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Faz 36 anos que Eliana Zagui vive deitada num leito de UTI do Instituto de Ortopedia do Hospital das Clínicas de São Paulo. Vítima de paralisia infantil aos dois anos, ela perdeu os movimentos do pescoço para baixo. Respira com ajuda de equipamentos. Claudio Conti comenta.

  • Data :23/06/2012
  • Categoria :

28 de junho de 2012

Internada há 36 anos em UTI lança livro de memórias escrito com a boca

CLÁUDIA COLLUCCI DE SÃO PAULO

Faz 36 anos que Eliana Zagui vive deitada num leito de UTI do Instituto de Ortopedia do Hospital das Clínicas de São Paulo. Vítima de paralisia infantil aos dois anos, ela perdeu os movimentos do pescoço para baixo. Respira com ajuda de equipamentos.

Na cama, a menina se formou no ensino médio, aprendeu inglês, italiano, fez curso de história da arte e tornou-se pintora. Tudo isso usando a boca para escrever, pintar e digitar. Hoje, lança (só para convidados) seu primeiro livro: “Pulmão de Aço - uma vida no maior hospital do Brasil” (Belaletra Editora).

Pulmão de aço é o nome de uma máquina, inventada na década de 1920, parecida com um forno. As pessoas com insuficiência respiratória eram colocadas dentro dela, com a cabeça de fora.

Eliana ficou cinco dias lá dentro, mas não funcionou. A pólio havia paralisado completamente o diafragma e a deglutição. Ela teve, então, que ser conectada para sempre a um respirador artificial. Só consegue ficar poucas horas longe do aparelho.

Entre 1955 e o final da década de 70, 5.789 crianças vítimas da pólio foram internadas no HC. Sete delas, atingidas com mais severidade, ficavam lado a lado na UTI. “Nós nos apegávamos um ao outro, como numa grande família. Era a única maneira de suportar aquilo tudo”, lembra Eliana.

Da turminha, só sobreviveram ela e Paulo Machado, 43, que divide o quarto com a amiga e cuja história de vida também aparece no livro. “A Eliana é minha irmã, a minha família. Tem temperamento forte. Quando vejo que ela está brava, coloco os fones de ouvido e fico na minha”, diz.

Eles poderiam viver com suas famílias, com o apoio do hospital. Mas nunca houve interesse por parte delas. Os parentes raramente os visitam. “Não me magoo mais. Já sofri muito e hoje aprendi que cada um é cada um.”

Eliana e Paulo passam a maior parte do tempo na internet. Ela gosta de sites de relacionamentos, de pintura e artesanato. Paulo é aficionado por cinema. Está envolvido na produção de uma animação cuja protagonista é Teca, o apelido carinhoso pelo qual chama Eliana. E, para ela, o amigo é o Teco.

Quando é necessário, ele faz as vezes de irmão mais velho. “Dias atrás, eu me irritei no Face [Facebook] e postei uma mensagem malcriada. O Paulo viu e me chamou a atenção”, conta Eliana, que chegou a ter 3.000 amigos virtuais. “Fiz uma limpa no final do ano e só deixei uns cem. Agora tenho uns 300, mas preciso limpar de novo.”

A saudade dos amigos reais, os quais viu morrer um a um, é o que mais a entristece. “Foram momentos tão bons. Mas não voltam mais.”

No livro, ela relata que flertou com o suicídio. “Avaliava as possibilidades: arrancar a cânula da traqueia com a boca, cortar ou furar o pescoço.” E encerra com humor. “Descobrimos que até para morrer antes da hora precisamos da ajuda de alguém.”

Eliana diz que, volta e meia, essas ideias ainda a visitam, mas que hoje tenta aliviar suas angústias nas sessões semanais de análise.

Pergunto se sonha em viver na casa dos pais. “Não. Eu iria estagnar”, responde convicta. Mas, sim, ela sonha em morar fora do hospital.

Em dezembro último, pela primeira vez em 36 anos, passou o Natal fora do HC, na casa de amigos. Foi de maca e com respirador artificial portátil. “Foi uma experiência ótima, indescritível.”

Quanto ao livro, Eliana diz esperar que ele ajude “aqueles que não querem nada com a vida”. “É claro que cada um tem as suas dores. A minha desgraça não é maior que a sua nem a sua é maior que a minha. Mas é sempre bom poder aprender a tirar o que vale a pena da vida.”

PULMÃO DE AÇO AUTORA Eliana Zagui PREÇO R$ 36 PÁGINAS 240 EDITORA Belaletra

Notícia publicada no Jornal Folha de São Paulo , em 10 de abril de 2012.

Claudio Conti comenta*

O Capítulo IX, d’O Evangelho Segundo o Espiritismo , traz o ensinamento de Jesus, relatado no Evangelho Segundo Mateus, que fala a respeito da mansuetude e diz:

“Bem-aventurados os que são brandos, porque possuirão a Terra.”

“Bem-aventurados os pacíficos, porque serão chamados filhos de Deus.”

O ensinamento de Jesus apresentado serve para duas ocasiões: 1) na resposta agressiva, seja verbal, física ou pelo pensamento, a alguém que tenha causado algum dano; e 2) na revolta contra Deus ou seus desígnios.

Quantos de nós, nas situações de desagrado, ousamos nos revoltar ou maldizer Deus? Na grande maioria das vezes são questões insignificantes, mas que, diante de uma mente não trabalhada, ganha proporções enormes, não condizentes com a situação em si.

O médico Murray Stain, em seu livro O Mapa da Alma, apresenta a abordagem de Carl G. Jung sobre a estrutura da psiques, em referência ao livro AION - Estudo Sobre o simbolismo do Si-Mesmo, fala sobre o que ele denominou de “ego forte” e “ego fraco”.

Ego forte seria uma estrutura mental adequadamente “exercitada” para responder adequadamente para os eventos da vida. Este “exercício mental”, segundo ele, é realizado no confronto com as contrariedades, por isso, todos devem vivenciar adversidades e, quando isto ocorre de forma controlada, com o apoio dos responsáveis pela sua educação, o indivíduo estará em condições de enfrentar e responder adequadamente as contrariedades.

Ao contrário, o ego fraco seria uma estrutura mental que não foi confrontada com as adversidades e contrariedades, ou não foi adequadamente educada para tal. Assim, diante dos conflitos, reagem inadequadamente, sucumbindo a impulsos e reações emocionais, causando malefício maior para si mesmo.

O Capítulo IX, d’O Evangelho Segundo o Espiritismo , fala ainda da paciência, obediência e resignação. Três virtudes que muitas vezes não são bem compreendidas, pois se confundem com a falta de vontade e prostração.

Paciência, obediência e resignação são três virtudes muito bem demonstrada pela Eliana que, aceitando sua condição, não estagnou nem se rebelou contra a sua necessidade reencarnatória, mas demonstrou força para vencer o mundo.

Qualquer comentário que possamos fazer fica diminuído diante das palavras finais da reportagem em questão: ‘Quanto ao livro, Eliana diz esperar que ele ajude “aqueles que não querem nada com a vida”. “É claro que cada um tem as suas dores. A minha desgraça não é maior que a sua nem a sua é maior que a minha. Mas é sempre bom poder aprender a tirar o que vale a pena da vida."’

  • Claudio Conti é graduado em Química, mestre e doutor em Engenharia Nuclear e integra o quadro de profissionais do Instituto de Radioproteção e Dosimetria - CNEN. Na área espírita, participa como instrutor em cursos sobre as obras básicas, mediunidade e correlação entre ciência e Espiritismo, é conferencista em palestras e seminários, além de ser médium pscógrafo e psicifônico (principalmente). Detalhes no site www.ccconti.com .