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Bay Minette, uma cidade no Estado do Alabama, que fica no chamado cinturão da Bíblia, teve de suspender um programa de reabilitação criminal que permitiria a criminosos evitar a prisão se ‘abraçarem Jesus’. Cristiano Carvalho Assis comenta.

  • Data :04/03/2012
  • Categoria :

6 de março de 2012

Após críticas, cidade nos EUA suspende trocas de pena de prisão por missas

Uma cidade no Estado americano do Alabama teve de suspender um programa de reabilitação criminal que permitiria a criminosos evitar a prisão se “abraçarem Jesus”.

Bay Minette, que fica no chamado cinturão da Bíblia no sul dos Estados Unidos, causou polêmica ao propor que condenados por crimes não-violentos troquem a pena de prisão por comparecimento dominical às missas durante um ano.

Entretanto, a proposta despertou a ira de ativistas de direitos humanos, e o programa está na geladeira até que as autoridades avaliem os pontos contra e a favor.

A chamada Operação Restaure a Nossa Comunidade (ROC) nasceu de um encontro entre as autoridades policiais e líderes religiosos da cidade, afirmou ao jornal local Press-Register o xerife de Bay Minette, Mike Rowland.

“Todos concordamos que a raiz dos nossos problemas criminais é a erosão dos valores e da moral familiares. Temos crianças criando crianças e pais que não instigam os valores nos jovens”, afirmou.

Os partidários do programa dizem que a iniciativa pode racionalizar o uso de recursos destinados à reabilitação de condenados. Enquanto a cidade gasta US$ 75 por dia com cada preso, argumentou o xerife, há mais de cem igrejas na região que poderiam “receber” os criminosos de primeira condenação.

Eles teriam de assinar uma folha de comparecimento, e o pastores informariam a polícia sobre a frequência dos inscritos no programa.

‘Anticonstitucional’

A proposta gerou polêmica de entidades como a Fundação pela Liberdade Religiosa, e levou à ação da União Americana de Direitos Civis (ACLU), uma organização não-governamental de direitos civis. A entidade enviou uma carta às autoridades de Bay Minette pedindo que suspendessem imediatamente o programa.

Em sua página na internet, o grupo disse que defende alternativas para sentenças de prisão de condenados, mas que a ideia “viola flagrantemente” a primeira emenda da Constituição americana, que protege, entre outros direitos, o de exercer a religião de sua preferência.

“Diante da elevação dos déficits orçamentários, as jurisdições locais e estaduais têm razão de abraçar alternativas ao encarceramento que apresentem bom custo-benefício e que punam os criminosos ao mesmo tempo em que ataquem as causas do crime”, afirma a nota.

“Mas é um princípio fundamental da Constituição que o governo não pode forçar ninguém a ir à igreja. Quando a alternativa a ir à igreja for ir para a prisão, a chamada ‘escolha’ disponível aos criminosos não é uma verdadeira escolha.”

Defendendo o programa na TV, um pastor da cidade, Robert Gates, disse à NBC News: “Mostre-me alguém apaixonado por Jesus e lhe mostrarei uma pessoa que não será um problema para a sociedade, mas sim uma boa influencia e uma ajuda para aqueles ao seu redor”.

Notícia publicada na BBC Brasil , em 29 de setembro de 2011.

Cristiano Carvalho Assis comenta*

Devemos tomar cuidado com as meias-verdades. Pegar num ponto de vista indiscutível para favorecer os nossos interesses não é uma conduta acertada. Não podemos negar que os ensinamentos de Jesus são o melhor caminho para fazer a modificação íntima de uma pessoa. Mas daí tirar a conclusão que devemos forçar os outros a seguir uma religião vai uma grande distância. Na reportagem em questão, observamos nitidamente que a verdadeira intenção da prefeitura não é a melhora íntima do outro, mas a contenção de despesas e desvio de responsabilidade.

Então, os ativistas têm razão para contestarem essa posição? Em parte sim. Se observarmos com olhos de ver, na maioria das discussões ambas as partes possuem uma parcela da verdade. Bem analisados os argumentos, abrindo a nossa mente ao diálogo e à razão do outro alcançaremos o mais acertado. Ao longo dos séculos, a Humanidade tem sofrido as consequências violentas dos posicionamentos extremistas que inundam na sociedade. Recebi hoje um email que demonstra bem isso: “tudo começou desde que Madeline Murray O’hare (que foi assassinada) se queixou de que era impróprio se fazer oração nas escolas Americanas como se fazia tradicionalmente, e nós concordamos com a sua opinião. Depois disso, alguém disse que seria melhor também não ler mais a Bíblia nas escolas… A Bíblia que nos ensina que não devemos matar, roubar e devemos amar o nosso próximo como a nós mesmos. E nós concordamos com esse alguém.” (mensagem “Será que Deus é culpado?”). Dessa maneira, vamos abrindo mão de valorizarmos o nosso lado espiritual e afastando Deus das nossas vidas e das nossas instituições.

A Operação Restaure a Nossa Comunidade (ROC) está correta na sua ideia de em que há uma enorme necessidade de espiritualizar aqueles que estão em desequilíbrio moral e que esqueceram os limites do certo e errado. O problema surge quando pretende forçá-los a um culto, transformá-los em católicos ou se fosse o caso, em espírita, evangélico, budista ou qualquer outra religião. Os ativistas dos Direitos Humanos estão certos em defender a livre escolha das suas religiões, mas estão limitados pela sua percepção de que a espiritualização ou religiosidade devem ser deixadas de lado.

Equivocamo-nos constantemente ao acharmos que o fim é sermos de alguma designação religiosa e esquecemos que todas elas são apenas um meio de alcançarmos a finalidade de toda ou qualquer religião: o contato com a Divindade e a melhora íntima de cada um de nós.

Uma boa solução seria a criação de Centros de Religiosidade, sem qualquer designação religiosa específica, tendo como diretriz um preceito que foi utilizado por Allan Kardec ao escrever em “O Evangelho Segundo Espiritismo”: “Podem dividir-se em cinco partes as matérias contidas nos Evangelhos: os atos comuns da vida do Cristo; os milagres; as predições; as palavras que foram tomadas pela Igreja para fundamento de seus dogmas; e o ensino moral. As quatro primeiras têm sido objeto de controvérsias; a última, porém, conservou-se constantemente inatacável. Diante desse código divino, a própria incredulidade se curva. É terreno onde todos os cultos podem reunir-se, estandarte sob o qual podem todos colocar-se, quaisquer que sejam suas crenças, porquanto jamais ele constituiu matéria das disputas religiosas, que sempre e por toda a parte se originaram das questões dogmáticas (grifo nosso).”

A humanidade necessita de aprender a conviver com as suas diferenças e só através da espiritualização de cada um será capaz de realizar este trabalho. Por isso é importante estimulá-la em todos os momentos das nossas vidas. Sabemos que o afastamento da religiosidade se deu pelo trauma criado pelas religiões ao longo dos séculos. Mas nem por isso ela perdeu a sua importância. Só conseguiremos sua realização quando ela ficar em destaque, guiando e influenciando todas as nossas relações de trabalho, estudo, divertimento ou de descanso. Para nos precavermos do fanatismo religioso, lembremos do conselho encontrado em “O Evangelho Segundo Espiritismo”: “Não consiste a virtude em assumirdes severo e lúgubre aspecto, em repelirdes os prazeres que as vossas condições humanas vos permitem. Basta reporteis todos os atos da vossa vida ao Criador que vo-la deu; basta que, quando começardes ou acabardes uma obra, eleveis o pensamento a esse Criador e lhe peçais, num arroubo d’alma, ou a sua proteção para que obtenhais êxito, ou a sua bênção para ela, se a concluístes. Em tudo o que fizerdes, remontai à Fonte de todas as coisas, para que nenhuma de vossas ações deixe de ser purificada e santificada pela lembrança de Deus.”

  • Cristiano Carvalho Assis é formado em Odontologia. Nasceu em Brasília/DF e reside atualmente em São Luís/MA. Na área espírita, é trabalhador do Centro Espírita Maranhense e colaborador do Serviço de Atendimento Fraterno do Espiritismo.net.