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  • 'Não quero morrer sem revê-la': as mães que doaram seus filhos no passado e hoje lutam para reencontrá-los

Selma Trigo comenta sobre histórias das mães que doaram os filhos no passado são precedidas por situações como abuso sexual, pobreza extrema ou abandono familiar. O Dia das Mães é uma data incompleta para a aposentada Josefa Gildete, de 48 anos. ‘Sempre sinto muita falta da minha filha e me pergunto onde ela está’, diz à BBC News Brasil

  • Data :15 Jun, 2020
  • Categoria :

Vinícius Lemos

Da BBC News Brasil em São Paulo

O Dia das Mães é uma data incompleta para a aposentada Josefa Gildete, de 48 anos. “Sempre sinto muita falta da minha filha e me pergunto onde ela está”, diz à BBC News Brasil.

A mesma sensação de angústia é vivida pela artesã Daniele Malsa Porfirio, de 48 anos. “Todos os dias penso no que o meu filho pode estar fazendo e se ele está bem”, conta. A aposentada Rose Dias, de 60 anos, tem o mesmo sentimento. “É muito ruim não saber onde a minha filha está”, lamenta.

Josefa, Daniele e Rose doaram os filhos recém-nascidos décadas atrás, por diferentes motivos. Hoje, buscam reencontrá-los e convivem com a incerteza e a saudade. Em comum, carregam também um medo: morrer sem ter notícias sobre esses filhos que doaram na juventude. “Não quero partir sem saber como a minha filha está”, diz Josefa.

Assim como elas, são comuns histórias de brasileiras que doaram os filhos no passado. Esses casos são permeados por situações como gestações não planejadas, falta de recursos financeiros e ausência de apoio do pai da criança. Para muitas dessas mães, entregar o filho para outra família é um gesto de amor.

A entrega de uma criança sem passar pelos trâmites judiciais é conhecida popularmente como ‘adoção à brasileira’. O procedimento ocorre, normalmente, com a participação da mãe biológica e dos pais adotivos, que registram o bebê como se fosse seu filho biológico. “Esse tipo de adoção era muito comum no passado, principalmente quando a mãe era muito pobre e não conseguiria criar o bebê”, explica a advogada Mariana Turra Ponte, especialista em Direito de Família e Sucessões.

A psicóloga Juliana Martins, que pesquisou sobre mães que entregaram os filhos para outras famílias, afirma que uma das maiores dificuldades enfrentadas por essas mulheres é o estereótipo de que são pessoas ruins.

“Tudo isso resulta do papel social atribuído à mulher. A compreensão social que se dá a essa entrega é sempre colocando a mãe como ruim, porque se fosse boa não entregaria. É como se significasse falta de amor”, diz a psicóloga, que investigou sobre o tema durante o seu mestrado, no Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo (USP). A pesquisa deu origem ao livro Mulheres de Maternidade Impedida (ComArte, 2019).

Juliana trabalhou em um abrigo para mulheres grávidas em situação de vulnerabilidade. No lugar, conheceu histórias de gestantes que planejavam doar os filhos. “Uma mulher que entrevistei e entregou o filho me disse que o que ela fez foi um ato de amor, porque naquele momento não tinha condições de criá-lo e não tinha o apoio de ninguém. Era a única opção e ela escolheu uma família que daria a ele tudo o que precisasse”, diz a psicóloga.

Gravidez após abuso

Muitas das histórias das mães que doaram os filhos no passado são precedidas por situações como abuso sexual, pobreza extrema ou abandono familiar.

Josefa morava no município de Crisópolis, na Bahia, quando se mudou para São Paulo, aos 19 anos, em busca de emprego. Na capital paulista, trabalhou como empregada doméstica. Em uma noite, enquanto estava um salão de festas, conheceu um rapaz. “Ele me deu uma bebida batizada. Só me lembro de acordar perdida na rua, sem saber voltar para casa. Eu ainda era virgem”, diz.

A aposentada conta que posteriormente descobriu a identidade do homem. “Ele era um caminhoneiro casado. Nunca tive coragem de procurá-lo novamente. Fiquei muito magoada”, diz. Também não o denunciou. “Não sabia que era possível fazer isso. Não queria arrumar problemas.”

Meses depois, descobriu que estava grávida. “Fiquei desesperada e com muito medo, porque não sabia o que fazer”, comenta. Ela revela que não quis procurar o caminhoneiro. “Não queria que ele soubesse, por tudo o que me fez”, diz.

Durante a gestação, continuou trabalhando como empregada doméstica. “Só a minha patroa e meus tios de São Paulo sabiam. Não contei para ninguém da Bahia”, conta.

“Foram momentos muito difíceis. Eu era uma jovem de 20 anos, totalmente perdida, sozinha e não tinha muito o que fazer”, lamenta. Ela revela que a tia, que também morava em São Paulo, disse que a única alternativa seria doar a criança. “Meu tio arrumou um casal que não conseguia ter filhos, falou com a minha patroa e decidiram que dariam a minha filha para esse casal”, detalha.

Josefa conta que a filha foi doada no dia em que nasceu, em 11 de janeiro de 1992. “Não consegui amamentá-la”, diz a aposentada, aos prantos. “Eu assinei um papel quando a entreguei. Não sabia o que era aquilo exatamente, mas me pediram para assinar”, relata.

Ao falar sobre a saudade da filha, ela se emociona. “Entregar a minha filha foi a maior burrada que eu fiz na minha vida. Não deveria ter feito, mas não tinha opção”, lamenta.

Anos depois, Josefa começou a procurar pela garota. Ela pediu informações aos parentes de São Paulo. “Meus tios diziam que não sabiam para onde o casal levou a minha filha, mas eu não acredito. Eles nunca quiseram me contar, para eu não ir atrás”, declara. Na busca pela filha, também mandou cartas a programas de televisão. “Mas nunca tive nenhuma pista da minha menina”, lamenta.

No hospital em que a criança nasceu, a aposentada também não conseguiu notícias que pudessem ajudá-la a encontrar a filha.

Ela se casou, teve filhos e posteriormente se separou. Após se divorciar, deixou São Paulo e retornou para Crisópolis. “Cuidei e ainda cuido dos meus filhos (hoje com 14 e 17 anos) sozinha. Faço o maior esforço para criá-los e todos os dias penso que se eu não tivesse deixado doarem a minha filha, eu também conseguiria fazer esforço para criá-la”, diz.

Hoje, Josefa é aposentada por invalidez. Ela tem distonia — síndrome que provoca alteração motora e prejudica os movimentos do indivíduo. Os problemas musculares, para ela, são toleráveis, quando comparados à dor de não ter informações sobre a filha. “Nenhum sofrimento para mim é tão grande quanto não saber onde está a minha menina”, diz.

‘A minha mãe me obrigou a doar o meu filho’

A dor causada pela saudade do filho também faz parte da vida de Daniele Malsa. A artesã relata que desenvolveu quadro de síndrome do pânico, transtorno de ansiedade e depressão profunda ao longo dos anos, após sofrer intensamente com a falta do primogênito.

Ela tinha 19 anos e morava em Curitiba (PR) quando começou a se envolver com um rapaz da cidade. O breve relacionamento aconteceu às escondidas. “Eu tinha bastante medo de contar aos meus pais, porque a minha família era muito desestruturada. O meu pai era alcoólatra e muito violento. A minha mãe o apoiava em tudo”, relata.

Daniele começou a passar mal, procurou um médico e descobriu a gestação. “Eu estava com quatro meses. Pra mim, foi um choque. Eu tinha 19 anos, mas era como uma criança. Eu sequer sabia direito como engravidava. Quando soube da gravidez, fiquei chocada”, relata.

Ela não estava mais se relacionando com o pai da criança quando descobriu a gestação. “Nunca mais o encontrei, porque não tínhamos meios de comunicação tão fáceis como agora. Ele nunca soube”, diz.

Por meses, a artesã escondeu a gravidez de todos. “Eu usava roupas largas e disfarçava para que ninguém desconfiasse”, diz. “Contei para a minha mãe apenas quando fiz oito meses, porque não tinha mais jeito”, relata.

A mãe reprovou duramente a gestação da filha. “Ela disse que tinha asco de mim e falou que teria que resolver essa situação logo. Mesmo com oito meses de gestação, fui mandada para a casa de uma enfermeira que fazia abortos”, diz. Daniele foi para Lapa, um município no interior do Paraná.

Segundo Daniele, a enfermeira lhe deu chás. “Eram abortivos”, diz. Os produtos não fizeram com que a jovem perdesse o bebê, mas anteciparam o parto da criança. “Meu filho veio ao mundo com oito meses.”

O bebê nasceu em 23 de outubro de 1991. “Quando tive o primeiro contato com ele, foi muito duro, porque eu me senti culpada por não ter cuidado dele adequadamente enquanto estava na minha barriga”, lamenta.

A artesã conta que a mãe apareceu no hospital. “Ela olhou para o meu filho e disse que era a minha cara. Mas falou que a gente não ficaria com ele, porque não queria um neto bastardo”, relata.

Três dias após o parto, Daniele e o filho, a quem ela chamou de Angel, foram para a casa da enfermeira. “Essa mulher me disse que uma família no interior de São Paulo iria ficar com ele. Não sei se é verdade. Mas ela tirou o meu filho dos meus braços e me afastou dele. Eu não tive o que fazer, porque não tinha nenhuma condição financeira para criá-lo. Foi um momento horrível.”

Daniele nunca mais viu o filho. “Desde então, todos os dias me pergunto o que aconteceu com ele”, emociona-se. Ela retornou para a casa dos pais. “Não tinha para onde ir. Tive de voltar, mas com a certeza de que iria embora logo que tivesse condições”, relata.

Aos 21 anos, Daniele se mudou sozinha para São Paulo. “O meu principal objetivo era encontrar meu filho. Mas não sabia onde ele poderia estar”, diz. Sem indícios sobre a cidade para a qual o filho poderia ter sido levado, ela não conseguiu procurá-lo. “Eu foquei em trabalhar, sempre à espera de um dia conseguir alguma pista dele.”

“A minha mãe nunca quis me contar nada sobre o meu filho. Eu acredito que o meu filho está vivo”, diz.

Anos atrás, a artesã descobriu que a enfermeira que levou o filho chegou a ser presa por fazer abortos e morreu pouco depois. “Nunca consegui falar com ela para saber o que aconteceu com o meu filho”, diz.

Há cinco anos, Daniele revelou o caso aos irmãos mais novos. “Antes, eu tinha vergonha dessa história e não gostava de contar para as pessoas”, diz. Um dos irmãos dela buscou informações a respeito do sobrinho na unidade de saúde em que o garoto nasceu. “Mas disseram para ele que os arquivos antigos do hospital haviam se perdido com o tempo e não teriam como ajudar”, diz.

Sem respostas, Daniele vive uma espera incerta. “Sempre me pergunto quando ele deu os primeiros passos, quando começou a falar e se a família adotiva cuidou bem dele. É muito difícil não ter respostas”, afirma.

Em São Paulo, Daniele se casou e teve outro filho. Há 14 anos, após se divorciar, decidiu recomeçar a vida no Chile. Atualmente mora na cidade de Casablanca junto com o caçula, de 16 anos. “Sempre que abraço o meu filho, fico pensando no carinho que deixei de dar para o mais velho”, lamenta.

Em razão da depressão profunda e da síndrome do pânico, teve de abandonar um antigo emprego como promotora de eventos. “Nunca superei o fato de terem levado o meu filho de mim. É um trauma que me afeta até hoje e nunca vou superar”, diz Daniele, que hoje produz objetos de cerâmica

‘Eu era uma adolescente perdida’

A depressão também acompanha a aposentada Rose Dias, em razão da saudade da filha. “A culpa que eu sinto é muito grande”, declara.

Rose relata que tinha 16 anos quando saiu da casa dos pais, porque queria ter a própria liberdade. Em busca de emprego, começou a trabalhar como dançarina em uma casa noturna em Várzea Grande, na região metropolitana de Cuiabá (MT). “Decidi ir para o mundo. Não tinha experiência nenhuma na vida e fui parar em uma boate”, relembra.

Ela relata que se envolveu com drogas e engravidou da filha, que batizou como Alessandra Rosa Dias. “Eu tinha 16 anos. A minha vida era completamente desregrada, mas eu amava muito a minha filha”, afirma. A menina nasceu em 18 de abril de 1976, em Cuiabá. O pai da criança, segundo ela, não a ajudou de nenhuma forma.

Quando a filha tinha quatro meses, Rose entregou a criança para uma mulher. “Eu estava muito ruim, dopada de tanta droga e, inconsciente. Dei a minha filha, junto com a certidão de nascimento dela, para uma moça que lavava roupas para a boate”, diz.

Ela classifica a decisão de doar a criança como uma ação precipitada. “Logo que eu retomei a consciência, vi o que eu tinha feito e me arrependi”, conta.

“Mas eu não sabia como procurar aquela mulher para quem entreguei a minha filha. A única coisa que sabia era que ela lavava roupas para a boate. Pedi ajuda, mas ninguém me ajudou. Ali naquele lugar era cada um por si. Eu era uma criança, totalmente inexperiente”, relata.

Sem respostas sobre o paradeiro da filha, ela decidiu ir embora de Cuiabá. “Eu fiquei desesperada. Não tinha o que fazer. Ninguém me ajudava e a mulher nunca mais apareceu. Fiquei totalmente sem rumo. Decidi ir para o Rio de Janeiro, tentar recomeçar”, diz.

Anos depois, ela retornou à capital mato-grossense, em busca da filha. “Procurei novamente, mas não a encontrei. Não consegui nenhuma pista. Nunca mais encontrei aquela mulher para quem entreguei a minha filha. Acredito que, desde o começo, algumas pessoas sabiam sobre o paradeiro dela, mas nunca quiseram me falar”, declara.

Nas últimas décadas, Rose passou a buscar respostas sobre a filha. Não se casou, nem teve outros filhos. “Todo esse meu sofrimento me transformou em uma pessoa melhor. Me libertei das drogas e passei a ter fé em Deus”, diz ela, que hoje é evangélica. “Eu já perdi as contas de quantas buscas fiz. Tentei de tudo, mas nada. Não sei mais o que fazer. É muito difícil passar por tudo isso”, declara.

“Eu peço para que essa senhora que levou a minha filha me diga onde ela está. Agradeço por todo o cuidado que tiveram com a minha filha, mas preciso saber onde ela está. Preciso dizer para ela o quanto a amo e pedir desculpas, porque eu era uma jovem inconsequente”, diz

O sonho do reencontro

A legislação brasileira não considera crime o ato de mães entregarem os filhos para a adoção — exceto em casos que envolvam dinheiro. Isso porque a ‘adoção à brasileira’, apesar de não ser legalizada, costuma ser considerada um motivo nobre pela Justiça, pois normalmente envolve casos nos quais os pais biológicos declaradamente não tinham condições para criar o filho.

O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) afirma que pais que entregam um filho para outra pessoa perdem qualquer vínculo jurídico com a criança. “A adoção é irreversível, a família biológica perde todo e qualquer direito sobre a criança adotada. Portanto, a mãe que deu o filho a alguém no passado não dispõe de instrumentos legais para reencontrá-lo”, diz a advogada Mariana Turra.

Uma lei de 2009 permite que o filho adotado tenha o direito de conhecer sua origem biológica, com acesso irrestrito ao processo de adoção a partir dos 18 anos — ou, antes disso, mediante assistência jurídica e psicológica.

A psicóloga Juliana Martins frisa que nem todas as mulheres que deram os filhos para outras famílias se arrependem posteriormente. “Não há como generalizar e nem dizer que todas as pessoas ficarão impactadas ou sofrerão por causa disso”, pontua. Porém, não são incomuns os casos de mães que querem reencontrar os filhos anos após doá-los.

Um dos principais meio de busca para as mulheres que doaram os filhos décadas atrás é a internet. É assim que Josefa, Daniele e Rose tentam reencontrar os filhos. Mesmo sem qualquer indício, elas não desistem. “Uma hora eu sei que vou encontrar a minha filha. É o que mais desejo em minha vida”, diz Rose.

“Eu sempre peço a Deus para que não me leve antes de reencontrar a minha menina. Preciso contar para ela sobre tudo o que aconteceu comigo e o quanto a amo”, relata Josefa.

“Tenho muito medo de que alguém tenha dito algo ruim sobre mim para o meu filho. Tenho medo de que ele me odeie por tê-lo abandonado. Queria, ao menos, uma oportunidade para me explicar. Queria que meus dois filhos estivessem juntos, ao menos uma vez na vida”, afirma Daniele.

Notícia publicada na BBC News Brasil em 09 de maio de 2020

Selma Trigo* comenta

Casos como esses, citados na reportagem, leva-nos à profunda reflexão, sem julgamento, pois somos limitados para tecer qualquer avaliação das ações humanas.

Contudo, diante de uma decisão que se possa tomar, mediante os desejos e paixões “irresistíveis”, sempre haverá uma consequência, porque toda “causa tem um efeito”. Não tem como fugir!

E muito mais sério, nesse contexto, é negligenciar diante do resultado do fato, a consequência da própria ação.

Claro que com o passar do tempo, pela maturidade, a dor do arrependimento poderá ecoar na alma de quem assim fez tal escolha diante da vida. E essa dor pode se refletir numa existência inteira, com sequelas profundas e repercutir por outras existências. Entretanto, o arrependimento é o espelho daconsciência. E nesse momento, numa linguagem popular “a ficha cai”. É a consciência tocada pela Lei de Deus que se faz em nós.

Sinalizar o desejo de mudança é significativo, mas, por vezes, não se tem mais o que fazer a nível prático, no contexto da vida.

Por isso, a importância do entendimento quanto à imortalidade da alma, e as sucessivas oportunidades que Deus nos oferece através da reencarnação.

Podemos dizer que “a reencarnação é o perdão de Deus para conosco.”

Quando reencarnamos, trazemos valores e dificuldades morais a serem superados” e que se revelam na trajetória da vida. Entretanto, os arrastamentos são inúmeros, o que exige de nós muita maturidade e vigilância para fazer as melhores escolhas, seguindo na “luta” da superação.

Mediante os nossos desenganos, temos a tendência de colocar na “conta” de terceiros a decisão ou escolha que fazemos , principalmente se não for a melhor escolha.

É preciso deixar claro que ninguém é “responsável” pelos nossos atos e suas consequências, a não ser nós mesmos, pois cada um tem o seu livre-arbítrio.

Outro aspecto importante a ressaltar, é que a maternidade é uma missão.

Allan Kardec, em O Livro dos Espíritos, (q. 582) perguntou aos Espíritos: “Pode se considerar a paternidade uma missão?” E os Espíritos responderam: “É, sem contestação, uma missão; é, ao mesmo tempo um dever muito grande (…)”

As relações fortuitas entre o homem e a mulher, descomprometidas da responsabilidade ou pela ignorância do saber das consequências do ato, leva muitas vezes a resultados desastrosos, principalmente quando acompanhada de uma gravidez cheia de controvérsias, que refletirá no emocional do espírito reencarnante, quando poderá causar sequelas extremamente sérias nas estruturas mentais do espírito.

Mas, todo esse contexto, tem um objetivo para ambos os lados. Seja para a mãe que deu seu filho num momento de fragilidade moral e emocional, como também para o filho que foi de alguma forma entregue à outra família para ser cuidado e zelado, pois como disseram os Espíritos para Kardec, o objetivo da reencarnação é a expiação (q.167).

E para complementar, em O Evangelho Segundo o Espiritismo (cap.V, item 9), os Espíritos nos orientam dizendo:

“(…) não se deve acreditar que todo sofrimento passado aqui na Terra seja, necessariamente, o indício de determinada falta; muitas vezes os sofrimentos são simples provas escolhidas pelo espírito para concluir sua depuração e apressar seu adiantamento. Assim sendo, a expiação sempre serve de prova, mas a prova, nem sempre é uma expiação.”

Essa orientação favorece maior compreensão desse processo, de ter sido gerado por uma mãe e ser entregue à outra mãe para ser cuidado e amado.

Quanto à mãe que tomou essa iniciativa, mediante a todas as dificuldades que teria de enfrentar, de ter seu filho junto a si; no momento, é preciso refletir e avaliar a si própria, estabelecendo um acordo de paz consigo mesma. Só assim a dor poderá ser amenizada diante de um vazio que ecoa e ecoará na própria alma.

Ermance Dufaux nos diz que o período de transição intima é quando deixamos de ser “donos” daquilo que não nos convém para aprendermos a nos apropriar daquilo que sempre foi nosso, mas que nunca optamos por tomar conta. Daí a importância de se perdoar e amenizar o coração, mantendo esse filho que foi entregue aos cuidados de outra mãe, imantado por vibrações de amor. Sendo grata à família que o acolheu nos braços. No mais, deixar que a Lei de Deus aja devidamente, oportunizando talvez nesta, senão em outra existência, um novo encontro e ajuste.

E a Doutrina Espírita é importante nesses momentos, nos conduzindo ao porto seguro da consciência, liberando cada um de nós dos grilhões da ignorância, elevando-nos a voos cada vez mais altos no patamar espiritual rumo ao Pai!

Bibliografia:

KARDEC, A. O Livro dos Espíritos. – 2. ed. Rio de Janeiro: CELD, 2011.

___________. O Evangelho Segundo o Espiritismo. – CELD, 5. ed. Rio de Janeiro, 2010.

DUFAUX, Ermance. Mereça ser Feliz – Superando as ilusões do Orgulho. Psicografia: Wanderley S. de Oliveira.1.ed. Belo Horizonte: INEDE, 2002.

  • Selma Trigo Oliveira é palestrante espírita, professora e pedagoga. Pós-graduada em Supervisão Escolar pela UCAM e Pós-graduada em Avaliação Escolar pela UERJ. Coordenou por 15 anos o Seminário de Pedagogia Espírita na Educação promovido pelo Centro Espírita Léon Denis, no Rio de Janeiro.