Carregando...

  • Início
  • Caminhoneiro devolve R$ 17 mil achados num posto de gasolina

Valdir Costa dos Santos, de 41 anos, dispensou o dinheiro e pediu orações como recompensa. Por que atitudes como esta ainda despertam a atenção? André Luiz Rodrigues dos Santos comenta.

  • Data :12 Jan, 2008
  • Categoria :

Caminhoneiro devolve R$ 17 mil achados num posto de gasolina

Valdir Costa dos Santos, de 41 anos, dispensou o dinheiro e pediu orações como recompensa.

Chico Siqueira, de O Estado de S. Paulo

ARAÇATUBA - Num raro ato de honestidade, o caminhoneiro Valdir Costa dos Santos, 41 anos, morador em Curitiba (PR), devolveu os R$ 17 mil que achou no estacionamento de um posto de combustíveis às margens da BR-153, no município de Promissão, interior de São Paulo.

Dois dias após achar o dinheiro, Santos comprou dois cartões telefônicos e começou a procurar o dono dos reais, o engenheiro agrônomo José Carlos de Oliveira.

Na noite de terça-feira, os dois se encontraram na cidade de São José do Rio Preto (SP) e Oliveira, que tinha retirado o dinheiro do banco para comprar gado, recebeu a polchete com os R$ 17 mil intactos. Até então, Santos nem sabia quanto havia dentro da bolsa.

O caminhoneiro recusou a recompensa. “Apenas pedi para ele orar por mim e por minha família, que já estava bem pago”, contou. Santos, que ganha cerca de R$ 1,2 mil por mês dirigindo uma carreta para transportar garrafas de refrigerantes, disse não ver virtude alguma em devolver um dinheiro achado.

“Não fiz mais que minha obrigação, mas meus amigos me chamaram de burro”, diz. “Para mim, o que importa é dar um bom exemplo para os meus filhos”, concluiu Santos, pais de cinco filhos.

Notícia publicada em O Estado de São Paulo , em 10 de janeiro de 2008.

André Luiz Rodrigues dos Santos comenta*

“Você também gosta de levar vantagem em tudo, certo?”, disse Gérson, jogador da Seleção Brasileira de Futebol de 1970, numa propaganda da época. Embora sua intenção não fosse associar-se ao lado pejorativo de tal pensamento, essa idéia tornou-se dominante no pensamento popular brasileiro e, por extensão (de forma genérica), pelo mundo afora, como sendo uma regra geral para os astutos. “Levar vantagem” nas situações, ainda que em detrimento de seu semelhante, demonstra a aplicação do intelecto em benefício próprio, sem, entretanto, fazer uso dos atributos morais cristãos que todos devem cultivar e praticar.

Jesus, “o tipo mais perfeito que Deus tem oferecido ao homem, para lhe servir de guia e modelo”1, em seus ensinamentos, pregou que se deve amar a Deus sobre todas as coisas, e ao próximo como a si mesmo2. Partindo dessa referência, questiona-se: como incorporar valores dessa magnitude vivendo pelas regras do mundo, onde o egoísmo, como reflexo do instinto animal de auto-preservação, ainda é uma das características dos seres nele viventes? A falta de escrúpulos ao se admitir que o caminho mais vantajoso, transpassando por quantas “portas largas” forem necessárias, é o que proporciona certa felicidade já não impressiona mais.

Allan Kardec, o codificador dos ensinamentos dos Espíritos, faz uma classificação dos mundos conforme o adiantamento moral de seus habitantes. Temos em nosso planeta a característica dos “mundos de expiação e provas, onde domina o mal”3. Violência, paixões terrenas, egoísmo, orgulho, indiferença… São imperfeições que se apresentam em todos os indivíduos, encarnados ou não, variando o grau de intensidade segundo o esclarecimento e a espiritualização adquirida pelas experiências vividas.

Inicialmente, torna-se aceitável que deslizes morais ocorram por se tratar de um mundo habitado por seres imperfeitos. Porém, o planeta já não mais caminha apoiado em desculpismos. A evolução tecnológica, que proporciona conforto material a todos, demonstra que a inteligência humana já atingiu um patamar bastante elevado para fazer julgamentos comportamentais. Dessa forma, é essencial que o indivíduo compreenda que a civilidade não deve apenas ser vista como um modismo, mas como uma necessidade básica para que a felicidade suprema não seja uma utopia.

Os meios de comunicação comprazem-se em apresentar ao mundo personagens, cujos comportamentos bizarros despertam a atenção geral, como os caridosos, os honestos, os bem-educados, os cumpridores de deveres cívicos, dentre outros, que agem “remando contra a maré”, sustentando-se em seus sólidos princípios pessoais. Esse tipo de pensamento, impactante ao se deparar com a boa conduta, se dá, certamente, pela banalização das contravenções legais e morais cometidas no dia-a-dia das pessoas: uma fila que se fura, uma discreta infração no trânsito, uma pequena manobra para burlar a legislação tributária, o benefício pessoal pelo consumo de produtos ilegais, a malandragem e a esperteza nas práticas esportivas, a idolatria pelos vilões da ficção e seus métodos maquiavélicos, enfim, sutilmente os valores são devorados pela rotina imoral individualista dentro de uma coletividade. A partir dessa visão, o singelo e natural ato de devolver o que não lhe pertence tornou-se uma aberração.

Estaria Charles Darwin justificando o comportamento humano com a sua teoria, onde apenas o mais adaptado ao ambiente sobreviverá? Jesus afirma, com veemência, que não. Para se alcançar o estado de plenitude sonhado, deve-se vencer o mundo como Ele mesmo venceu. A estratégia não é das mais complexas: “Como quereis que os homens vos façam, assim fazei-o vós também a eles”4. Adotando-se este lema como filosofia de vida, chegará o dia em que todas as ações comuns dos homens de boa vontade serão um mero reflexo de sua elevação espiritual e os destaques serão os pensamentos, as palavras e os gestos, onde o amor, a verdade e a justiça encontram-se ausentes.

(1) O Livro dos Espíritos - questão 625. (2) Marcos 12:28-31. (3) O Evangelho segundo o Espiritismo - Cap. 3, item 4. (4) Lucas 6:31.

*André Luiz Rodrigues dos Santos é paulista, espírita desde 1991, militar e professor. É membro da Equipe Espiritismo.net, atuando nas áreas de Atendimento Fraterno, divulgação e estudos doutrinários no meio virtual.