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Dez estudantes entraram em transe depois de participar de um jogo de perguntas e respostas, com um compasso, uma variante da antiga brincadeira do copo, que se move em direção às letras do alfabeto escritas numa folha de papel. Pedro Vieira comenta.

  • Data :27/09/2010
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Novo jogo do compasso leva histeria a estudantes

Grupo de adolescentes entrou em transe após brincadeira em colégio da Baixada

POR MARIA LUISA BARROS

Rio - Adolescentes de escola particular em Nova Iguaçu, na Baixada Fluminense, experimentaram fenômeno que chamou a atenção de cientistas, religiosos e familiares. Há uma semana, dez estudantes do Instituto Politécnico Millennium entraram em transe depois de participar de um jogo de perguntas e respostas, com um compasso, uma variante da antiga brincadeira do copo, que se move em direção às letras do alfabeto escritas numa folha de papel e que é febre no YouTube e no Orkut.

O passatempo, em horário vago dentro de sala de aula, levou a histeria coletiva entre estudantes do Ensino Médio. Alguns foram parar no hospital. “Eu comecei a me sentir mal, com falta de ar, vontade de vomitar e chorava muito. Sentia angústia tão grande, e meu coração ficou acelerado”, contou D., 16 anos, que desmaiou, com outra amiga. Os garotos choravam descontroladamente e se debatiam. “Minha filha parecia que estava drogada quando chegou em casa. Fiquei assustada”, disse N., 48 anos, que prefere não se identificar.

A estudante conta que os amigos, todos movidos pela curiosidade, perguntaram quem estava ali com eles. “Disse que se chamava Lucas, era do mal e entraria no meu corpo”, conta D., que pediu permissão para ir embora e a resposta foi ‘não’. “Eu trincava os dentes, com muita raiva e não deixava ninguém me tocar. Um colega tentou me abraçar e desmaiou também. Os meninos me olhavam e choravam. Nunca mais faço isso”, garante.

O físico Dulcídio Braz Jr. afirmou que não há explicação física para o ocorrido. “A ciência exige comprovação. A religião é fé. Acredite ou não”, diz. Márcia Cobêro, do Centro Latino Americano de Parapsicologia (Clap), afirma que esse tipo de experimento pode levar a distúrbios de personalidade em pessoas influenciáveis. “Eles entram em estado alterado de consciência e acreditam que estão se comunicando com o além. Mas tudo não passa de emoções desencadeadas por medos e desejos”, explica.

Para a doutora em Psicologia Clínica da PUC, Teresa Negreiros, a situação é mais grave para quem tem predisposição para distúrbios mentais. “Pode levar a um surto psicótico”, diz.

Para os especialistas, a escola deve orientar os jovens. “O colégio deveria proibir. Hoje é um jogo. Amanhã, estão levando droga e bebida”, criticou uma das mães. Procurada por O DIA , a direção da escola não se pronunciou.

Fenômeno seria o resultado de medos e desejos

CONTÁGIO PSÍQUICO O desejo de fazer parte do grupo, medos, ansiedades e a curiosidade pelo desconhecido levam jovens a experimentar a brincadeira do compasso e do copo. Para a parapsicóloga Márcia Cobêro, do Centro Latino Americano de Parapsicologia (Clap), a histeria coletiva é um fenômeno que ocorre por sugestão. “Basta uma pessoa acreditar que está possuída por um espírito que todo o grupo começa a sentir os mesmos sintomas”, explica.

SINTOMAS O transe é um estado alterado de consciência. Quem passa por ele não se recorda do que aconteceu. Fica sabendo o que se passou pelos colegas. Sente angústia, vontade de chorar e, alguns, desmaiam. Ficam sonolentos e exaustos. “O corpo sente um estresse profundo após descarregar emoções muito fortes”, explica a psicóloga da PUC, Teresa Negreiros.

Transe coletivo já deixou alunas sem andar e até matou

Várias ocorrências de histeria coletiva foram registradas ao longo da História. Em 1518, em Estrasburgo, hoje território francês, uma mulher começou a dançar sozinha numa viela de forma descontrolada. Ao fim de 30 dias, já havia mais de 400 pessoas bailando e rodopiando embaixo de sol. Ninguém conseguia parar. A ‘Praga da Dança’, como ficou conhecida na época, durou três meses e matou centenas de pessoas de exaustão.

Em 2007, cerca de 600 alunas de um colégio de freiras no México não conseguiam andar. Para paranormais, as meninas estariam profundamente estressadas com regras rígidas da escola. E o caso mais recente aconteceu em junho deste ano, em uma escola no município de Itabira, interior do Ceará. Uma turma inteira entrou em transe, após uma suposta visão do espírito de um colega morto. Um padre paranormal que acompanhou o caso disse que o ataque de histeria coletiva foi uma manifestação do inconsciente ou involuntária das adolescentes.

A brincadeira do copo ou do compasso tem origem no fenômeno das Mesas Girantes, uma prática que virou moda no século 19 na Europa, atiçando a curiosidade de Allan Kardec, pai do espiritismo. Com as mãos sobre a mesa, pessoas alegavam fazer contato com espíritos. Para os cientistas, no entanto, os movimentos feitos pelo grupo ao redor das mesas não passam de manifestações inconscientes.

Espíritas alertam para riscos da prática

Espíritas alertam para os riscos de tentar contato com os mortos. Segundo a kardecista Yeda Hungria, do Núcleo Espírita Chico Xavier, de Piratininga, Região Oceânica de Niterói, todas as vezes em que pessoas tentam entrar em contato com o plano espiritual de brincadeira acabam atraindo, por sintonia, espíritos que só querem brincar, assustar ou mesmo prejudicar. “É preciso ter muito cuidado. É muito sério e perigoso. Jovens com sensibilidade mediúnica podem incorporar os espíritos”, acredita Yeda.

Para ela, que conviveu durante anos com Chico Xavier, as manifestações podem ocorrer por causa de espíritos mal-intencionados ou por sugestão dos participantes: “Eles podem influenciar uns aos outros, sem ser interferência espiritual”. Yeda lembra um caso semelhante que ocorreu há alguns anos no bairro do Fonseca, em Niterói. “Estudantes saíram da escola e se trancaram num quarto para brincar com o copo. Eles ficaram histéricos. Foi uma luta para abrir a porta e tirá-los de lá”, diz.

Notícia publicada em O Dia Online , em 25 de setembro de 2010.

Pedro Vieira comenta*

Já em 1860, na segunda edição de O Livro dos Espíritos (Introdução) e, depois, em 1861, com O Livro dos Médiuns (Capítulo IV, da Parte 1), Allan Kardec analisara e refutara fortemente sistemas variados dedicados a explicar a totalidade dos fenômenos psíquicos. Talvez por uma mistura da genialidade do grande Codificador com a falta de imaginação dos demais, não se vê nenhuma explicação diferente daquelas, já com 140 anos de idade. As constantes da reportagem são o ‘sistema da loucura’, o ‘sistema da alucinação’ e o ‘sistema anímico’ (este o que Kardec considerava mais sério) que, embora possam explicar casos isolados, jamais dão conta de todo o conjunto.

Um compasso identifica-se espontaneamente como um Espírito, em milhares de lugares em todo o mundo. Uma mesa dá nomes, datas e informações desconhecidas de todos os presentes e que se provam absolutamente verdadeiras. Um copo que se movimenta sem toque faz previsões sobre acontecimentos que logo se concretizam.

Um lápis suspenso escreve, numa língua desconhecida de todos, um ditado muito acima da capacidade intelectual desses. Objetos aparecem e desaparecem espontaneamente, entidades espirituais se materializam e são fotografadas e estudadas. Quais desses sistemas simplistas mostrados na matéria são capazes de, convincentemente, interpretar esses e outros ocorridos? O professor Kardec assevera com muita propriedade, por isso, que: “a maioria das objeções que se opõe à doutrina provém de uma observação incompleta dos fatos e de um julgamento emitido com muita leviandade e precipitação.” (O Livro dos Espíritos , Introdução III).

Os jovens que se envolveram nas brincadeiras citadas se prepararam, posto que de forma inadequada, para o transe mediúnico pelo ambiente que criaram e pela concentração provinda do receio agudo do desconhecido. Esse estado psíquico permite uma série de manifestações espirituais (do próprio Espírito do médium ou de um exterior a ele). Esse estado de crise provocado no sistema medianímico desequilibrado pode facilmente se propagar aos demais com menor sensibilidade na reunião pelo efeito cadeia, citado pelo Mestre de Lyon em O Livro dos Médiuns : “Uma reunião é um ser coletivo, cujas qualidades e propriedades são a resultante de todas as de seus membros e formam, como que um feixe; ora, este feixe terá ainda mais força, quanto mais homogêneo ele for.” (Parte 2, Cap. XXIX, item 331).

Esse estado de coisas é tudo que Espíritos brincalhões e inferiores precisam para começar a verdadeira ‘brincadeira’. Aproximando-se do grupo como de um fio desencapado, influenciam, falam, escrevem, ameaçam e provocam, se possível, efeitos físicos que têm por objetivo manter esse ‘ser coletivo’ tanto quanto possível no mesmo estado, para prolongar sua ação, até que sejam interrompidos por uma ação externa ou se cansem. Não é de se espantar, portanto, o estado de desgaste físico-energético que os jovens médiuns envolvidos tiveram.

A questão última que vem à mente é: por que os Espíritos superiores, mentores espirituais deles, permitem tal estado de coisas? De fato, nada ocorreria sem a permissão de Deus. Para que os envolvidos reflitam sobre sua capacidade não conhecida e busquem informações em um Centro Espírita sobre elas de forma a colocá-las a serviço de todos, despertando, mesmo que de forma dolorosa. E, por certo, para que existisse reportagens como essa, para que essa chamada de atenção fosse muito mais geral.

  • Pedro Vieira é expositor e médium espírita. Colabora com o centenário Centro Espírita Cristófilos e com o Centro Espírita Léon Denis, no Rio de Janeiro, além de algumas outras casas.