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Rir nos torna mais inteligentes, criativos e saudáveis, segundo o neurocientista cognitivo Scott Weems. Ele explica de que maneira algumas gargalhadas revelam crenças e preconceitos e oferecem soluções inéditas para nossos problemas. Paula Mendlowicz comenta.

  • Data :29 Aug, 2014
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29 de agosto de 2014

“O riso é tão importante para nossa vida quanto a inteligência ou a criatividade”

Rir nos torna mais inteligentes, criativos e saudáveis, segundo o neurocientista cognitivo Scott Weems. Nesta entrevista, ele conta como isso acontece e explica de que maneira algumas gargalhadas revelam crenças e preconceitos e oferecem soluções inéditas para nossos problemas

Rita Loiola

Assim que o Instituto de Pesquisa Econômica e Aplicada (Ipea) admitiu o erro de sua pesquisa que dizia que os brasileiros apoiavam ataques a mulheres, a reação foi instantânea: uma enxurrada de piadas. Bastaram poucos segundos para que, no último dia 4, as redes sociais fossem invadidas por anedotas zombando da porcentagem que mostrava que 26% e não 65% concordam com a frase “mulheres que usam roupas que mostram o corpo merecem ser atacadas”. Para o neurocientista cognitivo americano Scott Weems, só mesmo sonoras gargalhadas seriam capazes de resolver o conflito entre o equívoco grosseiro, as reações exaltadas, o machismo e a realidade do episódio. O humor é única forma que nosso cérebro encontra para lidar com diversas informações contraditórias ao mesmo tempo, segundo ele.

“As pessoas contam piadas há milhares de anos para lidar com desafios e conflitos”, diz o pesquisador da Universidade de Maryland, nos Estados Unidos, que estuda o funcionamento do cérebro há doze anos. “O humor revela muito sobre nossa humanidade, sobre como pensamos, sentimos e nos relacionamos com o próximo.”

Em seu primeiro livro, Ha! – The Science of when we laugh and why (Há! – A ciência de quando rimos e por que , sem tradução em português), lançado em março nos Estados Unidos, Weems sustenta que o riso é o resultado da longa batalha cerebral entre emoções e pensamentos opostos. Ao chegar ao ápice da confusão, sem nenhuma alternativa de solucioná-la, rimos. E, assim, não só reconciliamos as ideias contrárias como enxergamos respostas.

Analisando a piada — Em suas pesquisas, Weems descobriu que o humor é o segredo de pessoas inteligentes e criativas para suas associações rápidas e inesperadas. No livro, reúne suas conclusões a outros estudos e traça um mapa que busca compreender o papel das risadas em nossa vida. Começa mostrando como a dopamina, o neurotransmissor ligado ao prazer e o responsável pela alegria, nos fez o que somos: seres em busca de emoção e de novas maneiras de melhorar a vida. Rindo, se possível.

Ao longo do livro, o pesquisador demonstra como o humor dá novas perspectivas às experiências vividas e revela aspectos sutis da realidade que, de outra forma, permaneceriam escondidos. “Suspeito que o humor nunca tenha sido respeitado. E isso é uma vergonha”, afirma o cientista. Nesta entrevista ao site de VEJA, Weems explica por que não levamos o humor a sério e conta como piadas e anedotas são a chave para atingir pensamentos sofisticados e nos tornar mais saudáveis e criativos.

Por que costumamos explodir em risadas frente a situações constrangedoras? Nossa mente transforma ambiguidade e confusão em prazer. O cérebro é lugar cheio de conexões e ideias competindo por atenção. Isso nos leva a raciocinar, mas também traz conflito, pois às vezes temos duas ou mais ideias inconsistentes sobre o mesmo assunto.

Quando isso acontece, nosso cérebro só tem uma coisa a fazer: rir.

E isso resolve alguma coisa? Gostamos de trabalhar em meio a essa confusão e rimos quando chegamos a uma solução. O humor traz respostas súbitas, que chegam por vias diferentes do pensamento lógico e analítico. Cada vez que rimos de uma piada é como se tivéssemos um pequeno insight, pois pensamos algo inédito. E isso só dá certo porque o processo nos alegra — uma mente entediada é uma mente sem humor.

Isso quer dizer que pessoas que gostam de respostas prontas são as mais mal-humoradas? Sim. Há uma forte relação entre ser curioso, gostar de se aventurar intelectualmente e ser bem-humorado. Se alguém quer explicar um ponto, conta uma história. Mas, se o objetivo é explicar mais de um ponto ao mesmo tempo, o ideal é contar uma anedota. Ter humor é olhar as coisas de uma maneira mais profunda. Pessoas com senso de humor fazem associações inesperadas muito rapidamente.

Mas rir frente a situações difíceis ou problemas não significa fugir deles? O humor nos leva a lugares emocionais e cognitivos novos. Mas isso não quer dizer que ele afaste as dificuldades ou sentimentos como raiva, revolta ou tristeza — ao contrário, ativa-os, junto a emoções positivas. Um estudo feito na Universidade da Califórnia mostrou que experimentamos várias emoções ao mesmo tempo. Rir ou contar piadas nos ajuda a expressar todos esses sentimentos misturados e a lidar com eles.

Ou seja, anedotas sobre tragédias como o 11 de setembro nos ajudam a superá-las? Logo após o ataque ao World Trade Center apareceram muitas piadas sobre a catástrofe. Lembro-me de uma delas com um gorila segurando aviões perto das torres gêmeas com a mensagem: onde estava o King Kong quando precisamos dele? Essas piadas mostravam raiva, claro, mas também frustração e até irreverência. Elas não tiravam sarro dos terroristas, mas, sim do processo de luto — lembro que o país suspendeu todos os programas de humor por dezoito dias até que, enfim, o programa Saturday Night Live foi ao ar. Rir nos conecta a outras pessoas para dividir nossas lutas, temores e confusões.

Então piadas como as de humor negro fazem bem para a saúde? Esse tipo de humor nos torna mais saudáveis porque nos ajuda a lidar com deficiências, situações violentas ou macabras. Alivia e é divertido ao mesmo tempo em que é horrível. O humor é capaz de expressar nossas crenças mais assustadoras de uma maneira muito direta — e não estamos acostumados a isso.

Em outras palavras, piadas sexistas, sobre negros ou deficientes apenas ampliam preconceitos? Essa questão é muito importante. Anedotas preconceituosas dão voz a nossas crenças, sejam elas latentes ou escancaradas. Uma pessoa sexista só terá seus preconceitos ampliados por essas piadas enquanto alguém que não adota essas crenças terá mais convicção contra o preconceito. O humor, porém, sempre veicula mensagens múltiplas. Tudo depende da intenção.

Como assim? Alguém que não é machista pode contar uma piada machista com a intenção de caçoar dos homens machistas, não das mulheres. Ou um machista pode contar essa mesma piada com a simples intenção de ofender as mulheres.

E onde está a diferença? Na intenção e no alvo. Se o propósito é ofender, não há nada de engraçado nisso. Mas se o esquete é mais denso — como acontece quando o comediante negro Chris Rock satiriza o racismo — então devemos olhar essas anedotas em um nível mais profundo, porque sua intenção não é insultar e, sim, educar.

Você afirma, no entanto, que piadas ofensivas podem ter o propósito social de adiar a violência. Quando escrevi isso, quis dizer que elas adiam a violência física. Mas elas podem ser uma violência emocional. Não acredito que bullying ou ofensas sejam piadas. Apesar de serem atitudes próximas, creio que o humor seja, essencialmente, a maneira de nosso cérebro lidar com conflito. Atitudes ofensivas não trazem nenhum conflito interno.

Isso quer dizer que piadas ofensivas dizem mais sobre quem as conta do que sobre seus alvos? Certamente! Todo país tem seus alvos favoritos. Nos Estados Unidos, temos uma famosa: ‘por que os homens italianos usam bigodes? Para ficar parecidos com suas mães’.

O humor deve ser levado a sério? Levado a sério e respeitado. Surpreendentemente, durante grande parte da nossa história, o humor foi impopular. Platão [filósofo grego que viveu entre 428 a 348 a. C.] baniu o humor de sua República, dizendo que ele distraía o povo de assuntos mais sérios. Já Tomas Hobbes [filósofo inglês que viveu no século XVI] alegava que rir era uma parte necessária da vida, mas somente para pessoas de inteligência inferior. O problema é que há uma grande diferença entre algo sério e algo solene. É possível ser bem-humorado e sério, mas o humor é o oposto da solenidade — e, por isso, assumimos que ele não pode ser levado a sério. Acredito que esse é o motivo pelo qual ele demorou tanto a ser respeitado — o humor só se tornou um tópico científico em 1988, com a formação da Sociedade Internacional dos Estudos do Humor, nos Estados Unidos.

Foi aí que descobrimos que ele é fundamental? A área cerebral responsável pelo humor faz parte do sistema límbico, que regula emoções primordiais como medo ou raiva. São sentimentos essenciais para a sobrevivência. Rir é tão importante para nossa vida quanto a inteligência ou a criatividade. O humor evoluiu e se tornou o que é hoje porque, provavelmente, em algumas situações, se não pudéssemos rir, teríamos entrado em conflito ou morrido. Dar risada é parte fundamental do que somos.

Em um dos capítulos de seu livro, você comenta um estudo que diz que pessoas muito religiosas têm pouco senso de humor, talvez porque a religião seja um meio de diminuir conflitos. Há algum grupo que seja o mais sem graça de todos? Sem graça eu não sei, mas o psicólogo britânico Richard Wiseman tem um estudo fascinante em que mostrou diversas piadas a pessoas de diferentes nacionalidades, e os alemães riram de quase todas. Imagino que eles tenham um talento especial para extrair graça mesmo de coisas que não tenham humor algum.

Estudos demonstram que animais como ratos e chimpanzés podem rir. O propósito do humor animal é o mesmo dos humanos? Animais riem e têm humor. Seria muito antropocentrismo acreditar que só nós temos humor, sendo que compartilhamos com outros animais as mesmas regiões cerebrais. Se rir é um processo para lidar com conflitos e confusões, então ele está em todas as criaturas que possuem cérebro.

O Brasil, assim como os Estados Unidos, viu vários comediantes serem criticados ou processados por suas piadas. Será que o humor como conhecemos vai acabar? Acho que ele está profundamente ferido, mas não diria que está morto. O humor é muito ligado às mudanças sociais e se transforma com elas. Nos anos 1980, quando tudo era exagerado — empresários queriam sempre mais dinheiro, mais trabalho — o humor também se tornou muito forte. Comediantes como Eddie Murphy ou Robin Williams não eram nada sutis. Esse tipo de graça não faz mais sucesso hoje, porque valorizamos mais a honestidade e a falta de pretensão. Atualmente, os atores pararam de contar anedotas simples para incluir narrativas e detalhes pessoais em seus esquetes. O humor dos próximos anos vai depender da evolução da sociedade.

Matéria publicada na Revista Veja , em 19 de abril de 2014.

Paula Mendlowicz comenta*

Quando estamos em repouso, nosso coração bate, em média, 70 vezes por minuto. No entanto, quando rimos, nosso coração acelera e as batidas podem chegar a 120 pulsações por minuto. Isso faz com que mais sangue circule pelo nosso organismo, oxigenando melhor as células, tecidos e órgãos. Além disso, com o maior bombeamento de sangue promovido pelo coração, os vasos sanguíneos se dilatam, originando uma redução da pressão arterial.

E mais: nosso cérebro e corpo produzem beta endorfinas, que ajudam a relaxar e a reduzir a dor, os níveis de hormônios do estresse baixam e o sistema imunológico é fortalecido.

A verdade é que cada um de nós lida com a ansiedade, com o medo, com os preconceitos e verdades de uma maneira particular. Alguns utilizam o riso para descontrair e também aliviar a tensão, outros se utilizam do humor para esclarecer, alertar, mas ainda encontramos irmãos de caminhada, que por se sentirem superiores, utilizam-se do humor para zombar daqueles que pensam ser menos afortunados ou para exacerbar uma ideia cristalizada ou um preconceito.

O que aprendemos com a Doutrina Espírita é que somos espíritos imortais. Fomos criados espíritos simples e ignorantes e fazemos uma longa caminhada até chegarmos à perfeição. Passamos por um longo e lento processo de evolução, estagiando em diferentes corpos e mundos.

Podemos dizer que este processo de evolução, principalmente a evolução da consciência está bem marcado em nosso cérebro, possuímos um cérebro triuno.

O primeiro cérebro é o cérebro réptil, que apareceu há cerca de 4 bilhões de anos. É a herança do primarismo animal, responsável pelo comportamento agressivo. Logo depois, entre 250 e 150 milhões de anos surgiu o cérebro mamífero, responsável por grande parte das emoções humanas, como a área da afetividade, dos relacionamentos e da manutenção do grupo social.

Até esse momento, predominavam os instintos, ainda não tínhamos a consciência de nós mesmos.

Até que, há apenas dezenas de milhões de anos, surgiu o neocórtex ou cérebro primitivo, encarregado das funções nobres do ser, como a inteligência, o raciocínio, o discernimento, a linguagem, a percepção de tudo quanto ocorre à nossa volta.

Então, a partir desse momento, podemos dizer que se deu o surgimento da consciência. Passamos a ter a consciência de nós mesmos como seres individuais e a contar com o livre-arbítrio.

Não podemos nos esquecer de que além da consciência, fomos dotados também de inteligência:

A inteligência é uma faculdade especial, peculiar a algumas classes de seres orgânicos e que lhes dá, com o pensamento, a vontade de atuar, a consciência de que existem e de que constituem uma individualidade cada um, assim como os meios de estabelecerem relações com o mundo exterior e de proverem às suas necessidades. (O Livro dos Espíritos .)

A vida nos mostra que já evoluímos e aprendemos bastante, e certamente temos ainda muito a aprender. A ciência nos ensina cada vez mais como nosso corpo funciona, podemos ver imagens espetaculares de nosso cérebro funcionando, mas será que já somos capazes de compreender como se dá a interação espírito-períspirito-corpo?

Nossa sociedade, nosso país, nosso planeta refletem nosso medos, anseios, esperanças. Mesmo que estejamos ainda aprendendo a lidar com nossas emoções, dificuldades e medos, que possamos então utilizar-nos da terapia do riso diariamente, aliada à oração e ao exercício de gratidão a Deus pela vida que nos foi concedida, trazendo assim, para nossas vidas, bem-estar e equilíbrio.

Lembrando também da importância do estudo: Espíritas! amai-vos, este o primeiro ensinamento; instruí-vos, este o segundo. (O Evangelho Segundo o Espiritismo .)

Bibliografia:

  • O Livro dos Espíritos – Allan Kardec;
  • O Evangelho segundo o espiritismo – Allan Kardec.

Internet:

Palestra:

  • Paula Mendlowicz é carioca e formada em ciências biológicas pela UERJ. É espírita e colaboradora do Espiritismo.net.