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‘Ao aliar repressão a medidas de cunho social, a mensagem das autoridades aos criminosos é clara: ‘Não vamos sair daqui’. E aos cidadãos: ‘Viemos para melhorar a vida de vocês’’. Jorge Hessen comenta.

  • Data :26/07/2008
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O pacificador de Bogotá

“Ao aliar repressão a medidas de cunho social, a mensagem das autoridades aos criminosos é clara: ‘Não vamos sair daqui’. E aos cidadãos: ‘Viemos para melhorar a vida de vocês’”

O sociólogo Hugo Acero, que foi secretário de Segurança de Bogotá, capital da Colômbia, por três administrações municipais consecutivas, é autor de uma façanha e tanto: entre 1995 e 2003, ele conseguiu reduzir em 70% a taxa de homicídios daquela que era então uma das cidades mais violentas do mundo. O número de assassinatos em Bogotá, no período, caiu de oitenta a cada 100.000 habitantes para 23 a cada 100.000 habitantes. Hoje, é de dezoito por 100.000. O sucesso do programa coordenado por Acero se deveu, principalmente, ao fato de ele aliar medidas de repressão a iniciativas de desenvolvimento social. Hoje, Acero é consultor do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud) e do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), na área de segurança. Em visita ao Brasil há duas semanas, ele conversou com a repórter Naiara Magalhães sobre o que funciona e o que não funciona no combate à violência das grandes cidades. Seguem os principais pontos da entrevista.

A FÓRMULA DE BOGOTÁ

Reduzimos drasticamente a violência em Bogotá aliando a aplicação de medidas de repressão aos criminosos a iniciativas de desenvolvimento social das áreas onde eles atuavam. Na esfera repressiva, a principal ação foi investir na polícia: compramos veículos novos, equipamos os policiais com rádios, organizamos cursos de capacitação e construímos 181 unidades menores que, distribuídas de forma racional pela cidade, ajudaram a agilizar o atendimento à população e a evitar que houvesse áreas sem policiamento. Fizemos tudo isso com base no diagnóstico da própria polícia de que grande parte das dificuldades para controlar a criminalidade em Bogotá se devia à falta de infra-estrutura. A essas ações coercitivas, juntamos as medidas sociais: asfaltamos ruas, aumentamos a iluminação, recuperamos praças, construímos escolas e postos de saúde nas áreas mais afetadas pela criminalidade. Aos delinqüentes, as autoridades deixavam muito clara a seguinte mensagem: “Nós não vamos sair daqui”. E aos cidadãos: “Estamos aqui para melhorar a vida de vocês”.

LEI SECA

Sou da opinião de que o controle dos horários dos estabelecimentos que vendem bebidas alcoólicas é uma medida altamente eficaz para reduzir a violência. Em 1995, definimos que os bares e casas noturnas de Bogotá tinham de fechar à 1 da manhã. Em um ano, reduzimos o número de homicídios em 8%. O de mortos em acidentes de trânsito diminuiu 15% e o de feridos caiu 11%. Tomamos a medida com base em duas constatações: uma era que a polícia, da meia-noite às 6 da manhã, gastava quase todo o seu efetivo para atender a problemas relacionados a embriaguez: brigas entre pessoas alcoolizadas, bêbados que não pagavam contas em bares, tumultos que atrapalhavam o sono da vizinhança etc. Com isso, não conseguia atender a ocorrências mais graves. A segunda era que havia estreita relação entre o consumo excessivo de álcool e a quantidade de mortes e ferimentos no trânsito. Funcionou. A partir de 2002, estendemos o horário de fechamento dos bares para as 3 horas, e assim é até hoje.

AUMENTO DAS PENAS

É um equívoco achar que o problema da criminalidade se resolve aumentando a pena dos condenados. Na Colômbia, por exemplo, a lei prevê sessenta anos de cadeia para seqüestradores e, apesar disso, ocorriam, até alguns anos atrás, 3.500 seqüestros por ano. O problema não é o tamanho da pena – é que, na maioria dos casos, a lei não é aplicada de forma rigorosa: os criminosos são condenados a penas menores. Além disso, acabam cumprindo somente parte do tempo que deveriam passar na prisão quando se comportam bem ou realizam algum trabalho. Por isso, eu acredito que mais eficiente do que aumentar as penas é discutir uma pena mínima para cada crime, a fim de garantir que um criminoso não saia da cadeia depois de apenas quatro anos, quando deveria ficar pelo menos quinze.

NARCOTRÁFICO

O tráfico de drogas é, atualmente, uma das maiores preocupações dos especialistas em segurança por dois motivos: é um crime globalizado e desencadeia muitos outros crimes. Só o tráfico de cocaína cresceu quase 40% no mundo entre 2006 e 2007. Existem vários motivos para que o tráfico de qualquer droga produza outros crimes. Primeiro, como se trata de um negócio altamente rentável, os traficantes costumam se enfrentar para controlar os territórios uns dos outros. O narcotráfico também produz mortes entre os que se opõem a ele. Na Colômbia, nos anos 90, o então chefe do Cartel de Medellín, Pablo Escobar, decidiu pagar 500 dólares por policial morto. Resultado: em um ano, foram assassinados mais de 300 policiais. Por fim, crimes como furtos e roubos aumentam entre usuários de drogas. As estatísticas mostram que esse tipo de delito cresce à medida que aumenta a distribuição de drogas em determinada região. É só ver o que ocorre em cidades como o Rio de Janeiro, que vive uma situação muito semelhante à de Medellín nos anos 90 – os narcotraficantes controlam os territórios das favelas e a polícia tem muita dificuldade de combatê-los. Nesses casos, não adianta a polícia entrar no morro, prender e matar alguns traficantes e sair, porque em pouco tempo assumem outros mais violentos, mais bem armados e preparados. O que a polícia precisa fazer é dominar a área, permanecer lá e abrir caminho para as medidas de desenvolvimento social.

PCC

É preciso ter cautela para afirmar que o movimento está neutralizado. Pode-se dizer que está sob controle porque não está agindo agora. Mas esses grupos delinqüentes, como PCC, Farc e paramilitares da Colômbia, vivem do narcotráfico. E, enquanto o narcotráfico estiver aumentando, e está, é difícil dizer que eles não voltarão a agir.

ERROS E ACERTOS BRASILEIROS

O Brasil, assim como outros países, erra no combate à criminalidade por dissociar as políticas social e repressiva. Além disso, falta coordenação entre os governos, nas suas diversas esferas, e entre as polícias civil, militar, federal e as guardas municipais. No caso das prefeituras, elas poderiam participar mais das políticas de segurança, cuidando, por exemplo, da iluminação pública nas áreas em que forem detectados altos índices de criminalidade. Por outro lado, as cidades brasileiras que têm mais acertos na segurança pública são justamente aquelas em que as polícias civil e militar trabalham bem juntas, como São Paulo.

MULHERES SÃO MENOS CORRUPTAS

Na Colômbia, para cada dez policiais homens investigados por corrupção ou problemas disciplinares, apenas uma mulher passa por averiguações pelos mesmos motivos. Hoje, elas representam 15% do efetivo da polícia colombiana. Mulheres são menos corruptas e mais disciplinadas.

Matéria publicada na Veja.com , em 21 de maio de 2008.

Jorge Hessen comenta*

ALGUMAS PROPOSIÇÕES ESPÍRITAS PARA NEUTRALIZAR A VIOLÊNCIA URBANA

O tráfico de drogas é um crime globalizado e desencadeia muitos outros crimes, tais como furtos e roubos, cujos índices demonstram que crescem a cada dia, principalmente entre seus usuários. As estatísticas mostram, igualmente, que a violência cresce à medida que aumenta a distribuição de drogas em determinadas regiões. Os governos deveriam ter um importante papel nessa questão das drogas, ou seja, saber aliar medidas de repressão a alternativas outras para os jovens, e promover o desenvolvimento social nessas áreas. É mister reprimir os criminosos, obviamente. Porém, junto a isso, urge o envolvimento, também, da sociedade em todo esse contexto, nas áreas onde eles atuam. Até porque, grande parte das dificuldades para controlar a criminalidade, deve-se à falta de investimento em programas culturais, em atividades esportivas e em áreas de lazer para esses jovens, e, fundamentalmente, a falta de infra-estrutura por parte do Estado.

Desse modo, a ausência do Estado forja os líderes do crime que “governam” as comunidades com as suas próprias “leis”. É importante que todo governante invista em projetos de asfaltamento de ruas, ampliação da iluminação pública, recuperação das praças, construção de escolas e postos de saúde, controle dos horários dos estabelecimentos que vendem bebidas alcoólicas nos locais mais afetados pela criminalidade. São medidas eficazes para reduzir a barbárie da violência urbana.

Infelizmente, a violência se fixou em caráter permanente em vários pontos do planeta. Em face disso, presenciamos os estertores urbanos das batalhas bélicas que têm aniquilado as bases da racionalidade humana.

Segundo noticiários mais recentes, o Rio de Janeiro vive uma situação muito semelhante à cidade de Medellín, na Colômbia dos anos 90. Os narcotraficantes controlam os territórios das favelas, e o aparelho policial do Estado tem extrema dificuldade em combatê-los, seja pela falta de coordenação entre os governos, nas suas diversas esferas, seja entre as polícias civil, militar, federal e as guardas municipais, ou, ainda, pela corrupção da própria polícia, etc. Lembramos que, nos anos 90, Bogotá, na Colômbia, era considera uma das cidades mais violentas do mundo, e conseguiu reduzir em 70% seu índice de violência urbana, em face das medidas sócio-educativas ali empreendidas.

O problema das drogas tornou-se uma calamidade pública, ceifando milhares de vidas e movimentando, interna e externamente, um dinheiro incalculável. Porém, por mais que o governo e a polícia combatam traficantes, nada será eficaz para lutar contra as drogas, senão a prática do Evangelho dentro do princípio do amor a Deus e ao semelhante.

Em nosso País, as penitenciárias, de hoje, lembram bastante as masmorras medievais. Os cárceres, atualmente, não servem para educar, pelo contrário, neutralizam a formação e o desenvolvimento de valores intrínsecos, estigmatizando o ser humano. As penitenciárias vêm funcionando como máquinas de reprodução da criminalidade. Tudo agravado pelo péssimo ambiente prisional, pela ausência de atividades produtivas e pela superlotação carcerária. Fatos esses que nos levam a testemunhar, pela mídia, as mais cruéis cenas de refrega entre criminosos e policiais, sobretudo no Rio de Janeiro e em São Paulo.

É evidente que as prisões são necessárias à detenção do infrator violento e perigoso, que se constitui em ameaça concreta para a sociedade, porém, ao infrator de menor potencial ofensivo, sem características de violência, devem ser aplicadas as “penas alternativas”, lamentavelmente, ainda, muito pouco aplicadas no País. Em verdade, a violência de todos os matizes deslustra as conquistas sociológicas deste século. A brutalidade humana tem esmaecido o caminho para Deus. Até mesmo muitos de nós, espíritas, condenamos a violência alheia, no nosso dia-a-dia, ao invés de agirmos de forma pacífica e fraterna. Somos quais títeres, reagindo sempre de acordo com o que motivou a nossa indignação.

Analisando este quadro, fica explícita a condição de nosso mundo de expiações e provas, que se caracteriza pelo “domínio do mal”. É necessário que identifiquemos, com mais profundidade, os agentes determinantes desse processo, para podermos intervir com racionalidade em nossa esfera de ação.

Quem estuda o Espiritismo, e se esforça por praticar seus preceitos, vê-se melhor instrumentalizado para a vida em sociedade nos tempos atribulados em que vivemos, encontrando conceitos lógicos e racionais para o entendimento da vida numa visão evangélica consciente. Os postulados espíritas são antídotos para a violência, posto que quem o conheça, sabe que não se poderá eximir das suas responsabilidades sociais, e que o seu futuro será uma decorrência do presente. Nesse contexto, devemos considerar que o espírita-cristão deve se armar de sabedoria e de amor, para atender à luta que vem sendo desencadeada nos cenários da sociedade, concitando à concórdia e ao perdão, em qualquer conjuntura anárquica e perturbadora da vida moderna.

Torna imprescindível praticarmos o Evangelho nos vários setores da sociedade, contribuindo com a parcela de mansidão para pacificá-la. O homem moderno ainda não percebeu que somente a experiência do Evangelho pode estabelecer as bases da concórdia, da fraternidade e constituir os antídotos eficazes para minimizar a violência que ainda avassala a Terra.

As Casas Espíritas, como Prontos-Socorros espirituais, muito podem contribuir no trabalho de prevenção e auxílio às vítimas das drogas, nas duas dimensões da vida, através de medidas que os incentivem ao estudo das Leis de Deus. O Centro Espírita, além de estimular as famílias à prática do Evangelho no Lar, oferece recursos socorristas de tratamento espiritual: passe, desobsessão, água fluidificada, atendimento fraterno (trabalho assistencial que enseja o diálogo, a orientação, o acompanhamento e o esclarecimento, com fundamentação doutrinária a todos, indistintamente).

Destarte, intensifiquemos e aprimoremos cada vez mais as ações de ordem preventiva e terapêutica, já em curso em nossas Casas Espíritas, que nos casos de maior gravidade dos nossos assistidos, encaminhamos às instituições espíritas de socorro específico, clínicas, sanatórios, hospitais, etc.

Que nossas Casas Espíritas estejam sempre em sintonia com os ensinamentos das Obras Básicas e seu propósito de bem concorrer para a ascensão espiritual da criatura humana às faixas superiores da vida.

  • Jorge Hessen é natural do Rio de Janeiro, nascido em 18/08/1951. Servidor público federal lotado no INMETRO. Licenciado em Estudos Sociais e Bacharel em História. Escritor (dois livros publicados), Jornalista e Articulista com vários artigos publicados.