Carregando...

  • Início
  • Albina de seis anos é morta ‘para feitiçaria’ no Burundi

Uma menina de seis anos que sofria de albinismo foi encontrada morta e com seus membros cortados no Burundi, em mais um caso, aparentemente motivado por rituais de feitiçaria, de pessoas com essa desordem genética. Jorge Hessen comenta.

  • Data :02 May, 2009
  • Categoria :

Albina de seis anos é morta ‘para feitiçaria’ no Burundi

Uma menina de seis anos que sofria de albinismo foi encontrada morta e com seus membros cortados no Burundi, em mais um caso de assassinato, aparentemente motivado por rituais de feitiçaria, de pessoas com essa desordem genética.

A menina, que foi atacada no domingo, foi a terceira pessoa com albinismo a ser morta no país africano desde setembro.

Outros ataques contra albinos ocorreram também na Tanzânia, país vizinho ao Burundi.

Os albinos da região se transformaram em alvos devido à crença divulgada por feiticeiros de que as partes dos corpos destas pessoas podem ser usadas em poções mágicas para garantir às pessoas juventude, riqueza e poder.

De volta para casa

O último ataque ocorreu na província de Ruyigi, leste do Burundi. Segundo o correspondente da BBC no país Prime Ndikumagenge, pessoas armadas atacaram a casa da família e amarraram os pais da menina.

Segundo as autoridades locais, o grupo então deu um tiro na cabeça da criança.

O governador da província, Moise Bucumi, disse à BBC que acredita que os responsáveis pelo ataque podem ser da Tanzânia e que iria falar com as autoridades daquele país para coordenar uma ação contra estes ataques.

O diretor da Associação de Albinos do Burundi, Kasim Kazungu, afirmou que as pessoas com o problema não sofriam nenhuma discriminação até que outras pessoas no país ficaram sabendo do lucrativo comércio de partes dos corpos de albinos na Tanzânia.

Na semana passada, a polícia no sudoeste da Tanzânia prendeu um homem que estava tentando vender sua mulher, albina, para comerciantes congoleses.

Duas mães no oeste da Tanzânia também foram atacadas com facões depois que gangues não conseguiram encontrar seus filhos albinos.

Notícia publicada na BBC Brasil , em 17 de novembro de 2008.

Jorge Hessen comenta*

Uma menina de seis anos que sofria de albinismo foi encontrada morta e com seus membros cortados no Burundi,(1) em mais um caso de assassinato, provavelmente motivado por rituais de feitiçaria, pois segundo crença os órgãos de pessoas com essa desordem genética são usados para fazer poções mágicas para garantir às pessoas juventude, riqueza e poder. Estamos diante da condição extremamente primitiva do ser humano para tais crenças.

Historicamente, quando o homem era fisicamente parecido com os primatas, suas manifestações de religiosidade eram as mais bizarras, até que, transcorridos os anos, no mistério dos séculos, surgem os primeiros organizadores do pensamento religioso que, de acordo com a mentalidade geral, não conseguiram escapar das concepções de ferocidade que caracterizavam aqueles seres egressos do egoísmo animalesco da irracionalidade. O homem foi levado a crer que os sacrifícios humanos poderiam agradar a Deus primeiramente, por não compreenderem Deus como sendo a fonte da bondade. os povos primitivos e politeístas adoravam os deuses através de oferendas, cultos, rituais que, geralmente, comportavam sacrifícios de animais ou de seres humanos. Consoante nos esclarece a questão 669 de O Livro dos Espíritos , “os sacrifícios existiam. Primeiramente, porque não compreendia Deus como sendo a fonte da bondade. Nos povos primitivos a matéria sobrepuja o espírito; eles se entregam aos instintos do animal selvagem. Por isso é que, em geral, são cruéis; é que neles o senso moral ainda não se acha desenvolvido. Em segundo lugar, é natural que os homens primitivos acreditassem ter uma criatura animada muito mais valor, aos olhos de Deus, do que um corpo material. Foi isto que os levou a imolarem, primeiro animais e, mais tarde, homens.” (2) De confomidade com a falsa crença que possuíam, imaginavam que o valor do sacrifício era proporcional à importância da vítima.

Ao começar a comentar tal situação, veio-nos triste lembrança à memória quando, no mês de outubro de 1890, foi promulgado o Código Penal da República, que, desreitosamente, associa a prática do Espiritismo a rituais de magia e adivinhações. O texto dizia o seguinte no Artigo 157: “É crime praticar o Espiritismo, a magia e seus sortilégios, usar de talismãs e cartomancia (…), inculcar curas de moléstias (…) e subjugar a credulidade pública. Pena: prisão celular de 1 a 6 meses e multa de 100 a 500 $” . Os espíritas reclamaram com Campos Sales, Ministro da Justiça da época, mas isso nada adiantou. O relator do Código, João Batista Pinheiro, limitou-se a dizer que o texto referia-se à prática do “baixo” Espiritismo. Como se existissem dois Espiritismos. Na verdade, os republicanos utilizaram os espíritas como bodes expiatórios para diminuir a oposição católica ao novo regime, causada pelo desatrelamento entre a Igreja e o Estado. Como consequência do Código, vários companheiros foram presos em 1891, no Rio de Janeiro. Preocupado com possíveis focos de resistência ao regime, o Governo autorizou a polícia a invadir reuniões e residências à procura de opositores. Para evitar confusões, muitos centros decidiram fechar temporariamente.

Alguns adeptos do cristianismo contemporâneo, ainda por ignorância consideram o Espiritismo como doutrina de práticas demoníacas. Será que o Espiritismo que hoje se expande no Brasil e no mundo é a continuação da necromancia e do ocultismo praticados pelos povos antigos? Lamentavelmente, para tais cristãos, o Espiritismo é associado à bruxaria, à magia, à feitiçaria, etc. Fenômenos mediúnicos em suas múltiplas variáveis, da eficácia do passe e da água fluida, etc, são explicados como obra de Satanás (para os protestantes) ou do inconsciente (para “parapsicólogos” e/ou católicos).

O intercâmbio com os espíritos no Espiritismo é realizado por razões nobres, que objetivam a consolação de quem se depara com a desencarnação de um ente querido, o auxílio ao espírito em estado de sofrimento no além, o estudo da dinâmica da vida na dimensão espiritual e não para a satisfação dos interesses pessoais como “adivinhações” que podem estar sujeitas as brincadeiras de espíritos zombeteiros.

O objetivo de estudo da Doutrina Espírita é justamente tornar o sobrenatural ou oculto em natural e conhecido, dando fim a superstições e crendices, portanto não se trata de doutrina ocultista e, por consequência, primitiva. Ainda assim, muitos insistem em associar o Espiritismo a superstições. Nas práticas do Espiritismo, conforme os ensinamentos de Kardec e seus seguidores, não se fazem sacrifícios humanos, não se interrogam astros, adivinhos e magos para se informar de qualquer “revelação”, não se usam objetos, medalhas, talismãs, fórmulas sacramentais, nem se escolhem lugares lúgubres e horários específicos para atrair ou afastar Espíritos.

A propósito, há alguma coisa de verdadeiro nos pactos com os maus Espíritos? Não há pacto com os maus Espíritos. Há, porém, pessoas más que simpatizam com os maus Espíritos e pedem a eles que pratiquem o mal, ficando então obrigados a servir depois a esses Espíritos porque estes também precisam do seu auxílio. Nisto apenas é que consiste o pacto. É como explicam os Benfeitores: por exemplo – “queres atormentar o teu vizinho e não sabes como fazê-lo; chamas então os Espíritos inferiores que, como tu, só querem o mal; e para te ajudar querem também que os sirva com seus maus desígnios. Mas disso não se segue que o teu vizinho não possa se livrar deles, por uma conjuração contrária ou pela sua própria vontade” .(3)

No trecho citado acima, o Benfeitor espiritual demonstra de maneira muito clara que é possível uma criatura evocar maus Espíritos para ajudá-la a causar mal a uma outra pessoa. “Não há pactos, há formação de vínculos de simpatia. É a Lei da Sintonia. A resposta esclarece ainda que este ato pode ser realizado por uma sequência de procedimentos conhecidos como conjuração. Vai mais longe dizendo que a pessoa atingida pelo malefício poderá se livrar dele por uma vontade poderosa ou por uma conjuração contrária àquela que foi usada para fazê-lo.” (4)

Quanto a associar Espiritismo à magia e à feitiçaria, é importante saibamos que em todas as épocas tem havido pessoas médiuns por natureza ou inconscientes que, por produzirem fenômenos insólitos e não compreendidos, são qualificadas de bruxos ou feiticeiros e acusadas de ter pacto com Satanás. Porém, basta comparar o poder atribuído aos feiticeiros com a faculdade dos médiuns propriamente ditos, para se estabelecer a diferença. Destarte, longe de ressuscitar a bruxaria, o Espiritismo a destruiu definitivamente, despojando-a do seu pretenso poder sobrenatural, de suas fórmulas, despachos, amuletos e talismãs, reduzindo as suas devidas proporções os fenômenos possíveis e que em verdade não ultrapassam o âmbito das leis naturais. Isso porque “o Espiritismo, é ao mesmo tempo, uma ciência de observação e uma doutrina filosófica. Como ciência prática ele consiste nas relações que se estabelecem entre nós e os espíritos; como filosofia, compreende todas as consequências morais que dimanam dessas mesmas relações.” (5)

Que todos saibam uma vez por todas que Espiritismo sério reprova, como o legítimo cristianismo reprova, os falsos devotos e os excessos do fanatismo. Não é, pois, nem lógico nem razoável imputar ao Espiritismo em geral os abusos que ele condena, ou as faltas daqueles que não o compreendem. Antes de formular uma acusação, é preciso ver se ela assenta justo. Portanto, diremos: “A censura da Igreja cai sobre os charlatães, os exploradores, as práticas da magia e da feitiçaria; nisso ela tem razão. Quando a crítica religiosa e cética, filtra os abusos e estigmatiza o charlatanismo, não faz melhor com isso que ressaltar a pureza da sã doutrina, que ajuda, assim, a se desembaraçar das más escórias; nisso facilita a nossa tarefa. Seu erro está em confundir o bem e o mal, por ignorância na maioria, por má-fé em alguns; mas a distinção que ela não faz, outros a fazem. Em todos os casos, sua censura, à qual todo espírita sincero se associa no limite do que se aplica ao mal, não pode atingir a Doutrina” ,(6) até porque a Doutrina Espírita é genuinamente cristã.

Fontes:

  1. O Burundi é um pequeno país interior da região dos Grande Lagos africanos;

  2. Kardec, Allan. O Livro dos Espíritos, RJ: Ed. FEB, 1999, questão 669;

  3. idem, questão 549;

  4. idem, questão 553-a;

  5. Kardec, Allan. O que é o Espiritismo, RJ: Ed. FEB, 1992;

  6. Kardec, Allan. O Céu e o Inferno , RJ: Ed. FEB, 1999, I parte, Cap. X.

  • Jorge Hessen é natural do Rio de Janeiro, nascido em 18/08/1951. Servidor público federal lotado no INMETRO. Licenciado em Estudos Sociais e Bacharel em História. Escritor (dois livros publicados), Jornalista e Articulista com vários artigos publicados.