precisamos de dinheiro para sermos felizes, o que não quer dizer que a pobreza seja a felicidade, podemos ser igualmente pobres e infelizes se não soubermos adquirir as riquezas da alma.

  • Breno Henrique de Sousa é paraibano de João Pessoa, graduado em Ciências Agrárias e mestre em Desenvolvimento e Meio Ambiente pela Universidade Federal da Paraíba. Ambientalista e militante do movimento espírita paraibano há mais de 10 anos, sendo articulista e expositor.